Projeto Colorindo o Habitar cria macromural no Bairro Esplanada
A iniciativa faz parte do Programa Boniteza e realiza a pintura de fachadas de casas, buscando a valorização sociocultural
Quem passa pelas avenidas Coronel Vidal e Olavo Bilac, na Zona Norte da cidade, tem acompanhado um processo que faz o trajeto até ficar mais lento. Parar e contemplar para entender o que acontece, lá no alto, na área que corresponde ao Bairro Esplanada. Deu para ver cerca de 90 casas, primeiro, ficando brancas. E, depois, ganhando os tons de vermelho, amarelo, azul e verde. Aos poucos, dá para ver que essa junção vai ganhando forma e representa uma história. É, no fim das contas, as histórias das pessoas que moram naqueles lugares. É o que elas contaram sobre identificação. É também o que o artista plástico Stain, responsável pelo projeto, ouviu e tentou passar, em formas geométricas, para essas fachadas. É também o que Emicida escreveu em “A ordem natural das coisas”: “É o astro rei, okay, mas vem depois”. Mas, o resultado mesmo, só dia 7 de outubro, quando a Secretária de Governo, que coordena o Programa Boniteza e que idealizou o Colorindo o Habitar, tem a previsão de finalizar e inaugurar o projeto.
De longe, o macromural do Esplanada faz todo sentido. Mas é descendo o escadão principal do bairro, lá de dentro, que se entende o projeto por inteiro. Ainda no processo de pintura das casas e revitalização do escadão, dá para ver o branco saindo de perto, o pintor, segurado por um cabo, colorindo cada casa que, de tão próximas, viram uma só. Dá para ver os moradores que tomam conta de todo o processo. Afinal de contas, grande parte dos trabalhadores do Colorindo o Habitar são da comunidade. E até quem não é de lá é como se morasse ali, porque é imersão: mais de um mês inteiro dedicado a cada pincelada em cada muro, a cada massa em cada degrau, entre tantas outras coisas que transformam o lugar. E esse trabalho, na verdade, teve início há um ano e nove meses.
Só mais recentemente, as cores foram tomando conta da paisagem. Mas, para que isso fosse possível, foi necessário uma série de outros planejamentos. A começar pela ideia, que foi da secretária de governo, Cidinha Louzada. Ela conta que passa diariamente pelo viaduto Ramirez Gonzalez e olhava para o Esplanada, imaginava ali ser um ótimo lugar para se fazer um macromural, ainda não tão comum no Brasil. “Eu imaginava que ia ser muito bonito ali se pintasse. E eu acompanho há tempos a luta dos moradores pela melhora nos escadões. E é interessante porque em Juiz de Fora você tem vários escadões que cortam caminho. Mas esse do Esplanada é diferente, ele leva mesmo às casas das pessoas. A gente fez um levantamento e 80% das casas só têm acesso por esse escadão. A nossa ideia foi, então, fazer esse mural, mas incorporando outros detalhes que fossem só no sentido do embelezamento, que também trouxessem cidadania, identidade e que melhorasse o dia a dia e a vida dos moradores.”
Dessa forma, foi necessário, primeiro, conseguir verba para que o projeto fosse feito. “E eu fui conversando com a Júlia Daibert, a arquiteta responsável, para a gente pensar como isso seria feito. Acabou que a gente abraçou o projeto, e a Cesama entrou com a compensação ambiental”, explica Cidinha. E assim nasceu o Colorindo o Habitar. A equipe conta que, para pensar na pintura que seria feita, eles conversaram com os moradores, que foram contando a respeito de quem gostavam no Esplanada. “A gente viu que era uma coisa bem brasileira”, conta Cidinha. A partir disso, Stain fez algumas propostas de arte para apresentar à comunidade, até que essa fosse aprovada. “É até uma arte que facilita esse processo, porque é com figuras geométricas. É o primeiro macromural que eu faço e o primeiro da cidade”, enfatiza Stain.
A vida de uma comunidade
Junto com o processo de pintura, veio a revitalização do escadão. “E o escadão tem muita história, de luta, de alegria, de tristeza. A gente pensou, no projeto, nas memórias de um escadão, que tem muitas vidas”, diz Cidinha. Atenta a cada passo no Esplanada, Marcilea, a moradora que acompanha tudo, de lá, lembra: “E tem as placas, né? A gente votou e cada viela vai ter o nome de um morador, que vai ser homenageado, e que, de alguma forma, é importante para a comunidade”. E, além disso, a ideia é que o lugar seja usado como ponto turístico, sendo lugar comercial, inclusive. Até porque as vistas de cada terraço também são lindas: tanto de fora quanto de dentro, o visual atrai.
Nesta visita ao bairro, dava para ver também algumas paredes ainda completamente brancas, demarcadas com alguma coisa. “Aqui, nessa parede inteira, vai ser um painel de grafite”, explica Stain. As paredes que não dão de frente para a vista das avenidas Coronel Vidal e Olavo Bilac e não interferem no todo do mural também ganham intervenção. Stain até já fez algumas artes menores, mas ele conta que são outros artistas que vão ocupar essas paredes, com desenhos que refletem os gostos dos moradores, apresentados nas reuniões feitas. Ao todo, serão oito painéis. “Porque é importante que a parte de dentro também converse com a comunidade. Isso é para eles mesmos.”
“Encantado com o visual”
Do tablet, Stain vai acompanhando o projeto e sabe qual cor cada casa deve ter. “A referência de onde a gente tem que pintar é a cor da porta, da janela, da caixa d’água. É o que a gente chama de grade orgânica”, explica Stain. Mesmo há mais de um mês ali, transformando o Esplanada em sua segunda casa, é ainda difícil para ele colocar em palavras o que ter sua assinatura nesse projeto representa. “É difícil falar a sensação. Para quem faz arte urbana, acho que esse é o topo. Macromural são poucos artistas do Brasil que fizeram”, afirma Stain.
Os próprios moradores, mesmo vivendo as transformações, ainda afirmam que não acreditam que isso está mesmo acontecendo. “A gente já tem recebido várias pessoas que vêm para visitar e acompanhar o processo. E sempre ouve que está ficando bonito. E antes muita gente não queria vir aqui nessa escada, falava que era perigoso, nem gostava de falar que mora aqui. Agora, pode até falar que mora no Colorindo o Habitar. Quando eu vejo, até choro. Eu ainda não acredito, às vezes”, diz Marcilea. Foi a música de Emicida que inspirou a criação de Stain. E a criação de Stain já inspirou Marley Rodrigues, músico do Esplanada, que canta a música que fez e que espera que a inauguração seja regada a samba, churrasco e cerveja, como os moradores gostam: “Está pintando uma nova favela, mais cheia de cores, tão linda e tão bela. Ela faz parte de mim, e eu faço parte dela. Quem vê lá debaixo do asfalto fica muito encantado com o visual. É um arco-íris de cores, em forma de raio de sol. Se a favela desceu, amanheceu tão bonita, pura arte do Stain”.
Até a inauguração e o depois
Ainda faltam algumas medições, mas, de acordo com projeções do Colorindo o Habitar, o macromural do Esplanada deve ser um dos maiores do Brasil. A Secretaria de Governo afirmou que a proposta é colocar um painel interativo na passarela entre as avenidas Coronel Vidal e Olavo Bilac para que seja possível tirar foto de lá com o Esplanada ao fundo. Além disso, o escadão, que teve os degraus reformados e padronizados de acordo com as normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), até a inauguração, vai receber luz de led e corrimão, para facilitar os acessos. Depois de tudo pronto, a ideia é ver, de maneira prática, de que forma o projeto atingiu a vida dos moradores e, principalmente, a segurança no bairro. A vontade com isso, se possível, é que mais comunidades recebam intervenções como essas.