Nossa, nem parece que você é avó!

Por Jose Anisio Pitico

Ser uma pessoa idosa, na árdua e permanente construção de si mesmo ao longo da vida, é uma tarefa existencial muito difícil e, muitas das vezes, solitária para se cumprir e para se realizar. Encontramos poucas mãos de socorro na caminhada. Temos muitas pessoas que envelhecem no silêncio. No escuro. E no abandono. O envelhecimento social faz muito mal à nossa saúde. Convenhamos: envelhecer, de um modo geral, no contexto nacional, não é nada fácil, num país, como o nosso, com uma cultura pública que despreza as pessoas pela idade que elas conquistam ao longo de suas trajetórias. Caminho previsível – e pouco desejável – para todos nós.

Essa sociedade etarista e gerontofóbica aposta e estimula um modelo de envelhecimento que diminui as pessoas, a todos nós, mesmo com uma nova situação colocada que é o fato de que estamos vivendo mais e vamos viver muito mais. Só não envelheceremos se partirmos antes. Pelo senso comum, escuto que todo mundo quer viver muito, de preferência, ninguém deseja morrer, mas recusamos o envelhecimento, como se fosse possível, viver muito sem envelhecer. Objeto das experimentações reais da inteligência artificial.

A versão social predominante direcionada para o nosso envelhecimento, reforçada pela nossa educação nos contatos sociais, apresenta fortemente uma gama de expectativas de como nós devemos envelhecer – a de que não nos oferece nenhuma possibilidade de vida e de futuro; o conceito difundido de que envelhecer é, fatalmente, adoecer; não ter desejo sexual; não ter competência para definir suas necessidades e interesses. A sociedade capitalista de valores sociais mercantilistas e utilitaristas desvaloriza as pessoas idosas, a grosso modo, porque elas são tidas como “inativas” economicamente e oneram os cofres públicos. Tem sido recorrente algumas narrativas oficiais colocarem na conta dos mais velhos a falta de recursos financeiros para a Previdência Social.

Sem ter conhecimento específico nessa matéria, não fica difícil afirmar que, com o aumento muito rápido da população idosa no Brasil, essa situação vai trazer um desafio enorme na gestão da política econômica e pode trazer drásticas consequências nas condições de materialidade da população idosa, se não houver deliberações consensuais entre todos os setores envolvidos, porque vamos ter em breve, e essa matéria já ocupa a agenda de vários países, como a França, mais recentemente, que vivencia nas ruas a organização política contra a decisão do governo em aumentar o tempo de vida para o benefício da aposentadoria. Na esteira de outras reformas que estão acontecendo no Brasil, a da Previdência precisa entrar na agenda nacional. Urgente! A questão que fica é essa: quem vai pagar a conta do nosso envelhecimento populacional?

Se a realidade (nova) do nosso envelhecimento traz sérias implicações no cenário social, econômico e político, na conformação de uma outra socialização, na miudeza, não menos importante, de nossas relações cotidianas à imagem da maturidade – o processo de envelhecer – precisa ganhar respeito e dignidade. Olhar para si. Porque, de um modo geral, também, quem anuncia que estamos ficando velhos são as outras pessoas. Aí recebemos comentários do tipo: barriguinha avantajada!; tá ficando careca, hein?; novas rugas?; que cabelos brancos são esses?. Por outro lado, parecer bem e estarmos bem com a idade mais avançada, não pode; temos que estar na caixa do desenho de velhice que a conduta social nos impõe. Conduta que nos aprisiona e nos coloca menores do que desejamos ser. E podemos mais. Muito mais. A conquista do envelhecimento nos coloca novos desafios na certeza de que temos muita vida pela frente. A história (a nossa) não acabou.

Jose Anisio Pitico

Jose Anisio Pitico

Assistente social e gerontólogo. De Porciúncula (RJ) para o mundo. Gosta de ler, escrever e conversar com as pessoas. Tem no trabalho social com as pessoas idosas o seu lugar. Também é colaborador da Rádio CBN Juiz de Fora com a coluna Melhor Idade. Contato: (32) 98828-6941

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