Desde quando minha pouquíssima altura era insuficiente para ver a mesa posta, aguardava ansiosa pelo café da manhã. Não precisava – e não precisa, até hoje – de firula ou sofisticação. Um pãozinho francês que nem precisa ser fresco e uma manteiguinha motivam uma alegria poucas outras vezes tão genuína.
Na infância, lembro do café da manhã à longa mesa da copa do sítio da Vó Nazinha. Uma bisnaga de pão entregue pelo Seu Antônio, o padeiro que percorria Levy Gasparian pedalando com uma cesta comprida acoplada à bicicleta, que ficava como um “T” sobre rodas. Minha mãe cortava os pãezinhos em pedaços pequenos e passava manteiga em cada um (ou margarina Alpina, nessa época ninguém sabia que tanta coisa fazia tão mal, depois não faz, depois faz de novo…)
Às vezes, eu e meu irmão já tínhamos enchido o saco para irmos ao galinheiro ver se tinha ovo (eu nunca entrava, morria de medo). Em caso positivo, era incluído no menu. Quando a netaiada toda estava, lembro-me de um pirex gigante com muitos pães na chapa, feitos no fogão, e a gente ia pegando as bandas de pão levemente chamuscado e se lambuzando de manteiga – ou, como disse, Alpina. Eu achava a coisa mais gostosa do mundo. Às vezes tinha “pão-chiclete”, como apelidamos o queijo quente por causa da elasticidade do recheio derretido. Também desde menina tomo café, vindo dos cinco ou seis pés que havia no sítio, cujos grãos eram colhidos, torrados e moídos lá. Minha dentição não esconde os anos de cafeína.
Até hoje, um dos meus programas favoritos é acordar cedo, me fartar em desjejum e voltar para cama, como se dissesse ao dia que ele pode esperar para acontecer. Quando eu ainda não era uma jovem senhora e virar madrugadas na rua soava como algo plausível, tomar café nas primeiras padarias juiz-foranas que subiam as portas era a certeza de uma boa noitada, ou o afogamento das mágoas de uma ruim em carboidratos.
Nas poucas vezes na vida em que dormi até o que se considera hora do almoço, sempre que pude, optei por um pãozinho, uma torradinha, um cafezinho, mesmo que almoçar ficasse para quando o sol já sumiu. Não importa o quanto minha vida esteja corrida: eu sempre vou preferir acordar meia hora mais cedo e ter a primeira refeição do dia na calma que ela merece.
Nesta semana, Matheus e eu víamos uma série e um personagem que eu detesto fez um monólogo excelente sobre o café da manhã (ganhou até minha simpatia, por ora). “É a refeição otimista do dia”. E talvez aí resida boa parte do meu apreço, para além da brilhante alquimia entre cafeína, farinha, leite e suas infindáveis combinações.
Tanto quanto o que como, amo os breves minutos otimistas do dia, antes do suspiro resignado e plausível de desesperança, sobretudo em tempos tão duros. Bate a realidade, lavamos goela abaixo com a golada final de café – sempre mais amarga que as primeiras – e seguimos em frente.