Gostaria de pedir licença ao estimado leitor para utilizar este espaço e redigir uma mensagem aos amigos distantes. Àqueles que moram em outros estados e cidades longínquas, e mesmo àqueles que agora falam e pensam em outras línguas, vivendo seus cotidianos na Europa, na Oceania, na América do Norte ou na América Espanhola. Qualquer um que não utilize, enfim, o código de Discagem Direta à Distância 032.
Ocorre que eu, como muitos brasileiros, tenho sido frequentemente assediado por corporações de naturezas diversas. Perversos, tentam me vender planos de telefonia e TV a cabo, cartões de crédito e internet banda larga, geladeiras e empréstimos suicidas. Ligam-me diuturnamente. Não respeitam almoço ou janta, futebol ou dia santo, não importa se estou à mesa, na cama ou no banho. Tem sido um inferno, devo confessar-lhes.
Antes eu atendia. Explicava que não queria crediário nem planos quaisquer que não fossem elaborados por mim mesmo. Com o tempo, todavia, minha serenidade e condescendência foram sendo minadas pela insistência desumana dos pobres atendentes, escravizados e robotizados pela máquina nefasta da economia telefônica de mercado, arautos descartáveis do império do call center.
Todavia, o mesmo gênio humano que oferece meus dados às companhias multinacionais, desenvolveu um precioso engenho que tem sido meu aliado na inglória luta para me preservar do assédio: se chama bina. Acrônimo para a frase “B Identifica Número de A”, essa tecnologia permite que saibamos em nossos telefones celulares, e mesmo nos fixos, quem está nos ligando. Quando vem o chamado, eu olho a tela. Se não for um número gravado na agenda e devidamente nomeado, ou não for de DDD 032, ignoro. Na tora.
Porque pra mim, se é 031, é da Oi.
Se é 011 é Santander.
Se é 021 é Vivo.
041 é Bradesco.
Visa, Renault, Master Card, Claro e por aí vai.
Assim deduzo. E recuso a chamada.
Temo, entretanto, que uma dessas vezes possa ser um de vocês, desgarrados amigos e amigas, primos e primas, tias e tios, tentando estabelecer contato. E quero, por meio destas mal traçadas, que saibam que jamais recusaria ligação de vocês, pois sempre me alegra o coração ouvir uma voz querida que há muito não me falava. Uma voz que não me queira tirar uns reaizinhos, um “Eduardo” qualquer sem coração, porta-voz virtual do reinado do consumo.
Peço, portanto, que, uma vez que não tenho gravado na agenda o número da maioria de vocês, amigos saudosos e distantes, evitem me ligar de fora da área de cobertura 032, ou mesmo enviar WhatsApp, outra ferramenta que tem se tornado impertinente e insidiosa. Deem preferência a outras formas de comunicação um-a-um, como as ferramentas de mensagem direta das redes sociais e o e-mail, esse mecanismo quase abandonado e por qual redescubro maior afeto a cada dia.
E, ainda, àqueles que tiverem meu endereço – que obviamente não publicarei aqui sob pena de ser invadido também via Correios -, que seja o endereço da casa de minha mãe, onde passei minha infância e primeira juventude, me escrevam de próprio punho. Deixem-me lê-los. Concedam-me o prazer de rasgar o envelope, desdobrar o papel e reencontrar sua caligrafia. Apenas não se coloquem, como essas tantas corporações, na condição de terem suas ligações indeferidas.
Pois seguirei recusando tudo que não for 032.
Uma vez que ninguém me ligará para oferecer o grande prêmio da loteria, o que tenho a perder é a alegria de um “alô”.