Edson Leão: ‘Não fecho o botequim para o novo’
Edson Leão Ferenzini lança primeiro trabalho solo de sua carreira, o disco “Mundos achados & perdidos – Tocando solo”

Durante o percurso pandêmico, perder-se e encontrar-se foram movimentos contínuos. Dentro do quarto, o mundo pode ser grande. Um dos caminhos foi voltar para a própria história. Pelo menos foi assim para Edson Leão Ferenzini. O artista que já tinha trabalhos registrados com grupos de Juiz de Fora (Eminência Parda, Sambavesso, Ou Sim e Parangolé Valvulado), lança neste sábado (27) seu primeiro disco solo, “Mundos achados & perdidos – Tocando solo”.
Edson conta que o momento de lançar um disco só seu não foi, propriamente, uma decisão. Cobrado por amigos por ter “repertório represado considerável”, ele conta que, nesses meses, foi buscando formas de se expressar artisticamente em vista do impedimento presencial. Para ele, foi, sim, sobretudo no começo, um episódio traumático. “Parecia que minha relação com a música tinha sido zerada.” Depois de um tempo nessa procura, ele encontrou áudios antigos perdidos. Ao mesmo tempo, começou a mexer em editores de vídeo e teve a ideia de gravar, nele, além da imagem, o som. “Apesar de tudo, por que ficar parado?”, ele se perguntou.
Em uma madrugada, ideias foram surgindo. O ponto de partida para o disco foi a música “Lullaby (canção de acordar)”. A música, um dos primeiros esforços criativos da pandemia, surgiu em meio à notícia de que Aldir Blanc estava na fila do hospital para ser internado em razão da Covid-19. Ele conta que quase parou de compor e que, se não fosse esse fato, a canção até poderia ter sido outra. “Mas foi esse impacto que me fez ter clareza do momento.” Com o tempo, ele percebeu que a música tinha capacidade terapêutica para ele mesmo. Mais tarde, uma amiga a usou em um roda com esse fim. Com “Lullaby” nasceu, propriamente, a ideia do disco.
‘Faça você mesmo’
Aos poucos, novas composições foram surgindo ou sendo reinventadas. “Eu já tinha um repertório cheio de experimentações. Comecei na música com a máxima do punk: ‘faça você mesmo’. Mas as parcerias foram surgindo aos poucos.” Ora Edson experimentava o áudio em cima de imagens, ora as imagens o guiava nas trilhas. Isso foi a pré-produção de “Mundos achados & perdidos – Tocando solo”. Quase que tardiamente, o artista soube do edital estadual da Lei Aldir Blanc e propôs a produção, que acabou sendo contemplada e permitiu as gravações e as finalizações.
Para o trabalho, Edson convidou Julião Júnior, com quem já havia trabalhado outras vezes. Ele ficou responsável pela produção, arranjos finais e execução das músicas no disco. Além de Julião, Patrícia Almeida foi peça chave na construção. Ela contribuiu nas experimentações audiovisuais que deram origem a três faixas, assim como em ideias de ritmos e vocais para a música “Fragmentos sobre essa noite”. A ilustração da capa, feita pelo próprio Edson, também contou com ajuda de Patrícia. É uma colagem de imagens que também apresenta a descoberta das possibilidades da tecnologia: um dos mundos achados por Edson, que ele brinca chamar de “ciber-arte-naif”.

Tecnologia: um mundo achado
A constatação de que a vida social se transformou em uma vida mediada pelas telas foi impactante para Edson. Por isso ele encontrou e perdeu muitos mundos. A descoberta da tecnologia foi um ponto. Mas outro foi o universo da gravação solo. “Fazer um trabalho solo é libertador porque eu, sozinho, tenho controle dos processos de gravação e assumo os riscos. Eu pensei que seria mais fácil, mas não. As decisões são diárias. Eu busquei minha identidade no trabalho e não tive muitas regras para isso.” Apesar de solo, Patrícia e Julião fizeram com que o trabalho não fosse solitário.
Disco gestado no quarto
“O disco teve um mutirão para levantar a casa e um trabalho artesanal para lapidá-lo”, pontua. Sobre as escolhas que fez, não duvida, porque, para ele, o recado foi dado. “‘Mundos achados & perdidos – Tocando solo’ foi gestado no meu quarto. Ele é introspectivo. É triste, sim”, acredita. Para ele, o disco todo tem um roteiro, com começo, desenvolvimento, meio e fim. Apesar de achar que, depois de “Fragmentos sobre esta noite”, a última música do álbum, o ouvinte deveria voltar para a segunda, “Lullaby”. Mesmo triste, ele conta que quis falar, também, sobre o “dom humano de reconstrução”. “O mundo já viveu coisas assim. Existe uma arte pós-traumática de outros episódios.”
Desde os anos 80 na noite, passando por vários grupos e formações, ele acredita que, assim como as ideias, a identidade se transforma. E ele gosta “da possibilidade da mutação”. Não à toa, já dialogou com muitas áreas. Por isso, diz: “Não fecho o botequim para o novo”. A ideia, de acordo com Edson, não é abandonar os grupos que, hoje, integra. Mas somar as duas possibilidades. O mundo novo encontrado que ainda será percorrido.