Vivemos numa sociedade que não aposta na felicidade das pessoas. Não temos este treinamento. Nossas relações são muito distantes dos sentimentos de uns com os outros. Vemos pouco e ouvimos menos ainda o que o outro tem a dizer. É porque também, na verdade, não ouvimos a nós mesmos.
Na convivência social está padronizado que nossas reações, comportamentos e atitudes têm que estar de acordo com a nossa idade cronológica. No desempenho dos papéis em resposta a cada idade. Das crianças, deseja-se que elas cresçam e socializem-se, brincando. Dos adolescentes e jovens, que eles e elas estudem e tenham um futuro com um bom emprego (bons tempos, heim?). Dos adultos, que trabalhem e criem seu patrimônio familiar e material. E das pessoas idosas, o que a sociedade espera delas? Qual é a função social daquelas e daqueles que estão com a idade de 60 anos e mais?
A sociedade não só determina e enquadra o nosso amanhã, conforme a nossa idade, como também nos encaixa em gavetas certinhas e separadas umas das outras, para como deve ser a nossa expressão amorosa. Com o acúmulo da idade em nós, na vivência do tempo, as possibilidades de vida e de viver vão se fechando no caminho de todos nós que envelhecemos, e também as conquistas existentes vão sendo colocadas longe das nossas mãos e de nossos pés. Longe de nós mesmos. A sociedade teima em roubar de nós, desde que nascemos, tudo aquilo que nós somos. Como, se ao envelhecer, eu não me pertencesse mais. Não fossem mais meu: a vida, as amizades, as brincadeiras, o sexo, o amor, a diversão e a arte, entre outras delícias.
E falando de amor, nada mais cruel e desumano do que proibir e negar o amor aos mais velhos. Aos que chegaram antes de nós. Não precisa ir muito longe. Basta um casal de pessoas idosas trocando afetos, beijos, publicamente, que logo são inundadas por silêncios de reprovação e por falas e discursos raivosos, de ódio e de preconceitos do tipo: velhos “assanhados”, “safados”, “sem noção”.
A eles, o amor não é permitido. Por quê? Porque somos uma sociedade carente de saúde em todos os sentidos. Uma sociedade que não aprendeu a amar. Que não ensinou o amor nas relações humanas. E que qualquer manifestação mais próxima do afeto e da compaixão logo vem uma piadinha carregada de desrespeito e de desqualificação da pessoa. Nossa! Como nos dias atuais precisamos de amor e de amar! Precisamos, sim, descobrir uma outra maneira ou criarmos outros modos de estarmos na vida, diante de nós mesmos e dos outros. A idade não pode definir quem somos. Somos muito maiores do que carimbos, números, mapas, estatísticas e testes.
Chegará o dia, e esse dia já está bem real no nosso horizonte, em que seremos livres para amar. Muitas pessoas, felizmente, apesar de tantos nãos e violências diversas, não desistem de amanhecer e estão re/construindo suas vidas na opção final e verdadeira pela expressão de seu amor, independente de qualquer idade e de convenções sociais. E se falo de idade, refiro-me ao universo do envelhecimento em que muitas pessoas idosas estão amando e amam e nascem e estão nascendo todos os dias na companhia de quem lhes faz bem. Na maneira delas, ao modo delas. O que só o amor pode nos dar.