Enraizados, sim; ancorados, não
“Há momentos em que realmente precisamos de uma âncora. Contudo a própria dinâmica da vida exige não estarmos ancorados, sob pena de perecermos”
Num singelíssimo livro, o simpático Mario Sérgio Cortella, em dado momento, utiliza-se de uma metáfora muito potente. Em nossa relação com o passado, explica, devemos estar enraizados. A raiz nutre de brotos sua árvore, é segurança em meio a tempestades e ajuda a florescer a novidade da vida. Honra o passado, mas cria brotos e flores para o presente e para o futuro. Diferentemente da âncora, segundo o autor. Uma vez lançada, simplesmente segura. Em nada nutre a embarcação. Apenas a protege de avançar. Oferece segurança, mas não permite os riscos tão necessários para o surgimento e o crescimento das novidades.
Há momentos em que realmente precisamos de uma âncora. Contudo a própria dinâmica da vida exige não estarmos ancorados, sob pena de perecermos. Raízes. Fortes, seguras, capazes de nos inspirar e alimentar, impulsionando-nos para os novos brotos que nascem. Carecemos muito mais de raízes e muito menos de âncoras.
Isso está para a vida pessoal como também está para as instituições. Penso aqui, muito especialmente, a educação. O que somos hoje, como nação, é fruto de um modelo de educação, sobre o qual estamos ancorados, não enraizados.
Há muitos excelentes e generosos profissionais, como há também boas escolas. Mas padecemos de uma miopia social, ora sustentada por nossas opções inconscientes, ora mantida pela onipotência do mercado. Os discursos são maravilhosos. Mas continuamos sem saber o que fazer, ao certo, com tanta beleza que temos em nossas mãos, nossas crianças e nossos jovens. Nem Paulo Freire, nem Anísio Teixeira, nem outros mais recentes romperam essa impermeável cultura escolar. Continuamos enfileirados, nuca por nuca, a olhar para um lugar que já nem chama mais tanto nossa atenção.
Sem perder raízes, honrando a tantos que sonharam uma educação plena, precisamos içar âncoras “para que a vida nos dê broto, flor e fruto”.
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