UrgĂȘncia Ă© fome

Por Marcos AraĂșjo

A urgĂȘncia no Brasil tem nome de fome. Desde o inĂ­cio da pandemia, em 2020, 19 milhĂ”es de brasileiros passaram a conviver, diariamente, com a fome. NĂŁo saber se terĂĄ o que comer no dia seguinte Ă© realidade para muitos. E se antes as pessoas pediam ossos para dar aos cĂŁes, agora elas pedem para dar aos filhos. NĂŁo hĂĄ exagero nessa afirmação, pois estĂŁo aĂ­ para comprovar fotos de fila na frente de açougue para distribuição de ossos com retalhos de carne ou de pessoas vasculhando caminhĂŁo de lixo por sobras de refeição. SĂł a urgĂȘncia de uma barriga vazia Ă© capaz de levar um pai ou uma mĂŁe a desviar comida destinada para cachorro para dar a seus filhos.

Não é a primeira vez que uso o espaço da coluna para falar da fome. Jå contei aqui da vez em que parei no semåforo da Avenida Brasil com a Ponte do Ladeira, e uma mulher aproximou-se do meu carro com uma caixinha de drops à venda. Ao conversar com ela, em poucos segundos, percebi que a mulher me olhava bem fundo nos olhos. Sem eu nada perguntar, ela me disse que estava desempregada e que vender balas na rua era a alternativa que tinha arrumado para espantar sua fome.

Resolvi falar da fome novamente, porque, no Ășltimo sĂĄbado, foi o Dia Mundial da Alimentação. A data foi criada com o objetivo de estimular uma reflexĂŁo a respeito do cenĂĄrio atual da alimentação mundial e tambĂ©m serve de apelo para que açÔes sejam realizadas para garantir a segurança alimentar em todo o mundo. Dados das NaçÔes Unidas revelam que hoje quase 40% da humanidade, o equivalente a 3 bilhĂ”es de pessoas, nĂŁo conseguem pagar por uma dieta saudĂĄvel. Os impactos da Covid-19 agravam ainda mais esse quadro.

Fazer com que as pessoas tenham comida no prato Ă© questĂŁo de polĂ­tica pĂșblica. Mas no Brasil onde o “super” Ă© usado para qualificar ministros, aquele que cuida da economia fez declaraçÔes que apontam para a isenção de sua responsabilidade sobre o combate Ă  fome. Em junho, como mostrou os jornais, em evento realizado pela Associação Brasileira de Supermercados, ele afirmou que a classe mĂ©dia desperdiça comida que poderia servir para “pessoas fragilizadas, mendigos, desamparados”. No seu discurso, Ă© possĂ­vel entender que ele desvia para a sociedade a responsabilidade por desenvolver polĂ­ticas para conter o avanço da fome e da insegurança alimentar.

NĂŁo existe surpresa nesse tipo de fala do ministro, pois ela, junto com diversas outras, formam a filosofia que ora vigora na gestĂŁo do Brasil, que Ă© marcada pelo descaso com os mais pobres. Somos um povo que Ă© resultado da desigualdade social perpetrada por uma elite polĂ­tica e econĂŽmica que despreza aqueles que sĂŁo debilitados.

Para terminar este texto, cito Papa Francisco que, em discurso enviado ao diretĂłrio argentino do ComitĂȘ Pan-Americano de JuĂ­zes pelos Direitos Sociais e a Doutrina Franciscana, disse: “NĂŁo existe democracia com a fome, nĂŁo hĂĄ desenvolvimento com pobreza, e ainda menos, justiça na desigualdade”.

Marcos AraĂșjo

Marcos AraĂșjo

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