Morreu Neimar

Por Wendell Guiducci

Morreu Neimar.

Não um Neimar por quem a nação irá chorar.

Um Neimar ordinário, sem ipslon, falecido longe de casa e cujo cadáver, indica o quadro do serviço de liberação de corpos do hospital, foi removido do Instituto Médico Legal de Juiz de Fora para Belo Horizonte, mas será sepultado em Tocantins.

Tocantins MG, eu suponho.

Do outro Neymar, o JR, com ipslon, sabemos de quase tudo. Quando nasceu, onde começou a jogar bola, quando virou astro, o que faz nos dias de folga, com quem namora, de quem separa, com quem reata, quanto lhe cobra o fisco espanhol e quanto lhe deixou de cobrar o fisco brasileiro. E pudemos acompanhar recentemente o passo a passo de sua cirurgia para corrigir a fissura do quinto metatarso do trilhardário pé direito, assim como se fosse a posse da primeira presidente norte-americana do Brasil ou o casamento de (mais) uma plebeia com (mais) um príncipe britânico. Transmissão em tempo real, com comentários de especialistas – de futebol, fisiologia, ortopedia – e tudo mais.

Mas do outro Neimar, nosso misterioso Neimar cujo destino está ali registrado com caneta pilot azul no quadro do serviço de liberação de corpos do hospital, desse nada sabemos. Mas podemos especular.

Que estivesse de passagem por Juiz de Fora e possuísse residência fixa em Belo Horizonte, mas seus familiares fossem de Tocantins.

Que fosse jovem e estivesse aqui estudando ciência da religião.

Ou que fosse velho e estivesse participando de uma festa:

Talvez de um encontro de funcionários do Banco do Brasil.

Do Rotary Club.

De colecionadores de selos.

Do Clube de Tiro, Caça e Pesca de Juiz de Fora.

Ou que fosse morador de rua, vai saber.

Tudo isso e muito mais poderíamos especular a partir das exíguas informações que somam no quadro do serviço de liberação de corpos do hospital.

Mas tem uma coisa escrita lá sobre a lousa branca, indicada por uma seta abaixo do “removido para Belo Horizonte”, que nem TV Globo nem site de fofocas, nem stories do Instagram nem live do Facebook foram capazes de me esclarecer.

Quatro palavrinhas redigidas também em azul com letra de forma, uma linha abaixo do nome de Neimar, que me inquirem indevassáveis:

“PEGAR CORDA NO MANOEL”.

Wendell Guiducci

Wendell Guiducci

Wendell Guiducci é jornalista formado pela UFJF. Foi repórter e editor da Tribuna entre os anos 2000 e 2024. Hoje assina, como colaborador, a coluna de crônicas "Cronimétricas". É autor dos livros de minificções "Curto & osso" e "Suíte cemitério", e cantor da banda de rock Martiataka. Instagram: @delguiducci

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