Eu vinha dirigindo pela MG-133 quando Céu começou a cantar “Amor pixelado”.
“Quando você for
Estarei aqui, firme como o chão
Tornando real
Desatando nós que a distância fez
Que confundem
Fazem disso tudo um drama
Pra nós dois como um
Amor pixelado”
Não sei bem o que ela quer dizer. Me interessa mais a força poética das imagens que constrói em seu canto melancólico.
E essa expressão, “Amor pixelado”, trouxe à flor do meu cocuruto o pensamento sobre nossas vidas pixeladas, nossas relações virtuais, nossos afetos digitalmente construídos.
(Pixel: qualquer um dos pequenos elementos que constituem uma imagem [como numa tela de TV ou de computador]. Fonte: Merriam-Webster Dictionary)
A lógica da construção de imagem pessoal nestes tempos de virtualidade e superficialidade segue a lógica do pixel.
Da mesma forma que um amontoado de pontinhos de luz constrói uma imagem digital, os perfis nas redes sociais, os posicionamentos, as postagens, os tweets, os instantâneos cuidadosa e lentamente produzidos definem a personalidade pública das pessoas.
E da mesma forma que a composição de pixels é a imagem da coisa e não a coisa em si, o conjunto de fotos e textos que nos definem nas redes é apenas imagem, e não a gente em si.
E podem configurar uma bela ciberarapuca.
Porque além de formar personalidades irreais, podem construir relações fantasiosas.
Carinho a 10MBps, a ilusão do cuidado. Realidade virtual de afetos.
A troca do toque pelo touch-screen.
Do amor pelo amo muito.
Likes e loves a criar elos frágeis como nossas conexões sem fio.
Que se dissolvem ao primeiro rugir de trovão, à menor ameaça de intempérie.
Estar on-line não é passar a noite acordado de mãos dadas ou sair em desabalada carreira para um abraço de consolo. Conversar olho no olho. Comer juntos. Secar lágrimas de choro ou gargalhada.
Pixel não tem cheiro nem sabor, não tem toque nem calor. Não é “firme com o chão”.
Quando muito, pixels confundem, “fazem disso um drama”.
Um simulacro da existência.
Uma vida pixelada.