Edson Basilio: “Gosto da escrita afetiva, orgânica, às vezes, até impensada”

No Sala de Leitura deste domingo, a jornalista Marisa Loures entrevista o escritor Edson Basilio

Por Marisa Loures

Não foi na infância que os livros foram apresentados a Edson Basilio. Quando pequeno, não foi estimulado, ele conta. Depois, foi trabalhar na feira livre, na barraca do pai, e aí o universo da literatura ainda era muito distante daquele garoto. Foi no cursinho pré-vestibular que uma professora, apaixonada pelo ofício, conseguiu apresentar as histórias de uma maneira diferente. “Ela tinha paixão por aquilo e passava isso para a gente”, confidencia Basilio, que, contrariando as expectativas, prestou vestibular para Letras. Estudamos juntos, e foi nas salas de aula da UFJF que a professora Cândida (mais uma vez uma professora cruzou o seu caminho) disparou: “Você escreve bem, tem uma boa capacidade de síntese. Diz em meia página o que muita gente precisa de duas para dizer”. Pronto. Nesse momento, ele se percebeu escritor. “Graças a ela, eu me encontrei nos mini e microcontos e nas crônicas.”

De lá para cá, foi escrevendo e guardando os escritos na gaveta. Depois, começou a compartilhá-los nas redes sociais. Mas o lançamento de uma obra só se tornou real neste ano, quando se deparou com um edital na página do Instagram da Caravana Editorial. Ele resolveu arriscar. “De perto” (70 páginas), livro composto por 34 contos, acaba de nascer, levando aos leitores uma mistura de realidade e ficção.

“Esse livro mistura histórias da minha vida com outras que ouço as pessoas contarem, além de coisas que, às vezes, a gente deixa passar despercebidas no dia a dia. No entanto, se pararmos para prestar atenção nelas, acabamos percebendo certos detalhes, como quando fazemos sempre o mesmo caminho para o trabalho e passamos pela mesma árvore, mas um dia resolvemos parar e olhar com mais atenção, mais ‘De perto’, e descobrimos que ela tem flores e/ou frutos”, afirma o autor, que revela gostar da escrita “afetiva, orgânica, às vezes, até impensada.” Gosto, também, de transformar uma situação que causa incômodo em algo que beira o insuportável, como se aquilo estivesse me fazendo mal enquanto observo. Acho isso divertido e desafiador.”

Para adquirir “De perto”, basta entrar em contato com a Caravana Editorial. Também é possível acompanhar as novas produções de Edson Basílio por meio de um canal no WhatsApp. Acesse aqui.

Edson Basilio Divulgacao
O juiz-forano Edson Basilio mistura lembranças e ficção em “De perto”, livro de contos que marca a estreia dele entre os autores publicados (Foto: Divulgação)

Você diz que gosta da “escrita afetiva, da escrita orgânica, às vezes até impensada.” Gostaria que me explicasse sobre o processo de escrita dos contos que compõem esse livro de estreia. Quais são suas referências literárias?

Eu chamo de “escrita afetiva, orgânica e às vezes até impensada” o jeito que escrevo. Não faço como ouço outros autores dizerem que fazem, já iniciam pelo final, já sabem o que vai acontecer e vão desenvolvendo a história até chegar lá. Eu pego uma ideia que tive, começo a escrever sobre aquilo e a história vai vindo. Na maioria das vezes, o final vem naturalmente, quase automaticamente. Às vezes, demora mais um pouco. Não gosto de forçar nada, não gosto de sentar e dizer: ‘tenho que terminar essa história hoje!’. Nas ocasiões em que fiz isso, não gostei do resultado. Espero vir alguma coisa na cabeça, e vem a qualquer momento do dia. Aí sento, e a história vai vindo. Minhas principais referências literárias são Clarice Lispector, Machado de Assis, Fernando Pessoa e Stephen King.

E a matéria-prima para seus contos é o cotidiano. Como você desenvolveu a sensibilidade para captar e transformar as pequenas nuances do dia a dia em histórias envolventes?

Não sei. É sério. As pessoas sempre me disseram que eu reparo nas coisas que ninguém repara. Isso vem de pequeno. Acho que passar isso para o papel foi uma necessidade de mostrar para as outras pessoas, para elas poderem ver essas coisas também. Para tentar alcançar esse efeito. Faço descrições detalhadas de características físicas, sons e sensações envolvidas em dada situação. Conto sempre com a empatia de quem estará lendo. Se você achou que as minhas histórias são envolventes, é por causa da sua capacidade de empatia.

Seus textos são escritos em primeira pessoa. Tenho a impressão de que, muito do que ali está, está guardado nas suas memórias. “Bolas de gude”, por exemplo, apresenta um personagem que se encontra com um menino, que é ele na infância. Escrever sobre suas lembranças é imprescindível?

Engraçado, a ideia para esse texto surgiu num dia em que eu estava ouvindo 14 Bis, na hora em que eles tocaram a música “Bola de meia, bola de gude.” Daí foram vindo os sentimentos da época de infância. Nenhuma lembrança de algum fato específico, mas de como eu me sentia. Escrever sobre minhas lembranças é uma necessidade, me faz bem de várias maneiras diferentes, me traz lembranças boas e me ajuda a reescrever outras. Gosto de escrever em primeira pessoa mesmo quando a história não é minha. Isso me ajuda a imaginar como se as coisas estivessem acontecendo comigo. No final, sempre vai ter algo de mim em todos os textos.

Dos 34 contos publicados, consegue escolher um que seja favorito? Conte-nos a história que está por trás dele.

Sem dúvidas é o “Doce de leite ninho de boteco”, porque ele reúne muitas coisas da minha infância, e uma delas é o próprio doce de leite ninho de boteco, que era diferente do comprado em bombonieres. Ele tinha outro sabor. Tudo o que está escrito ali é verdade, é lembrança boa, de amizades, família, convivência, brincadeiras, papos, momentos, pessoas e sensações que não podem ser trazidos de volta. É um texto muito forte, pelo menos para mim.

O que você espera despertar no leitor com a sua literatura?

Momentos de descontração, reflexão, nostalgia, incômodo, mas, quero, principalmente, resgatar o gosto pela leitura. Por isso procuro escrever numa linguagem mais próxima do cotidiano, tomando cuidado para evitar termos muito rebuscados e linguagem formal, mas tomando cuidado, também, para não trazer os desvios da língua falada para o texto escrito, e isso é trabalhoso. Com isso, quero atingir leitores de qualquer nível de escolaridade. E os textos são pequenos para que possam ser lidos em qualquer lugar e em qualquer intervalinho: horário do almoço, do cafézinho, sentado num bar enquanto espera os amigos chegarem ou até no banheiro (eu gosto).

Marisa Loures

Marisa Loures

Marisa Loures é professora de Português e Literatura, jornalista e atriz. No entrelaço da sala de aula, da redação de jornal e do palco, descobriu o laço de conciliação entre suas carreiras: o amor pela palavra.

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