Terminei de ler por esses dias “O século do vento”, último volume da monumental “História do fogo”, de Eduardo Galeano. Levei uns quatro anos para terminar, mas não porque seja ruim, pelo contrário: porque é bom demais. Juiz de Fora aparece uma única vez no livro, que narra, num misto de jornalismo, história e poesia, a saga da América no século 20. E essa única vez em que Juiz de Fora aparece é no ano de 1964, quando o general Olímpio Mourão Filho desceu com seus tanques para fazer o golpe militar que jogaria o país numa era de chumbo e sangue.
Ontem comecei e terminei de ler “Um millennial no centro do mundo”, do jovem professor Waldyr Imbroisi. Levei um par de horas para terminar, não porque seja ruim, pelo contrário: porque é bom demais. E Waldyr tem uma curiosa teoria de que o centro do mundo, hoje, é a esquina das ruas Halfeld e Batista de Oliveira, onde a odisseia de Jair Bolsonaro conheceu seu ápice com a facada desferida pelo desequilibrado Adélio. Reverberam no mundo inteiro os tremores que emanam daquele lugarzinho, epicentro onde Bolsonaro foi ungido pelo Bispo e, cito Waldyr, “as gentes rezam, sobrevivem e comem pastel”.
Também ontem assisti na TV à entrevista da jornalista Míriam Leitão com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e os presidenciáveis Marina Silva e Ciro Gomes. Falaram mais de uma vez sobre os riscos que a democracia brasileira corre diante dos frequentes arroubos autoritários do atual presidente da República. E, em duas oportunidades, Ciro citou Juiz de Fora. Para quê? Para lembrar da deletéria marcha de Olímpio Mourão, integralista e golpista, “uma vaca fardada” em matéria de política, nas palavras de Galeano, mas que, em matéria de conspiração comunista, gabava-se de ser catedrático.
Mas foi isso que lhe reservou a história, ó Juiz de Fora? Tua fama é essa nuvem plúmbea a cobrir-lhe os mares de morros? Essa herança de conservadorismo, de autoritarismo, de caretice, de um militarismo enamorado do totalitarismo? Ora bolas, então, se cunhasse hoje tua própria moeda, ó Princesinha de Minas, escolheria para efígie a carranca calva de Olímpio Mourão ou a careta esfaqueada de Jair Bolsonaro ali no centro do mundo? Não poderia ser a face amistosa de Marcelão Panisset, bebendo uísque com Amarula às quatro da manhã sobre o parapeito capenga do velho Cultural, no verso da pratinha de 1 cruzeiro?