Beach tennis: uma introdução

Por Wendell Guiducci

Domingo de manhã, o sol esgueirando-se teimoso entre copiosas nuvens, acompanhei minha filha, duas primas e um primo a uma das 7 mil quadras de beach tennis que ora pipocam em Juiz de Fora. Não entendo muito e nunca entenderei esse negócio de dar nome inglês para o que, em português, encontra seu próprio vocábulo já muito bem estabelecido. Mas logo vislumbrei uma das possíveis razões, quando ouvi uma senhora na quadra ao lado, que me parecia bastante mineira – passaria facilmente por natural de Piau ou Matias Barbosa -, gritando “out” em vez de “fora”.
De todo modo, assim como vôlei de praia e futebol de areia já foram, em passado recente, beach volley e beach soccer, é questão de tempo até que a jacuzisse decante e o esporte, ainda que derivado de uma prática mais aristocrática que as supracitadas modalidades, passe a ser chamado do que é: tênis de areia.
Chegando ao recinto, onde muitas jovens senhoras e senhoras apenas davam suas raquetadas, inclusive a querida matiense ou piauense, arranquei meu tênis (não meu tennis) e caminhei na areia fofinha. Fui até uma cadeira de praia (não sei se por ali chamam de beach chair), de onde em segurança assistiria à partida da minha gangue adolescente, fazendo às vezes o papel de catador de bolinhas.
Não estava em meus planos jogar. Uma porque tenho natural aversão a modinhas. E não tem modinha mais modinha do que o beach tennis. Outra porque ando com meu punho direito recém-recuperado de uma longa tendinite, que o caríssimo doutor Reginaldo Braida curou a certo custo, assim como fizera com minha clavícula, com meu ombro, com meus tornozelos e outras dobradiças ao longo dos últimos 20 anos.
Aqui cabe um parêntese, se o esportista leitor me permite a digressão. Essa tendinite me atazanou por uns bons meses. Quando estava quase recuperado da lesão, após umas sessões de fisioterapia, me meti a jogar vôlei de areia a convite da mesma gangue de púberes. Péssima escolha para quem acabara de consertar a inflamação de um tendão no punho, disse ao Reginaldo quando voltei ao consultório com a mão dolorida. Muitíssimo gentil, o exímio ortopedista se eximiu de discordar enquanto me aplicava uma infiltração e recomendava mais dez sessões de fisioterapia.
O benevolente leitor entenderá, portanto, que além do meu ranço particular diante do hype, tenho argumentos fisiológicos e psicológicos para evitar esportes de areia. De modos que fiquei ali, assistindo à energia adolescente fervilhando nas areias nada escaldantes de Juiz de Fora, sob uma sombrinha a proteger minha calva quase cinquentenária.
O imponderável, porém, ocorreu. Já a um quarto do fim do tempo regulamentar, Lívia, a aniversariante do dia, do alto de seus 16 anos, reclama de dores no joelho. Senta na areia. Pede substituição. Do banco de reservas, sou acionado a entrar em quadra, em regime de urgência, sem tempo para aquecimento nem nada. Pronto. Lá vai o detrator empunhar raquete hipercolorida e trocar bolinhas com a meninada.
Nossos preconceitos podem nos separar de momentos de divertimento e mesmo de algum crescimento intelectual, isso é certo. Exposto o relato, devo confessar que aproveitei bem aqueles 15 minutos finais. Não podia adivinhar que aquela manhã me reservava experiência até que aprazível. Não por aquele esporte em si, mas pela graça do jogo, pela brincadeira, pelo entusiasmo contagiante de meus colegas juvenis. O que teria perdido se, emburrado, rosnasse: “jogo esse trem não, sô!”?

* * *

A título de posfácio: não, atlético leitor, não pretendo retornar ao tênis de areia. A mim me bastam as caminhadas rurais na companhia do cachorro, a academia matreira, a pelada seguida da cervejinha. Mas se eu estiver ali do lado de fora, quarando ao sol enquanto bolinhas zunem no ar, e algum atleta faltar, pode contar comigo para completar. Pois não serei eu que, por ranhetice ou egoísmo, botarei fim prematuro à diversão de ninguém.

Wendell Guiducci

Wendell Guiducci

Wendell Guiducci é jornalista formado pela Faculdade de Comunicação da UFJF, mestre e doutor em Estudos Literários pela mesma instituição. Na Tribuna, atuou como repórter de cultura e foi editor de internet, de esporte e do Caderno Dois. Natural de Ubá, hoje desempenha o papel de editor de integração da Tribuna e assina, todas as terças-feiras, a coluna de crônicas "Cronimétricas". Lecionou jornalismo, como professor substituto, na Faculdade de Comunicação da UFJF entre 2017 e 2019, e entre 2021 e 2022. É autor dos livros de minificções "Curto & osso" e "Suíte cemitério". Também é cantor da banda de rock Martiataka e organiza sua agenda rigorosamente de acordo com os horários de jogos do Flamengo. Instagram: @delguiducci

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