Deterioração fiscal: há saída para a crise?

Por André Sobrinho e Bruno Gomes.

Embora o pior período relativo à pandemia do coronavírus já tenha passado no Brasil, os impactos causados pela Covid-19 proporcionaram uma piora significativa no desempenho do setor público consolidado (SPC) no ano de 2020. O déficit primário acumulado nos sete primeiros meses do ano atingiu 13,3% do PIB, ao passo que o déficit acumulado no mesmo período de 2019 foi de 2,1% do PIB.

A dívida líquida do setor público alcançou o patamar de 60,2% do PIB no mês de julho, correspondendo ao nível mais alto desde setembro de 2002. A dívida bruta aumentou 8,3 pontos percentuais do PIB entre julho de 2019 e julho de 2020, quando alcançou 86,5% do PIB. O déficit do governo central acumulado até julho foi de R$ 506,8 bilhões, comparado a um déficit de R$ 35,9 bilhões em igual período no ano de 2019. A maior parte do crescimento do déficit (R$ 327,2 bilhões) pode ser atribuído ao aumento das despesas primárias e uma outra parte menor, mas significativa, pode ser atribuída à queda da receita líquida (R$ 143,7 bilhões).

No lado das despesas, os gastos com a pandemia representaram 80% do crescimento das despesas primárias, somando R$ 273,4 bilhões até julho. No PLOA 2021 (Plano da Lei Orçamentária Anual 2021), que foi enviado ao Congresso no fim de agosto, a meta de resultado primário contida não será restritiva, conforme aconteceu em anos anteriores. Dessa forma, considerando o cenário de incertezas, a meta do resultado primário irá depender de reavaliações da receita, respeitando o teto de gastos. Algumas previsões do PLOA indicam que o Brasil deve completar 10 anos de resultados primários negativos em 2023.

As perspectivas para a economia, portanto, dependem essencialmente da redução das incertezas quanto à política fiscal diante do aumento expressivo do déficit e da dívida pública resultantes das medidas adotadas para frear o avanço da pandemia e os seus efeitos, assim como das pressões acumuladas pelo aumento de gastos. Ainda que a deterioração fiscal de 2020 seja transitória de forma predominante, e seu impacto sobre a dívida pública seja compensado, em parte, pelas baixas taxas de juros vigentes, há um aumento da necessidade de adotar medidas que propiciem uma trajetória sustentável da relação dívida/PIB.

A necessidade de equalizar a política fiscal é imperiosa. Será preciso muito trabalho por parte das autoridades governamentais responsáveis pela política econômica. Algumas ações de apoio às famílias e às empresas foram desenhadas para garantir que os gastos e as renúncias de receita não durassem para além do final do ano de 2020. Dessa forma, as projeções indicam que haverá retorno dos gastos públicos primários para os patamares anteriores à crise. Também é aguardada a retomada do crescimento das receitas tributárias, embora deva ser uma retomada gradual e lenta. A pandemia, de certa forma, forçará o Brasil a recuar alguns passos no seu esforço de consolidação fiscal.

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