Talvez você compartilhe comigo, gastronômico leitor, que o hábito de comer na rua de forma cotidiana faz com que tenhamos de mudar constantemente de restaurante.
Por mais que o tempero daquele PF da esquina seja fabuloso, que o ponto do frango frito do boteco ao lado do supermercado seja impossivelmente crocante, que a cebola do filé com fritas naquela galeria do centro seja de virar o zoinho, depois de uns dias a gente enjoa.
O que não acontece quando comemos no aconchego do lar.
Talvez seja saudosismo meu do luxo que era comer em casa todo dia, mas tenho essa impressão há tempos, confirmada pela felicidade que me assalta toda rara vez que divido o almoço com a família numa terça-feira qualquer.
Mesmo que o piloto de fogão não seja tão talentoso quanto um master chef da vida, para quem vive o batidão do fast food, do self service, da marmita e do PF, não há tempero melhor do que o caseiro.
E tenho para mim, sem influência de Sazón, que isso tem a ver com afeto.
Porque, normalmente, em casa cozinhamos para quem gostamos.
Eu cozinho.
Não sei cozinhar, mas cozinho.
Só de vez em quando, mas cozinho.
E mesmo que esteja cansado, impaciente, com sono ou de ressaca, tento dar, na preparação de um miojo ou de um prato metido a besta, o meu melhor – que, reconheço, não é lá grandes coisas.
Tendo a imaginar que o mesmo ocorra com as mães e pais e irmãos e irmãs e tias e avós que manobram trempes e fornos Brasilzão afora com destreza schumacheriana.
Arrancar um “hmm, delícia” de quem a gente ama é o banho de champanhe após a bandeirada final – e o dia a dia é sempre uma corrida.
O cozinheiro do PF não sabe para quem está cozinhando.
Geralmente sequer vê a cara de quem está servindo.
E por mais que seja inspirado e dedicado, robotizado pela rotina e pela pressão do comércio, uma hora entra no piloto automático.
Ao passo que em casa, mesmo com os atritos que são da natureza do convívio familiar, há um cuidado que é muito especial.
Pois não é com o patrão.
Não é um cuidado com o emprego.
Tampouco com a vigilância sanitária.
É com um outro ser humano que se quer sinceramente ver feliz.
E por mais que o arroz empape, que a carne fique dura e que o feijão salgue demais, há um tempero imaterial que a tudo impregna.
E aí, nutrido leitor, já não se trata só de comida.