Marcas da violĂȘncia
Pelo paĂs afora, milhares de pessoas protestaram pela morte da vereadora Marielle Franco, indicando que os tiros que lhe tiraram a vida foram endereçados Ă prĂłpria sociedade
O Rio de Janeiro foi palco de mais um ato de insanidade, fruto do sentimento de impunidade que ainda prevalece em alguns segmentos e da falta de controle do Estado, hoje incapaz de dar garantias de segurança aos cidadĂŁos. A morte da vereadora Marielle Franco (PSOL) foi a face exposta desse sentimento, que pode ter vĂĄrias interpretaçÔes: reação Ă intervenção federal no Estado ou execução por conta de seu trabalho na CĂąmara Municipal. Mulher, negra e da comunidade, era uma das mais ativas do Legislativo, sendo a voz que cobrava polĂticas sociais e respeito aos direitos da população mais carente, vira e mexe na linha de tiro dos frequentes enfrentamentos. Sua morte nĂŁo foi um gesto aleatĂłrio. A marca da violĂȘncia se explicitou da forma mais grave, por haver escolha prĂ©via. Ela era o alvo da ação dos criminosos.
Mataram a vereadora, mas nĂŁo mataram o seu legado. Ao contrĂĄrio, ele agora se reverbera pelo paĂs afora nas vozes daqueles que clamam por Justiça e punição aos autores do crime. VĂĄrias manifestaçÔes indicaram que o gesto nĂŁo pode ficar impune, pois foi um atentado Ă prĂłpria democracia. Em suas falas, atĂ© lĂderes opostos da polĂtica como o presidente Michel Temer e o ex-presidente Lula foram pelo mesmo caminho ao exigir respostas. A procuradora-geral da RepĂșblica, Raquel Dodge, pensou atĂ© em federalizar o crime, passando a investigação para a PolĂcia Federal. A polĂcia do Rio garantiu, porĂ©m, ser capaz de elucidar o caso.
Mas o tiro que matou Marielle aguçou o sentimento das ruas de que é preciso exigir ação do Estado não só com a descoberta dos autores, mas também por investimentos capazes de resgatar o direito de ir e vir da população, hoje cerceado em vårias frentes. A intervenção não irå obter sucesso se ficar restrita à repressão. A presença do Estado tem que ser permanente, sobretudo em åreas que carecem desse atendimento.
O Rio, porĂ©m, Ă© uma das faces desse cenĂĄrio que se espalha pelo paĂs afora. Os protestos que mobilizaram milhares de pessoas pelas cidades brasileiras sĂŁo a prova cabal da indignação coletiva que nĂŁo se prende apenas Ă capital fluminense, sendo um sentimento coletivo de reação Ă intolerĂąncia, ao preconceito e Ă dominação dos que se sentem acima da lei.