Flávio lia a Tribuna na sala. Andava aterrorizado com os altos índices de violência em Juiz de Fora.
– Vagabundos! Tem que mandar pra vala!
Impressionavam as táticas que os facínoras vinham inventando para invadir as casas das pessoas, fingindo-se de entregadores, funcionários da Cemig, fiscais da dengue e toda sorte de ardil.
Quando tocou o interfone do 307.
– Fernanda, atende lá!
Fernanda, a filha mais nova de Flávio, 10 aninhos, foi à cozinha e de lá gritou:
– Pai, é um moço falando que é você! Disse assim: “abre aí, filha, é o papai”!
Flávio não teve dúvidas. Foi até o quarto, pegou o 38 que guardava malocado entre os lençóis e as fronhas no armário, desceu os quatro lances de escada e foi ter com o biltre parado ao interfone, provavelmente tentando o golpe em outro apartamento.
Enfiou o braço pela grade do portão e descarregou as balas do tambor. Seis pipocos. Pou-pou-pou-pou-pou-pou.
Os tiros aguçaram a curiosidade de toda gente. Pessoas meteram as cabeças para fora das janelas dos prédios do entorno. O povaréu do condomínio também juntou feito formigueiro, descendo as escadas aos atropelos. Entre estes veio uma menina de 11 anos, vizinha do 308, onde vivia com a mãe divorciada. Ao ver a cena medonha, pulou aos prantos sobre o cadáver.
– Pai! Paaai!! Paaaaaai…!!! Paizinho! Ó, meu paizinho…!!
O uniforme da escola, que ela ainda não havia tirado, todo sujo na poça de sangue em que o pai jazia, olho morto-vidrado e boca aberta.
O juiz-forano anda muito distante dos seus vizinhos.