O futuro é uma mulher preta

Por Marcos Araújo

“O futuro é uma mulher preta” diz a frase pintada no chão da maior capital do Brasil. O que ela quer dizer para nós? Que não haverá futuro para os brasileiros enquanto o racismo não for extinto da nossa sociedade. Esse é o recado de artistas e ativistas, que pintaram de branco o asfalto negro de uma importante via da cidade de São Paulo, a Avenida Nove de Julho.

Impacto e reflexão eram o que eles queriam causar, depois de cinco horas de pintura. É uma tentativa de chamar a nossa atenção para um mundo que pode ser mais justo e melhor do que esse que conhecemos, tão maltratado pelas mazelas do patriarcado. Um mundo que enxergue as mulheres pretas, reconhecendo nelas a sua importância histórica.

Sabemos hoje que as negras são as que mais sofrem com a discriminação, uma vez que, sobre elas, além do racismo, há o peso do machismo, que as arrastam para o mais desfavorável nível de desigualdade.

Como bem dizem os militantes dessa causa, o desejo maior é da valorização do ser preto, fazendo uma reparação histórica necessária à maior parcela da população, quase 56%, que contribuiu e contribui com a grandeza do país.

Uma semana antes, eles já tinham pintado na Avenida Paulista a frase: “Vidas pretas importam”. O ato aconteceu um dia depois que João Alberto Freitas, de 40 anos, morreu após ser espancado por seguranças de uma loja do Carrefour, em Porto Alegre.

Ao usar a Paulista para escancarar que a população negra não vai mais aceitar a invisibilidade que lhe é imposta, eles querem denunciar que, no Brasil, existe um profundo apagamento histórico e que a sociedade como um todo precisa reconhecer o seu compromisso para reparar esse apagamento. É entender que homens e mulheres negros têm que reivindicar seus direitos, e os brancos precisam assumir a responsabilidade em prol desse processo.

Para que nossa sociedade tenha condições de ofertar aos negros as mesmas oportunidades destinadas aos brancos, é necessário a dissolução do racismo estrutural e, para tanto, é imperioso que sejamos antirracista, e as pinturas no asfalto almejam nos fazerem pensar sobre esse debate, que é urgente para o Brasil e para o mundo.

Aqui, mais do que nunca, porque o racismo estrutural se mantém desde a escravidão, que, ao ser abolida, não representou para os negros a sua inclusão na sociedade e, mais de um século depois, pouca coisa mudou, uma vez que os pretos ainda ocupam os lugares subalternos na escala social.

Ao afirmar que o futuro é uma mulher preta-mãe-trabalhadora, a mensagem quer advertir que precisamos mudar de foco, porque a sociedade que foi construída até aqui, alicerçada no patriarcado e no racismo, não é capaz de garantir o bem comum a todos e que só uma mãe, com uma penca de filhos e sua qualidade de mulher, na maioria das vezes a única a colocar comida dentro de casa, tem o potencial de melhorar esse mundo.

A pintura na Avenida Nove de Julho tem cerca de 100 metros e desperta bastante atenção, mas deve desaparecer com o tempo. Todavia, de forma muito louvável, pretende deixar um legado. Esse, sim, não deve sumir, para que esse futuro não seja apenas sonho, mas uma possibilidade de fato!

Marcos Araújo

Marcos Araújo

A Tribuna de Minas não se responsabiliza por este conteúdo e pelas informações sobre os produtos/serviços promovidos nesta publicação.

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade pelo seu conteúdo é exclusiva dos autores das mensagens. A Tribuna reserva-se o direito de excluir postagens que contenham insultos e ameaças a seus jornalistas, bem como xingamentos, injúrias e agressões a terceiros. Mensagens de conteúdo homofóbico, racista, xenofóbico e que propaguem discursos de ódio e/ou informações falsas também não serão toleradas. A infração reiterada da política de comunicação da Tribuna levará à exclusão permanente do responsável pelos comentários.



Leia também