Essa coisa começou com os festejos de São João. Meu pai me disse que ia encontrar o irmão. Onomástico e aniversário. Sessenta anos, não é possível! Eu me assustei com o tempo nos outros. Como pode? Joãozinho preserva o rosto de menino.
Foi aí que comecei a pensar nas festas de São João. Pensei em como era impossível me fantasiar de caipira porque caipira eu já era e sigo sendo. Adorava as festas juninas, muito mais do que o carnaval. Sinto saudade todo ano de comer um prato de canjica com amendoim. Mas passa. Ai de mim se não!
Nesses dias de carne crua exposta e à mercê das fotos lá no fundo da caixa, imagens amareladas sem qualquer zoom possível, uma imagem da menina de seis anos, ainda analfabeta, ainda incontinente, gargalhando sem os dentes da frente enquanto dança quadrilha com o colega. Martinho era meu namoradinho na época. A sala tirava um cochilo em algum momento da aula e nós, crianças, todos deitados em esteiras que, em casa, a gente guardava para quando fossem necessárias, ao lado dos enfeites de Natal, as esteiras de praia lá nas profundezas de Minas. Deitados para um cochilo, Martinho buscava meus olhos e quando os encontrava, piscava. Era isso quase sempre. Na minha cabeça, seu nome era Marto. Ele está gravado nessa foto junina numa tarde de imensa alegria minha.
No meu Spotify tocou Ponta de Areia. Preciso enviar uma foto minha para uma jornalista. Escolho uma e olho a da festa junina. Quarenta anos separam aquela menina analfabeta de mim.
Apesar de uma vida, sigo imatura como aquela da foto de São João, rindo à toa, parecendo uma boba. Também sigo acreditando no amor. Não no do Martinho, mas no de piscadas dos olhos que ainda se buscam e que ainda não se encontraram porque o amor segue sempre vivo, mesmo que a gente adormeça e morra. E que volte sempre o amor, mesmo que a gente o mande embora por venda, por troca ou por desistência.
Eu tinha um gato de porcelana horroroso, mas de estimação. Era tão feio que minha mãe não me deixava trazê-lo pra casa. Morava na casa da vó. Chamava-se Gato – tenho alguma dificuldade com títulos. Numa noite de festa junina, algodão doce colando os dedos, entreguei à moça da barraca da pescaria o papelzinho com o meu número, minha senha pra brincar. Tive três chances de pescar um peixinho de cartolina. Quando consegui, aguardei ansiosamente a minha prenda. Nas mãos da moça, reluzente e familiar, o meu gato feio de porcelana. A mãe me pediu desculpas e ele voltou pra casa comigo. Tive tanto medo de perdê-lo que acabei quebrando o gato enquanto levava ele pra todo lado. Mas é preciso – não acreditar – saber que o amor encontra a gente de volta, se a gente não quebrá-lo antes.
Ponta de areia acabou de tocar e já me sinto bem melhor.
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