Camarão que dorme a onda leva
Álvaro Aleixo Martins Capute
colaborador
“Qual é o espanto quando testemunhamos o poderoso soerguimento da onda conservadora e de extrema direita que tomou conta da sociedade nos últimos anos?”
Os ditos populares sempre me encantaram pela incrível capacidade que possuem de, ao mesmo tempo, resumir e explicar a realidade com precisão milimétrica, de maneira fácil, com extremo bom humor e um belo toque de ironia.
A meu ver, a expressão “camarão que dorme a onda leva” descreve exatamente o contexto político e social que a maior parte do mundo está vivendo, inclusive o Brasil. Por quê?
Bom, o camarão é um animal conhecido por se locomover de trás para a frente, ou seja, do ponto de vista “camarocêntrico”, quando anda para trás, ele pensa que anda para a frente, ou vice-versa (???). Calma, eu sei que isso não está muito claro ainda, mas vou tentar ser mais objetivo ao longo do texto.
O que pretendo sugerir é que essa suposta confusão de direção e sentido que percebemos no comportamento do camarão é muito simbólica da atual confusão e falta de compasso que ocorre conosco, indivíduos histéricos pós-modernos que somos.
Outra curiosidade que o dito nos revela sobre nós mesmos é que, em meio a essa verdadeira “crise de sentido” que experimentamos no momento, ficamos profundamente desorientados, desolados e, consequentemente, expostos, frágeis e vulneráveis ao extremo, à mercê da primeira “onda salvadora” que surge às margens da mediocridade que se tornou a nossa vida.
A confusão é tão grande que caímos no sono catatônico da agonia e da apatia intelecto-moral, por isso, a onda surge avassaladora e nos surpreende dormindo em berço esplêndido. Somos, então, levados, sacudidos, revirados de ponta à cabeça, e, novamente, pasmem, o que a onda faz é somente aumentar a nossa desorientação e a agonia ao extremo, nos devolvendo para a margem em pior estado, porém ainda acreditamos dormir o sono dos justos. Por quê?
Ora, sejamos sinceros: se antes mesmo de a “onda” nos pegar desprevenidos na esquina da vida, nós, dignos representantes da espécie “homo squilla” (homem camarão), quando andávamos para trás, já pensávamos que andávamos para a frente, ou seja, já vivíamos constantemente aturdidos e perturbados – qual é o espanto quando este estado de coisas perdura no pós-onda-retro-pós-moderna?
Qual é o espanto quando testemunhamos o poderoso soerguimento da onda conservadora e de extrema direita que tomou conta da sociedade nos últimos anos? Qual é a diferença entre antes e depois dessa onda, se, na realidade, antecipadamente já estávamos caminhando sem sentido, “sem lenço nem documento”, regredindo rumo a velhos preconceitos, velhas discriminações, velhos autoritarismos, velhos privilégios, velha política, velha sociedade, velhacaria, velhaca ria…
Camarão que dorme a onda leva, portanto que tal acordar, corrigir os passos e enfrentar a onda, com uma boa dose de exame de consciência e autocrítica?