“Rapunkuel”: uma nova versão para o clássico eternizado pelos Irmãos Grimm

Por Marisa Loures

Foto Gisele Gemmi
Em “Rapunkuel”, a escritora e contadora de histórias paulista Gisele Gemmi Chiari traz outra alternativa de destino para a menina das tranças – Foto Divulgação

Você conhece a história da menina que, ao nascer, foi aprisionada em uma torre por uma bruxa má, que, quando queria ir até lá, subia pelas longas tranças da garota. “Rapunzel”, clássico eternizado pelos Irmãos Grimm, ganha uma versão moderna no livro “Rapunkuel” (24 páginas), da professora e contadora de histórias paulista Gisele Gemmi Chiari. Publicada pela editora Paratexto, de Juiz de Fora, a obra surpreende o leitor com um desfecho bem diferente do que já conhecemos.

“’Rapunkuel’ traz elementos como tutoriais da internet, a ideia de uma torre com varanda gourmet e outras alternativas de destino para uma personagem feminina. Por outro lado, nossa protagonista, assim como sua antepassada, a Rapunzel, tem de enfrentar situações difíceis, principalmente, uma bruxa egoísta e possessiva”, adianta a autora, que teve a ideia para o livro ao participar de uma oficina de escrita criativa promovida, em 2019, pelo jornalista e escritor Claudio Fragata. A proposta era criar uma paródia de um conto tradicional. “Logo pensei em fazer uma versão de ‘Rapunzel’, pois sempre achei que a personagem, com toda aquela cabeleira, corria grande risco de pegar piolhos”, conta.

Gisele Gemmi Chiarié é formada em Letras. Possui mestrado e doutorado em Literatura Brasileira pela USP. Embora “Rapunkuel” seja seu primeiro livro voltado para crianças, ela já escreve para esse público, tendo recebido duas premiações em concursos de literatura infantil. Seu texto “A casa” integra a antologia “Os mais belos contos infantis”, publicado, também, pela  Paratexto. Para o lançamento do livro de estreia, programado para a próxima sexta-feira, 30, às 20h, no canal do YouTube e no Instagram da editora, ela planeja, é claro, “apresentar uma contação bem bacana para ‘Rapunkuel’”.

Marisa – Você foi uma criança leitora de contos de fadas? 

Gisele Gemmi Chiarié – Fui uma criança leitora, inclusive, e com muito gosto, de contos de fadas. Eu me lembro que, na biblioteca infantil do bairro onde eu morava, havia uma coleção ilustrada de contos maravilhosos que fiz questão de ler inteira quando eu tinha cerca de 8 ou 9 anos. Lia muitos romances de aventuras também.

– Rapunkuel recebe alguns visitantes inesperados e indesejados, mas a presença deles acaba fazendo com que a menina tome uma importante decisão. Qual mensagem você quer deixar para as crianças com essa obra?

Como diz o ditado popular, “há males que vêm para o bem”. Os visitantes indesejados fizeram com que Rapunkuel atentasse para sua situação de prisioneira, prisioneira de um espaço e de uma relação. A situação desconfortável instigou-lhe o desejo de libertar-se e conhecer outras pessoas e o mundo.

– Normalmente, nos contos de fadas, a princesa tem um final feliz ao lado de um príncipe encantado. Sua história subverte esse desfecho. É preciso mostrar para as crianças que a felicidade não está atrelada a encontrar um amor assim?

A intenção, desde o início, era escrever uma paródia que, em sua essência, é subversiva. Como o texto-base era um conto tradicional, quis subvertê-lo incluindo elementos e aspectos culturais da modernidade. Para além disso, acredito que Rapunkuel encontra o amor, mas o amor por si mesma. A partir daí, ela estará preparada para uma relação amorosa mais sadia. Eu diria que o amor é sim importante para a felicidade e que há várias formas de amar.

– Aliás, há algo que a incomoda nos contos de fadas?

Não, os contos de fada não me incomodam. Eles são um manancial de cultura e de sabedoria que precisamos conhecer. No entanto, como qualquer texto, eles carregam aspectos socioculturais e marcas históricas sobre os quais devemos refletir. O que quero dizer é que não precisamos concordar com a perspectiva patriarcal presente em alguns contos, por exemplo, mas problematizá-la sem deixar de perceber outras questões humanas inerentes aos contos.

– E os contos de fadas são eternos, continuam tendo muito apelo entre os leitores. A que você atribui essa perenidade?

A perenidade dos contos de fada, a meu ver, deve-se à capacidade que eles têm de condensar questões que todos nós humanos temos que enfrentar em nossa experiência de vida. No caso de “Rapunzel”, por exemplo, a relação entre a protagonista e a bruxa é uma relação abusiva, embora a madrasta também cuide dela. Ora, essa é uma situação pela qual muitas pessoas passam e têm de lidar com ela. Na versão tradicional, como em meu livro, a menina das tranças consegue superar esse problema, mas de forma diversa.

– Além de escritora, você é professora e contadora de histórias. Quais aspectos você acha relevantes na hora de contar histórias para os alunos?

O primeiro aspecto relevante seria a curadoria dos textos, tanto pela professora como pela contadora. Os textos literários devem ter densidade no que tange ao conteúdo e qualidade artística em relação à linguagem e à materialidade do objeto livro. Outra questão importante é estabelecer uma relação amorosa e íntima com o texto antes de compartilhá-lo com os estudantes e com o público. Dito de outra forma, não aconselho partilhar textos dos quais não se gosta. Em seguida, professora e contadora devem se debruçar sobre o texto, analisando-o com profundidade.

– Ao longo do processo de escrita, a contadora de histórias vai guiando a escritora, que vai produzindo o texto dando o tom que a história precisa durante o ato de contação?

Exatamente. A leitura oral do texto escrito ajuda a escolher melhor as palavras, decidir-se sobre a estrutura das frases e parágrafos de forma a imprimir sonoridade e ritmo agradáveis ao leitor.

capa do livro RAPUNKUEL 2

“Rapunkuel”

Autora: Gisele Gemmi Chiari

Editora: Paratexto (24 páginas)

Lançamento: sexta-feira, 30, às 20h, no canal do YouTube e no Instagram da editora,

Marisa Loures

Marisa Loures

Marisa Loures é professora de Português e Literatura, jornalista e atriz. No entrelaço da sala de aula, da redação de jornal e do palco, descobriu o laço de conciliação entre suas carreiras: o amor pela palavra.

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