O centro em xeque
Manifestação de domingo foi clara ao indicar que o modo de fazer política do Centrão não tem o respaldo das ruas
Criado durante a constituinte que promulgou a Constituição de 1988, o Centrão – grupo de partidos de centro e de centro-direita – foi o alvo principal da manifestação de domingo, que levou milhares de pessoas às ruas de todos os estados do país e do Distrito Federal, cobrando a aprovação da reforma da Previdência e do pacote anticrime do ministro Sérgio Moro. Em pontos isolados, surgiram críticas ao Supremo Tribunal Federal e defesa do fechamento do Congresso, mas não foram o ponto central, principalmente quando se percebeu que seriam agendas que tirariam o foco do evento.
A manifestação ocorreu duas semanas depois de ato público que também levou milhares às ruas em protesto contra os cortes na educação e, como o primeiro, foi democrática, embora para alguns críticos tenha sido prematura, pois o presidente Jair Bolsonaro, a quem se queria respaldar, passou recentemente pelo crivo das ruas e obteve cerca de 58 milhões de votos. Teria sido um gesto temerário não fosse o resultado considerado além das expectativas.
A lição a ser tirada é a necessidade de aprovação de medidas importantes para a economia do país. A reforma não é uma pauta da direita, devendo ser considerada uma agenda coletiva, pois implica o futuro de uma geração, e, para ficar no caso presente, na salvação das previdências de estados e municípios, ora mais combalidas do que a da União. Vários governos estaduais já recorrem ao tesouro para pagar os seus inativos, ocorrendo o mesmo com prefeituras. Se nada for feito, todos perdem.
Mas a política é um jogo que não se ganha de uma só vez. A semana será emblemática para o próprio Governo, pois, especialmente no Congresso, será possível aferir a reação do Centrão. Deputados e senadores – a começar pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia – se sentiram constrangidos com o protesto, que, no entendimento das ruas, foi um alerta contra o velho modelo do toma lá, dá cá da política. As ruas querem transparência nas ações em vez dos velhos conchavos, especialmente em torno de cargos.
E esse é o principal desafio. A bancada de centro concentra a maior parte dos parlamentares e será decisiva na aprovação das reformas cobradas no domingo. Como reagirá não se sabe, mas é certo que o presidente apostou, embora não haja a certeza de sua jogada ser bancada pelos deputados e senadores. Os primeiros discursos são de levar a pauta das reformas adiante. Que assim seja.