O menino que eu era, voltou!

Por Jose Anisio Pitico

Eu penso que a vida humana é feita por várias fases, por vários momentos que nos colocam na construção permanente do desenvolvimento pessoal, de todos nós. Da infância à velhice. Nessa trajetória, nessa caminhada passamos por várias relações sociais com as pessoas: começando na família, na formação educacional (escola, ginásio e universidade) e no trabalho. O processo de autoconhecimento não pára. Acredito que é fundamental ter a continuidade da busca por nós mesmos. Puro desassossego!

Hoje na entrada da idade que me coloca na Terceira Idade, vejo-me envolvido em memórias da minha meninice em Porciúncula. O clube Caça e Pesca. Com um campo de futebol bem cuidado, margeado pelas águas do Rio Carangola. Onde a “pelada” começava sempre no final de tarde, devido ao declínio natural do sol, que por lá, continua muito forte. Esse rio traz para o meu coração a presença doce do meu pai. Em sua companhia, quando criança, entrávamos no Rio, ele ia na frente, eu ia mais atrás. Nosso objetivo, mais o dele, com certeza, era pescar lambaris e piaus. O meu, eu não sabia bem naquele momento da vida, mas hoje, eu sei e tenho consciência: era o desejo de seguir seus passos, mesmo na água, eles não se foram de mim. Além do registro afetivo da pescaria, o futebol também me dava a segurança e o amor de ter meu pai.

Assim como as águas do Rio Carangola, a vida passa. A vida corre. E a gente vai crescendo. Vai ficando velho. Vai vivendo e vai morrendo todos os dias. E nessa “Semana Santa” em que temos a lembrança viva de Jesus – com seus ensinamentos registrados nos evangelhos dos apóstolos – vem as reflexões necessárias sobre o nosso modo de viver. Como estamos criando a nossa vida nos nossos dias? Nossos rios com seus peixes estão comprometidos e com os dias contados. Olhemos para o nosso Rio Paraibuna, um lixo só, que depositamos nele todas as nossas indiferenças pelo cuidado com o ambiente da natureza. Destruímos a nós mesmos. E seguimos. Como se fosse normal e natural vivermos sem vida. Pelos dias santos que estamos vivendo nessa semana, precisamos agir, além da oração.

É por esse mesmo Jesus que eu estou na luta. E sou um seguidor. Com a fé e com a coragem de quem acredita em uma outra forma de estar no mundo. Com mais compaixão e amor. Admito que possa ser pelo momento da idade, que quanto mais eu vou para frente, mais eu trago em mim todas as coisas de um menino. Olhando a fotografia da criança, que eu fui um dia, em cima do móvel da sala, percebo o mesmo sorriso e rosto de quem ama a vida.

Nossos desejos e sonhos não estão fechados e restritos, unicamente numa fase da nossa vida. Como diria a poeta de Goiás, Cora Coralina, “eu tenho todas as idades”. É verdade. Nenhuma fase da nossa vida é capaz de iniciar e terminar as potências que dão brilho aos nossos olhos e vigor para as nossas ações. Somos nós que fazemos as etapas pelas quais passamos pela vida. E não são as idades, que conformam a nossa identidade e subjetividade. Quem tem o protagonismo da/pela vida é a pessoa; e não, o tempo de vida que ela tem.

Jose Anisio Pitico

Jose Anisio Pitico

Assistente social e gerontólogo. De Porciúncula (RJ) para o mundo. Gosta de ler, escrever e conversar com as pessoas. Tem no trabalho social com as pessoas idosas o seu lugar. Também é colaborador da Rádio CBN Juiz de Fora com a coluna Melhor Idade. Contato: (32) 98828-6941

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