Há uma diferença de idade entre irmãos na qual é possível que um seja criança e o outro já adulto. Um pensa em carrinhos de brinquedo, outro num Fuscão Fafá de Belém. Mas o tempo dá conta de ajustar os interesses pouco a pouco, e a velhice cuida de equalizar os assuntos para que a prosa flua nos raros encontros, permitindo diálogos como esse, entre um de 85 e outro de 94 anos:
– Como vai mano?
– Eu vou bem, e você?
– Vou indo, rapaz, vou indo. E as novidades? Conta as novidades.
– Ah, não tenho novidade não. É do quarto pra cozinha, da cozinha pra sala, da sala pro banheiro, do banheiro por quarto, uma caminhadinha no corredor. Tem novidade não.
– Ah, mas deve ter sim. Conta uma novidade aí, mano!
– Mas não tem.
– Não é possível. Conta aí, sô!
– Mas você é enjoado! Então tá. Quer ouvir mesmo?
– Pois se eu tô perguntando, uai.
– Pois então, apareceu uma dor nova. Aqui embaixo do joelho, ó. Não é no joelho, é embaixo do joelho, compreendeu? Nem na canela, nem no joelho. Embaixo do joelho.
– Mas rapaz, é mesmo? Embaixo do joelho?
– Pois é. Novidade essa.
– Essa é mesmo.
– E você? Que conta de novo?
– Ah, mano, não é bem novidade, eu fico até sem graça…
– Sem graça comigo? Limpei sua bunda, sô! Conta a novidade aí.
– Não é igual a sua assim…
– Conta, homem!
– Então, quando o tempo vai esfriando nessa época começa a doer muito meu braço e minha perna, onde tem placa de metal. Sabe as placas? Do acidente?
– Qual dos acidentes?
– Do último, que a moto me pegou.
– Ah.
– Então. Acho que o metal encolhe com o frio, não sabe? E no que ele encolhe ele deve puxar meu osso junto e dói pra diabo. Mas é a lei da física, né?
– É a lei da natureza.
– A lei da natureza.
– É isso. Então… comer um bolinho?
Novidade