Gestos ingĂȘnuos
O furto de cabos Ă© resultante, na maioria das vezes, da ação de dependentes quĂmicos, mas quem compra sabe – ou deveria – avaliar as consequĂȘncias
A cidade avança no enfrentamento a um crime de baixo potencial de violĂȘncia, mas de consequĂȘncias crĂticas para a sociedade: o furto de cobre, que, na verdade, tornou-se um flagelo nacional. O noticiĂĄrio tem sido prĂłdigo em apontar os dramas das metrĂłpoles, boa parte dele envolvendo trens e metrĂŽs parados e sinalização de trĂąnsito comprometido. Tudo por conta do furto de cabos. Num mundo controlado pelos comandos digitais, quando se corta a conexĂŁo, o caos Ă© completo. E nĂŁo hĂĄ backup. No ciclo analĂłgico, a falta de energia nĂŁo interrompia, por exemplo, o trabalho dos escritĂłrios e das redaçÔes – para ficar nesses dois exemplos -, pois as mĂĄquinas de escrever nĂŁo careciam de energia elĂ©trica. Hoje, nĂŁo. Os computadores, a despeito de todo o avanço, funcionam sozinhos, mas na conversa com outros equipamentos dependem de redes, formadas, em sua maioria, por fios de cobre.
A Lei Municipal 14.391, de autoria do vereador Julinho Rossignoli (PP), sancionada pela prefeita Margarida SalomĂŁo, determina que as empresas que atuam como recicladoras e que compram ou recebem material em cobre sejam obrigadas a manter registros que comprovem a origem de fios, peças e placas em cobre que adquirirem. A exigĂȘncia tambĂ©m vale para os estabelecimentos que exercem atividade de recuperação de materiais de cobre; que operam como comĂ©rcio de ferro-velho ou sucatas; e que comercializam baterias e transformadores usados. Pela norma, eles terĂŁo que, no ato da compra, cadastrar os fornecedores, mediante apresentação de um documento oficial de identidade e informação de seu respectivo endereço.
A norma nĂŁo coloca sob suspeita os estabelecimentos, mas segue uma lĂłgica que lhes imputa responsabilidade. Boa parte dos autores desse tipo de crime Ă© formada por usuĂĄrios de drogas – especialmente crack -, que se motivam para tais ilĂcitos em decorrĂȘncia de encontrarem quem compre. Quebrar essa cadeia Ă© a forma mais eficiente, pois a simples prisĂŁo de tais meliantes nĂŁo resolve o problema. SĂŁo pessoas, sobretudo por força das drogas, desprovidas do senso que avalia as consequĂȘncias de seus atos. SĂł que, ao romper uma rede, mudam a rotina das cidades, com forte repercussĂŁo, inclusive, nas relaçÔes de trabalho, pois os usuĂĄrios do sistema de transporte, ante tais transtornos, atrasam o ponto e nem sempre contam com a compreensĂŁo dos patrĂ”es. Recentemente, virou meme nas redes sociais uma jovem que, ao avisar a patroa do atraso, ouviu como resposta que se virasse. De pronto rebateu: sĂł se for de aviĂŁo. As duas se reconciliaram, mas o fato Ă© um real retrato do dia a dia.
O furto de cobre pode levar a resultados mais graves, daĂ a importĂąncia de ter uma resposta do Estado com puniçÔes, sobretudo, aos que levam vantagem. Quem compra um produto ilegal nĂŁo comete um gesto resultante do vĂcio ou da ingenuidade. Ao contrĂĄrio, sabe o que estĂĄ fazendo, daĂ merecer o braço da lei, como, aliĂĄs, ocorreu no inĂcio desta semana, quando uma ação conjunta das polĂcias Militar e Civil, do Corpo de Bombeiros Militar, da Guarda Municipal, da Fiscalização de Posturas, do Demlurb, da Cemig, da MRS LogĂstica e da telefĂŽnica Oi culminou com autuaçÔes, advertĂȘncias e recolhimento de vasto material suspeito. NĂŁo hĂĄ outro caminho atĂ© que a conscientização coletiva seja uma realidade.