“Só vive mesmo aquele que se conhece e se aceita”, reflete Renata de Aragão Lopes

Por Marisa Loures

Renata de Aragao Lopes Foto de Wagner Emerich 6
Renata de Aragão Lopes reflete sobre a vida, a identidade, o mundo, a relação com o Outro, a linguagem, o amor puro e a busca espiritual em “A constelação de lira”, cujo lançamento ocorre no dia 19, na Autoria – Foto de Wagner Emerich

Há escritores que lamentam não conseguir alcançar a poesia. Já, para Renata de Aragão Lopes, ela simplesmente acontece. “É algo quase mágico; a reprodução, em palavras, de um encantamento do olhar”, confidencia a autora e compositora, que volta a dividir conosco toda a doçura que sua escrita carrega com o lançamento de “A constelação de lira” (Paratexto, 96 páginas). A noite de autógrafos, regada à apresentação de músicas feitas em parceria com Cacáudio, Thiago Miranda e Seu Rogério (que está vindo de Pernambuco com o zabumbeiro Arthuzinho Vinícius), está programada para o dia 19 de abril, a partir das 18h, na Autoria Casa de Cultura. “Será uma noite linda de poesia falada, música boa e muita, muita alegria! Será um prazer receber todos vocês!”

Lançado com apoio da Lei Murilo Mendes de Incentivo à Cultura e prefaciado pela atriz Larissa Bracher, o quinto livro de Renata traz poemas que foram escritos entre 2012 e 2019, período em que ela passou a se dedicar, “ainda com mais compromisso e seriedade”, a tudo aquilo que, na existência, a deixa intrigada. “A vida em si; minha identidade; o mundo; a relação com o Outro; a linguagem; o amor puro; a busca espiritual. Tudo que está poeticamente neste livro ainda me vem com significado. Ali, em essência, inaugurou-se, em mim, o que chamo de Verdade.”

Já adianto, leitor e leitora, que essa nova obra está sendo lançada agora, mas a história que está por trás dela é antiga, está ligada à infância de Renata. Trata-se de uma verdadeira profecia. E ouso afirmar que, por esse motivo, esse livro chega às prateleiras ainda mais carregado de lirismo. A poesia de Renata se juntou aos traços de Beta Lopes, irmã da autora e responsável pelo projeto gráfico, e o livro é dedicado à mãe dessas duas artistas.

Marisa Loures – Você dedica “A constelação de lira” à sua mãe. Escreve que é um livro que está guardado desde a sua infância e a infância da sua Irmã. Diante disso, percebo que é uma obra que tem um significado muito especial para vocês duas. Gostaria que nos contasse a história que está por trás desses poemas.

 Renata de Aragão Lopes – A história é a de que escrevo desde a infância. E, desde aquela época, eu e minha irmã já produzíamos livros, manuscritos e grampeados: eu escrevia as estórias e ela fazia as ilustrações. Nossa mãe, que sempre nos incentivou muito ao estudo e à criatividade, repetia-nos esta profecia: a de que, um dia, eu e Roberta publicaríamos um livro juntas: escrito por mim e com arte dela. Isso levou bastante tempo. “A constelação de lira” é meu 5º livro, sendo o 2º de poesia. Somente agora, finalmente, minhas palavras se encontraram, oficialmente, com os traços da Beta. O resultado foi este: um livro com cara de presente e dedicado, por óbvio e com imenso carinho, à nossa mãe.

– No prefácio, Larissa Bracher pontua que, na sua escrita, “nada sobra, nada cai.” Você é “visceral sendo sintética.” Já você, Renata, também de acordo com ela, é uma pessoa de uma presença “talhada em adornos, torções e volutas”. Sua poesia, concebida sem devaneios ou enfeites, flui naturalmente? Ou nasce a partir de um trabalho árduo de escrita e muita reescrita?

Meu processo de escrita sempre fluiu muito naturalmente. Costumo dizer que, enquanto a prosa vem do esforço, a poesia simplesmente acontece: é algo quase mágico; a reprodução, em palavras, de um encantamento do olhar. E eu sempre fui muito sintética mesmo, incisiva. Não só na palavra escrita, mas também na falada. Sou do Direito: a palavra tem peso; não é coisa que se deva desperdiçar. O que percebo é que isso tem se acentuado, ainda mais, ao longo do tempo. A maturidade parece nos trazer uma economia cada vez maior de palavras. Já não se floreia tanto, quando realmente se sabe o que se pretende dizer.

– No poema de apresentação, você escreveu assim: “as palavras nascem e morrem/ — sempre conosco./ Gosto desses ciclos que se iniciam e terminam/ em mim”. Considerando que na outra ponta está o leitor, as palavras não continuam, por aí, como estrelas, iluminando os céus de todos que leem seus poemas?

Que pergunta deliciosa, Marisa! Muito obrigada! Do modo como entendo a vida, eu, Renata, sou um evento: porque tenho duração certa, ainda que desconhecida. Meu corpo é sabidamente temporário: começou e terminará em mim. As minhas emoções também: acontecem apenas comigo; ninguém mais sente exatamente do jeito que eu sinto. A individualidade nos concede o privilégio de sermos únicos: em tudo que fazemos. E ainda nos presenteia, em um segundo momento, com a pluralidade: embora iguais em alguma medida, somos absurdamente diferentes uns dos outros. Dessa forma, a palavra que eu escrevi é minha, só minha. E a minha palavra que você lê é sua, toda sua. As experiências internas, na realidade, não são compartilháveis. Cada um vive e morre com a própria palavra.

– Você ainda era uma menina quando foi estimulada a escrever poesia. Em 2009, inaugurou o blog Doce de Lira, onde publicava seus textos. Pelo que pude perceber, desde 2019, o Doce de Lira não está mais sendo atualizado. Os tempos de confeiteira ficaram para trás? O que mudou nos seus planos como escritora?

Escrevo desde criança e, por volta dos 20 anos, comecei a participar de concursos literários. Tenho, inclusive, poemas premiados e publicados em obras coletivas. Em 2009, por sugestão de amigos, criei o blog Doce de Lira, lançando-me como escritora na internet. Foi um período maravilhoso, tanto de experimentação da escrita, quanto de convívio com poetas e leitores de toda parte do mundo. Mas o tempo glorioso dos blogs passou. Vieram outras plataformas digitais e o mundo contemporâneo, célere como é, exige-nos uma constante adaptação. Migrei para o Facebook e, em seguida, para o Instagram. A Confeiteira, contudo, continua aqui. Tanto que muitos me diziam aguardar um “Doce de lira 2”, como se meu primeiro livro de poesia houvesse inaugurado uma série. E, de fato, Doce de Lira é minha marca, com registro no INPI. Foi uma das razões pelas quais escolhi o título “A constelação de lira” – que, aliás, realmente existe no céu (e eu amo o céu). Senti que era preciso preservar a “lira”, porque a doçura já se havia mantido nos versos.

– Você inicia “A constelação de lira” com um poema intitulado “Verdade”. E termina com “mistério”: “A verdade sempre esteve aqui/ mas eu tive que sair para buscá-la/ e voltar de mãos vazias para descobrir.” O que é essa verdade que a poetisa busca?

A origem. A essência. A real identidade. Nenhuma outra pergunta tem valor até que se alcance, minimamente, a resposta da pergunta primeira, que é: quem sou eu? Autoconhecimento é a base para se estar no mundo com consciência. Só vive mesmo aquele que se conhece e se aceita. Sem isso, apenas se passa pelo mundo – na ignorância e na negação.

– “A constelação de lira” nasce com apoio da Lei Murilo Mendes. Que caminho esse livro vai seguir a partir do lançamento?

De imediato, o mesmo caminho percorrido pelos quatro livros anteriores. Participarei de saraus, feiras e encontros literários, sempre divulgando a obra por onde quer que eu vá. Também levarei o livro a diversas escolas públicas e particulares – compromisso assumido perante a Funalfa. É um trabalho que sempre desenvolvo com muito amor: ler poesia em sala de aula; treinar poesia falada com alunos e professores; conversar sobre o exercício da imaginação e da criatividade; propor atividades que promovam o entrelaçamento dos meus poemas com outras artes. E as possibilidades são tantas. Já tenho dez poemas que se tornaram canções. Quem sabe não virão outras músicas? Já fiz campanhas publicitárias com meus versos e minha voz. Que outras oportunidades surgirão com o lançamento de “A constelação de lira”? Impossível prever.

A constelacao de lira

“A constelação de lira”

Autora: Renata de Aragão Lopes

Editora: Paratexto (96 páginas)

Lançamento: 19 de abril, a partir das 18h, na Autoria Casa de Cultura (Rua Batista de Oliveira 931 – Granbery)

 

 

 

 

Marisa Loures

Marisa Loures

Marisa Loures é professora de Português e Literatura, jornalista e atriz. No entrelaço da sala de aula, da redação de jornal e do palco, descobriu o laço de conciliação entre suas carreiras: o amor pela palavra.

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