Sentir no peito uma dor dilacerante. Talvez nĆ£o seja a frase que dĆŖ conta de descrever como Ć© sentida a dor de um pai que perde um filho. Pensei muito sobre isso, nesta semana, depois que jornais de todo o mundo divulgaram a foto de um pai segurando a mĆ£o da filha morta, aguardando resgate entre escombros apĆ³s o terremoto na Turquia. Ao me deparar com essa imagem, imediatamente fui consumido por uma enorme tristeza. Imediatamente, coloquei-me no lugar daquele pai.Ā
Todavia, apesar de toda a compaixĆ£o que Ć© possĆvel ter diante de uma tragĆ©dia como essa, nĆ£o dĆ” para saber o que acontece no coraĆ§Ć£o de um pai e de uma mĆ£e que perde um filho. E que bom seria se jamais alguĆ©m pudesse saber como Ć© sentir essa dor, mas nĆ£o Ć© assim que acontece. InsuportĆ”vel, indescritĆvel e inominĆ”vel sĆ£o palavras usadas para quem jĆ” a experimentou.
A morte de um filho Ć© algo que rasga a lĆ³gica da vida de que os pais morrem primeiro, jamais o contrĆ”rio. Acredito que essa deve ser uma ferida que nunca se estanca. Que deixa uma cicatriz que, por mais que se aprenda a viver com a falta, fica evidente e, a qualquer momento, pode voltar a sangrar. Dizem que o tempo cura tudo, mas, nesse caso, a dor poderĆ” ser atĆ© menos sentida, porĆ©m, de modo algum, superada.Ā
O pai que aparece na foto Ć© Mesut Hancer. Ele ficou horas sentado e agarrado Ć mĆ£o de Irmak Hancer, de 15 anos. Em luto, o homem recusou-se a sair do lado do corpo da filha, esmagada no prĆ³prio colchĆ£o pelos escombros de um prĆ©dio. Essa imagem tornou-se uma das mais comoventes da tragĆ©dia provocada pelo terremoto devastador, que deixou milhares de mortos na Turquia e na SĆria.
Tal imagem me fez pensar na minha filha e no quanto ela Ć© importante na minha vida. Pensei tambĆ©m em meus pais e no quanto de amor eles dispensaram a mim. Amor de pais por seus filhos Ć© algo incondicional e, na maioria das vezes, quase nada exige em troca. Os filhos sĆ£o a continuaĆ§Ć£o de seus pais. SĆ£o o futuro e a esperanƧa. Se esse ciclo Ć© rompido, penso que deve ficar um vazio. Imagino que devem sobrar o desejo de guardar a memĆ³ria dos momentos vividos e todo o afeto compartilhado, apesar da dor da perda.Ā
Como jornalista, jĆ” cobri muitos fatos nos quais pais perderam seus filhos, como acidentes e atĆ© assassinatos. Para mim, essas sempre foramĀ as reportagens mais sofridas de fazer. A gente tambĆ©m perde um pouco diante de um pai e de mĆ£e que chora pela perda de seu filho. Se vocĆŖ leu este texto atĆ© aqui e tem filhos, nĆ£o perca mais tempo: vĆ” atĆ© eles e lhes dĆŖ o abraƧo mais apertado e carinhoso possĆvel. A vida Ć© como o vento. Ćs vezes moderado, Ć s vezes intenso, mas sempre passa muito rĆ”pido.