As veias abertas da América Latina

Por André Sobrinho, Leonan Ferreira e Vinícius Viegas

A América Latina já viveu dias mais equilibrados e prósperos em termos políticos e econômicos. Vários países latino-americanos passaram por protestos e manifestações violentas nos últimos meses. O caso mais emblemático é o do Chile, onde a situação ainda é grave: o presidente Sebastián Piñera não conseguiu controlar os ânimos da população com o lançamento de um pacote social. Os confrontos entre os manifestantes e as forças policiais são constantes e já ocasionaram várias mortes no país. As eleições na Bolívia também desencadearam reações muito violentas, a ponto
de Evo Morales renunciar à presidência da nação boliviana, após forte pressão da OEA, Organização dos Estados Americanos, que afirmava que as eleições do dia 20 de outubro no país haviam sido fraudadas. Outro caso alarmante é a grave crise migratória em curso na Venezuela, com milhões de venezuelanos tendo deixado o país em decorrência da repressão por parte do governo e do difícil acesso a produtos básicos. Além desses casos, também há forte agitação política na Colômbia, Peru, Paraguai e Argentina. Neste último, em particular, há uma insatisfação geral, com disparada da inflação e recessão.

Muitos apontam para o decepcionante crescimento econômico sul-americano ou aumento da pobreza como causas de tamanha instabilidade política, mas na realidade estas são apenas consequências de um problema catastroficamente mais profundo e complexo. A constante crise da democracia no subcontinente, que pode ser evidenciada com a fraude nas eleições bolivianas, a ditadura na Venezuela e a volta de líderes da FARC na Colômbia, além do histórico de regimes autoritários em diversos países da América do Sul são um fator. A incapacidade dos estados sul americanos em manter governos democraticamente sólidos e instituições que promovam a pluralidade chama a atenção e tem impacto direto no desenvolvimento das nações. Outro fator relevante, que surge como consequência do primeiro, é a sustentação de níveis altos de desigualdade de renda, que no longo prazo e somado a políticas econômicas equivocadas que geram, por exemplo, quadros de inflação, resultam em grande descontentamento social, retroalimentando as instabilidades.

A América Latina é a região do mundo com o pior desempenho em produção econômica. As projeções do Fundo Monetário Internacional (FMI), para 2019, são de expansão do PIB de somente 0,2%, número inferior ao crescimento de 1,4% anunciado há seis meses. O crescimento pode se transformar em recessão, pois as projeções foram realizadas antes da ebulição dos protestos no Chile e na Bolívia, sendo o primeiro responsável por puxar para cima o crescimento do subcontinente nos últimos anos.

O problema fica ainda mais preocupante pois essa instabilidade, em conjunto com os protestos, tende a piorar ainda mais a situação no longo prazo. Vale destacar que os países em crise tem grandes laços econômicos entre si e, com a desordem, essas relações se enfraquecem e a crise se agrava ainda mais. O segundo ponto de ressalva é quanto a investimentos internacionais. A situação atual traz muita insegurança para o futuro, o que representa risco e faz com que haja uma fuga de capital para outros territórios mais estáveis. As veias abertas da América Latina continuam abertas e expostas a regimes instáveis. Para que haja uma retomada, medidas estruturais e definitivas são necessárias.

Tribuna

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