Quase 200 casos de Covid-19 são confirmados na Epcar
Noventa estudantes foram encaminhados para isolamento, na própria instituição, e os outros 105 já foram liberados para casa
O Centro de Comunicação Social da Aeronáutica confirmou, nesta segunda-feira (25), que 195 alunos da Escola Preparatória de Cadetes do Ar (Epcar), situada em Barbacena, a cerca de 100 quilômetros de Juiz de Fora, testaram positivo para a Covid-19. Deste total, 90 estudantes foram encaminhados para isolamento, na própria instituição, e os outros 105 se recuperaram da doença provocada pelo coronavírus e foram liberados para retornar para casa.
Conforme divulgou o órgão, em atualização dos registros dos exames divulgados neste fim de semana, verificou-se que 105 alunos tiveram a indicação de anticorpos da classe IgG em seus testes, o que significa que possuem o marcador imunológico para Covid-19, ou seja, decorreu algum tempo desde a contaminação.
O caso de estudantes infectados na Epcar veio à tona, na semana passada, e o Ministério Público, na sexta-feira (22), emitiu uma recomendação ao diretor de Ensino da Aeronáutica, major-brigadeiro do Ar, Marcos Vinícius Rezende Mrad, e ao comandante da Epcar, brigadeiro do Ar, Paulo Ricardo da Silva Mendes, para suspender imediatamente todas as aulas e demais atividades acadêmicas presenciais e não as retomem até que sobrevenha alteração substancial do cenário fático relacionado à epidemia da Covid-19, em sintonia com o que for adotado pelos sistemas de ensino federal, estadual e municipal.
O Ministério Público recomendou também que os dirigentes da Epcar autorizem todos os alunos que quiserem deixar as dependências dessa organização militar de ensino, abstendo-se de lhes aplicar qualquer espécie de sanção ou penalidade e de submetê-los a qualquer tipo de constrangimento em virtude dessa decisão. O corpo discente da Epcar é composto atualmente por mais de 500 estudantes, a grande maioria deles com menos de 18 anos de idade.
Nesta segunda, a Aeronáutica informou que as aulas e demais atividades presenciais já foram suspensas e que a recomendação foi cumprida antes mesmo do prazo estabelecido, que era de 72 horas, a contar da sexta (22).
Tratamento
Ainda segundo a Aeronáutica, os 90 alunos que testaram positivo – com doença ativa – foram direcionados ao isolamento social e receberam o tratamento preconizado pelas autoridades de saúde. Como aponta a instituição, 83 estudantes não apresentam qualquer sintoma da doença, sendo que um deles já se encontra curado. Já os sete casos restantes são sintomáticos e apresentaram todos sintomas leves, sendo que nenhum requereu hospitalização.
A Aeronáutica informou que a quantidade de alunos que apresentaram o resultado positivo para Covid-19 se deve ao programa de testagem em massa realizado pela Epcar, que incluiu todos os 507 alunos da instituição, os quais estavam na maioria assintomáticos. O objetivo foi garantir a liberação segura dos estudantes, de forma que eles e seus familiares possam tomar as medidas necessárias, conforme as orientações das autoridades de saúde.
Neste momento, apenas os estudantes passaram pela testagem em massa, os demais integrantes passarão por testes de acordo com o protocolo preconizado pelo Ministério da Saúde. Os exames realizados nos alunos foram testes rápidos fornecidos pela Diretoria de Saúde da Aeronáutica e utilizam o Método Imunocromatografia, protocolado na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). O teste é um imunoensaio cromatográfico rápido para a detecção qualitativa dos anticorpos IgG e IgM para Covid-19 em sangue total, soro ou plasma como auxílio ao diagnóstico de infecções primárias e secundárias pelo novo coronavírus.
O Centro de Comunicação Social da Aeronáutica ainda ressaltou que todos os integrantes da Epcar que tiveram contato com os alunos cumprem isolamento social domiciliar desde o último sábado (23). Informou também que, desde que o Ministério da Saúde reportou os primeiros casos do novo coronavírus no Brasil, a escola de Barbacena tem empenhado esforços para garantir a saúde e proteção dos seus alunos, readequando as atividades escolares e implementando procedimentos de prevenção alinhados aos protocolos do Ministério da Saúde e conforme as determinações do Ministério da Defesa.
Liberação para férias
Na sexta-feira (22), a Epcar iniciou a liberação dos estudantes para férias escolares de três semanas, uma turma por dia, depois que as mesmas realizaram a testagem para Covid-19, de forma a possibilitar a liberação segura. De acordo com a Aeronáutica, a Epcar realizou um esforço para que o conteúdo programático das atividades acadêmicas fosse antecipado, permitindo a realização do licenciamento dos alunos. Foram mantidas as recomendações para a manutenção da disciplina de prevenção sanitária e a sua difusão no âmbito dos grupos sociais. A instituição ressaltou que a adesão ao período de licenciamento é voluntária.
‘Zelo na preservação da saúde’
Como apontou as Forças Aéreas Brasileiras, nesse período de pandemia, algumas das adaptações adotadas na escola, foram a utilização de máscaras por professores e alunos, horários de refeitórios ampliados para evitar aglomeração e o incentivo à prática de atividade física individual. Além disso, como informou, o efetivo da Epcar passou a trabalhar presencialmente em forma de rodízio, sendo apenas um terço a cada expediente.
Ainda, os eventuais contatos de militares do efetivo com os alunos foram reduzidos ao mínimo necessário e, ainda assim, observando o distanciamento recomendado; pias de campanha, com sabonete, foram montadas no interior da Guarnição, bem como unidades de álcool em gel foram disponibilizadas, a fim de permitir a constante higienização das mãos; e dois médicos foram alocados no corpo de alunos, de modo a evitar a necessidade de deslocamento até o Esquadrão de Saúde para receber os atendimentos mais simples.
“Com efeito, o zelo na preservação da saúde de todo o efetivo da Epcar sempre foi uma preocupação deste comando, não apenas por exigências institucionais, mas, sobremaneira, pela legítima valorização da vida. Da mesma maneira, o Comando da Escola sempre esteve cônscio de sua responsabilidade perante à comunidade barbacenense, que tão bem acolhe a Epcar há 71 anos”, ressaltou o comandante da Epcar, Brigadeiro do Ar, Paulo Ricardo da Silva Mendes, por meio do Centro de Comunicação Social da Aeronáutica.
Denúncia de familiares e do Conselho Tutelar
Em 24 de março, o Ministério Público Federal (MPF) recebeu reclamação de alguns familiares de alunos da Epcar, os quais manifestaram preocupação com a situação de aquartelamento dos estudantes “em alojamentos com cerca de 170 pessoas, espaço mínimo entre as camas e banheiro comunitário”.
Conforme o MPF, os pais e responsáveis postulavam a liberação imediata dos estudantes, com a instituição do ensino a distância, pois vários deles já se encontravam gripados, com infecção de garganta e consequentemente com a imunidade baixa” e mantendo contatos com “funcionários e instrutores (que) entram e saem diariamente da escola”.
No dia 15 de abril, o Conselho Tutelar de Barbacena, revelando a mesma inquietação dos familiares, noticiou que a Epcar mantinha os alunos aquartelados, em espaços coletivos, sem a adoção de quaisquer dos critérios de distanciamento social estabelecidos pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e pelo Ministério da Saúde (MS).
Além disso, ainda segundo o Conselho Tutelar, a direção da Epcar teria, em plena pandemia, estimulado e realizado diversas atividades de práticas esportivas coletivas, gincanas e competições, inclusive com a participação de militares do efetivo que estão mantendo contato com pessoas e familiares fora do espaço da escola, expondo os alunos a situações de risco e contaminação.
Conforme o MPF, questionado, o comandante da Epcar respondeu que a instituição estaria cumprindo as determinações do Ministério da Defesa e do Comando da Aeronáutica e adotando todas as medidas de precaução recomendadas pelos órgãos de saúde.
Inspeção
O MPF, então, requisitou a realização de inspeção nas dependências da Epcar pela Secretaria Municipal de Saúde Pública e pelo Conselho Tutelar de Barbacena (MG). Realizada no dia 12 de maio, a inspeção acabou constatando a existência de diversas falhas, entre elas, a permanência e livre circulação de alunos, sem qualquer barreira sanitária quando da interação entre eles e os visitantes, familiares, autoridades e militares; ausência de protocolo sanitário para a desinfecção dos ambientes pelos prestadores dos serviços de limpeza; alunos sem máscaras de proteção, em grupo numeroso, deslocando-se para realização de atividades físicas; baixa ventilação nos alojamentos masculino e feminino e nas salas de aula; e, até, ausência de dispenser de sabão líquido, papel toalha e álcool 70 nos alojamentos feminino e masculino e nas salas de aula.
Síndrome gripal
Na ocasião, também foram identificados alguns alunos com sintomas de síndrome gripal, tendo o Conselho Tutelar informado que os profissionais da vigilância sanitária se comprometeram em enviar à escola testes para aplicação nesses alunos. Uma semana depois, em 19 de maio, como apontou o MPF, a Prefeitura de Barbacena confirmou a ocorrência de dois casos positivos para Covid-19 nas dependências da Epcar (uma professora e um aluno).
Dois dias depois, em 21 de maio, em contatos telefônicos com a Secretaria Municipal de Saúde e com o próprio comandante da Epcar, o MPF foi informado da existência de um total de sete alunos oficialmente diagnosticados com o novo coronavírus.
Violação de direitos
Lembrando que a OMS já havia alertado, desde 18 de março, que a Covid-19 “não é uma doença somente de idosos”, com recomendação às autoridades públicas para que empreguem medidas de prevenção e tratamento também para adultos saudáveis e crianças, o MPF afirmou que “a Direns (Diretoria de Ensino da Aeronáutica) e a Epcar não podem exigir dos alunos adolescentes que permaneçam enclausurados no interior das dependências da organização de ensino, sob regime de internato, sem propiciar-lhes condições dignas e seguras de efetivo isolamento e prevenção contra a contaminação pelo novo coronavírus (covid-19)”.
De acordo com a recomendação, não é juridicamente admissível que, no contexto atual de confirmação de casos da Covid-19 na Epcar, os órgãos militares mantenham as aulas presenciais e impeçam os jovens de deixarem aquelas dependências, para que possam receber a devida proteção, “sob o amparo e a assistência direta de seus próprios pais, responsáveis legais e familiares, sob pena de afronta à dignidade humana dos estudantes, com grave violação a direitos fundamentais e consequente responsabilidade do Estado e de seus agentes”.
Para o MPF, “a qualificação jurídica dos alunos da Epcar como militares na ativa, membros das Forças Armadas não lhes retira o status de adolescentes, quando menores de 18 anos, nem ofusca sua condição peculiar de pessoas em desenvolvimento, sujeitas a proteção integral e gozo de direitos fundamentais com absoluta prioridade.
O MPF também lembrou que portaria da própria Aeronáutica estabeleceu que a Diretoria de Ensino, como organização militar subordinada, dispensasse “especial atenção às escolas de formação quanto à preservação da integridade dos seus respectivos corpos discentes”, além de “monitorar constantemente as informações oficiais veiculadas pelas autoridades federais, estaduais e municipais sobre a situação”.
Dessa forma, o MPF considerou ser imprescindível que, além da substituição das aulas presenciais por ensino remoto, a Epcar também assegure prestação integral de ações e serviços de saúde, inclusive atendimento médico e psicológico, a todos os alunos da instituição que necessitarem e ou solicitarem, especialmente aqueles já confirmadamente infectados pelo novo coronavírus e aos que apresentaram sintomas de síndrome gripal e estão isolados com suspeita de contaminação. Nestes casos, as providências e os encaminhamentos deverão ser definidos e ajustados com os pais ou responsáveis legais dos adolescentes.
Prefeitura diz que orienta quanto a protocolos
Em nota oficial, a Prefeitura de Barbacena, esclareceu que, diante da repercussão em torno dos casos confirmados de Covid-19 no âmbito da Epcar, apesar de localizada no município, a instituição, embora monitorada e acompanhada pela Superintendência do Estado e pela Secretaria Municipal de Saúde há mais de 60 dias, responde diretamente ao Ministério da Defesa e ao Alto-Comando da Aeronáutica.
À Prefeitura, diz a nota, cabe orientação quanto aos protocolos de segurança recomendados, que já havia sido realizada pela Secretaria Municipal de Saúde, através da Vigilância Epidemiológica. A Prefeitura também reafirmou, por meio do comunicado, o compromisso em preservar a saúde dos barbacenenses.