O que os pais não sabem
Antes de eles saírem pela porta em direção a outra cidade, planejamos cada detalhe juntos, dentro do que estava no nosso alcance. Onde ficariam, trajeto que fariam para cumprir o objetivo da viagem. Tudo acertado, embora, atrás das orelhas, aquela pulguinha infeliz cisme de mandar recados, fazendo com que pese sobre as costas a culpa por ter deixado algo importante de lado. Ainda antes da partida, o peito já estava apertado pela saudade. Vejo pais e mães compartilharem relatos sobre como ficam quando seus filhos saem de casa ou quando eles não estão por perto. Como é doído o avançar lento das horas, até que eles entrem pela porta, para que os pais possam vasculhar com o olhar cada parte da cria e se certificar que ela está sã e salva. Mas devo dizer que do lado de cá, da vivência de filho que experimento, a coisa não é tão diferente. Especialmente nessa fase da vida.
Preocupa saber se está tudo certo com a saúde. Muitas vezes, só nos lembramos da nossa, porque um sintoma ou outro aparece de vez enquanto. Mas com vocês, precisamos saber se está tudo bem sempre. Se alguma consulta de rotina falha, a preocupação desce sem dó, nem piedade. Quando ocorre qualquer pequeno sintoma, qualquer detalhe que salte aos olhos, nasce uma preocupação que grita no fundo do nosso inconsciente, que fica latejando lá dentro. Dói pensar que vocês, depois de tudo o que fazem por nós, possam sentir qualquer desconforto. Não parece justo.
Também há a rotina. Sabemos do que vocês gostam, o que é caro e importante para vocês. Longe dela, me questiono se não vão ficar estressados ou aborrecidos. Se não vai atrapalhar de algum modo. Não sei se vocês se alimentaram adequadamente, se tomaram os remédios no horário certo. Se precisaram de algo, se faltou alguma coisa. Tudo isso está aqui martelando na cabeça, insistentemente.
Não, não tem como desligar o modo preocupação. Mesmo sendo informado por suas palavras que está tudo bem, quem garante que vocês não estão dizendo o que disseram para diminuir nossas inquietações? Vocês já fizeram isso tantas vezes, que não tem como não suspeitar. Além de tudo isso, falta a companhia para o café, para comentar o capítulo da novela, a casa ficou estranhamente silenciosa e parece mais bagunçada, também, embora tenhamos nos esforçado para manter tudo no lugar. O sono não é o mesmo. A cachorra, pobrezinha, está amuada, orelhas baixas, olhar perdido. Nada do que possamos tentar vai consolá-la. É tudo muito esquisito. Mas o pior é não ter o contato olho no olho, o abraço apertado no fim do dia, o acolhimento que só colo de mãe e de pai é capaz de oferecer.
Duas semanas duras de levar. Mas está acabando a agonia. Não vejo a hora de ver aquele ônibus entrar pela lateral da Rodoviária. Parar na plataforma e correr para o abraço. O que vocês não sabem, porque nem sempre é dito, é que vocês são muito mais do que pensam. E independente do que fizermos e do quanto fizermos, jamais vamos conseguir agradecer o suficiente por tudo o que vocês representam. É difícil descrever o quanto o bem-estar e a segurança de vocês é importante para nós. Entendam: quando pensamos em vocês, só queremos que o melhor aconteça sempre. Qualquer outra coisa, diferente disso, é frustrante. Neste momento, não consigo pensar em outra coisa que não seja abraçar vocês, comprovar com os meus sentidos se estão bem. Se posso pedir algo, é que vocês voltem depressa, por favor!