Opinião sob pressão

Na coluna deste domingo, o jornalista Marcos Araújo reflete sobre a pressão de ter opinião para tudo, e o direito ao silêncio num mundo que exige posicionamento em tempo real.

Por Marcos Araújo

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‘Que a gente siga dando nossos tapas na cara da sociedade, sim. Mas que também tenha direito ao silêncio. Não saber o que dizer, e até preferir não dizer, também é um posicionamento’ (Foto: Getty Images)

Ultimamente, tenho me sentido pressionado. Não pela vida em si, que já cobra boletos e produtividade. Mas por uma exigência nova, que às vezes beira a crueldade: a obrigação de ter uma opinião. E não é qualquer uma, tem que ser certeira, definitiva, com potencial de lacrar, render curtidas e ser compartilhada com a legenda: “Concordo em gênero, número e grau”.

Veja bem, leitor (a), meu problema não é com as opiniões. Senso crítico é fundamental, claro. É ele quem nos tira da alienação, nos ajuda a ver por trás das cortinas, a desconfiar das manchetes e do tom paternalista das autoridades. Não sou contra pensar. Deus me livre! O problema começa quando o pensar se torna performático.

Essa reflexão me atravessou nesta semana, e compartilho aqui: hoje, não basta ter uma opinião, ela precisa ser emitida, postada, defendida. Existe uma obrigação de se posicionar publicamente sobre tudo, principalmente sobre aquilo que está em alta. Uma tragédia, uma polêmica, uma nova pauta social? Sua opinião precisa vir em tempo real. De preferência com humor ácido ou em caixa alta.

Sei que é estranho alguém que vive dando opinião, como é o meu caso por meio desta coluna, vir a público falar mal das opiniões alheias, mas acredito que muita gente, em certos dias, se sinta paralisada por essa pressão de lacrar, de encerrar o assunto com uma frase de efeito. E é aí que nasce uma avalanche de opiniões rasas, em que o senso crítico passou longe. Dá vontade de desligar o wi-fi, trancar a porta do quarto e jogar a chave longe.

Eu sei que é maravilhoso a gente se aceitar, dizer não, mostrar quem nós somos. É libertador. Mas, pelo amor de Deus, não vamos transformar isso em mais uma obrigação. Já chega de tantas. O compromisso com a própria liberdade não pode virar mais uma forma de cobrança.

Que a gente siga dando nossos tapas na cara da sociedade, sim. Mas que também tenha direito ao silêncio. Não saber o que dizer, e até preferir não dizer, também é um posicionamento. Às vezes, o silêncio é o único espaço possível para o pensamento amadurecer.

Além disso, é preciso ter a ciência de que as opiniões podem, e devem, mudar. Nenhuma posição precisa ser definitiva. Não permitir que as pessoas voltem atrás ou enxerguem uma mesma situação sob outro ponto de vista também é uma forma castradora de liberdade.

Marcos Araújo

Marcos Araújo

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