Eleitores se revoltam com limitação de senhas na Câmara Municipal
Cidadãos que estavam na fila e não receberam senhas ocuparam hall para questionar atendimentos
Cerca de 200 pessoas ocuparam, nesta sexta-feira (6), por volta das 16h, o hall da Câmara Municipal de Juiz de Fora, após limitação de senhas distribuídas pelo Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais (TRE/MG) para recadastramento biométrico. Em meio a ânimos exaltados e empurra-empurra, os eleitores contestaram o diretor do Foro Eleitoral de Juiz de Fora, juiz José Clemente Piedade de Almeida, da 153ª Vara Eleitoral, mas foram contidos por policiais militares e guardas municipais. Após 30 minutos de tensão e interrupção do atendimento, os eleitores foram levados para as escadarias da Câmara por guardas municipais e policiais militares. Por determinação de José Clemente, nova fila com eleitores que não conseguiram senhas foi formada em frente ao edifício. Contudo, o procedimento seria realizado caso houvesse tempo após o atendimento aos eleitores que receberam as senhas. Além dos agendamentos, foram distribuídas 1.550 senhas, sendo 550 de atendimento prioritário. De acordo com o TRE/MG, foram atendidos 3.844 eleitores nesta sexta.
Às 17h, quando a Tribuna esteve no local, a aglomeração estendia-se das escadarias até ao cruzamento das ruas Santo Antônio e Fernando Lobo.Desde às 6h30 nas filas, os eleitores dizem que, apenas pouco antes das 16h, foram comunicados de que não seriam atendidos nesta sexta, uma vez que apenas mil senhas teriam sido distribuídas. A princípio, de acordo com Samanta Gomes Braga Cardoso, lhes disseram que todos seriam atendidos até meia-noite. No entanto, antes das 16h, os eleitores sem senha ouviram que não seriam atendidos. “As senhas acabaram na esquina da Rua Halfeld com a Rua Santo Antônio. Eles simplesmente olharam para a nossa cara e falaram: ‘não vamos atender mais.’ Simplesmente isso. Quem está aqui desde às 6h não tem importância. Eu não tenho problema em esperar. O meu problema foi ninguém ter nos avisado. Nós são somos cachorros”, relatou Samanta. Segundo eleitores que testemunharam a discussão, as filas começaram a ser distribuídas somente às 14h.
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Jacqueline Silva, por sua vez, questionou o impasse. “Estou com a minha filha de 3 anos de idade, desde às 6h”, reclama ela, que alega não ter sido avisada sobre a distribuição das senhas. “Esperaram a gente entrar na Câmara para nos avisar. Como não podemos voltar a partir de segunda, decidimos esperar o atendimento ainda nesta sexta.” Bem como Jacqueline, Shirlei também estava acompanhada de filho pequeno. “Cheguei às 6h30 com minha filha de 2 anos e 5 meses. Perguntei se teria prioridade para quem estava com criança. A prioridade é para quem tem criança com idade até um ano ou amamentando. Achei um absurdo. A minha filha estava comigo na fila com sono, com fome, com sede e debaixo de um sol. Não deram satisfação para a gente. É um descaso sem tamanho.” Além das 200 pessoas que ocuparam o hall da Câmara Municipal, outras também estavam pendentes de senhas.
Conforme Samanta, apesar de terem deixado para comparecer aos postos de atendimento no dia derradeiro para o fim da revisão biométrica, o tratamento dispensado pelo TRE/MG é de descaso. “Que avisassem de manhã: ‘não vai tenha senha. Podem ir embora.’ E quem não tem dinheiro para comprar nada? Estou vendendo bombom para comprar alguma coisa para comer. Como eu faço? (…) Podemos estar erradas, mas ele (juiz) não tem o direito de fazer o que fez”, contesta. “Mandaram formar uma outra fila para quem não tem senha. Estamos aqui novamente. Se ficarmos aqui até meia-noite e não formos atendidas, o que vamos fazer? Vão cancelar CPF, vão cancelar tudo.”
Aldemir Vidal de Oliveira estava já dentro do Palácio Barbosa Lima quando a discussão ocorrera. Apesar de gritos e vaias, diz não ter havido agressões. “Os eleitores ficaram muito tempo na fila e começaram a ficar revoltados quando as senhas foram distribuídas somente a partir das 14h. Os eleitores queriam senhas de qualquer jeito. O pessoal deveria distribuir por volta das 8h, porque ninguém ficaria na fila à toa. Eu cheguei às 4h para conseguir ser atendido agora às 17h.”
‘Do jeito que estava, ninguém poderia ser atendido’
O juiz da 153ª Vara Eleitoral de Juiz de Fora, José Clemente Piedade de Almeida, alega que o recadastramento biométrico é realizado desde 5 de fevereiro de 2019 e, logo, os eleitores tiveram tempo para realizá-lo. “Não tenho condições de dizer o que motivou a exaltação. Posso dizer, como juiz responsável, que a Justiça organizou a biometria para recadastramento dos eleitores. Começou em fevereiro do ano passado com datas e horários para agendamento. Estava inicialmente previsto até 21 de fevereiro de 2020. Um ano, um mês e 15 dias. Fiz campanhas diuturnamente em meios de comunicação. Houve cartazes em todos os ônibus da cidade. A minha média diária era de até 55% de horários agendados vazios. O brasileiro, infelizmente, deixa tudo para última hora. Quem fez e porque fez o tumulto que encontrei quando cheguei, não tenho como dizer.”
José Clemente assegura que os atendimentos serão realizados apenas até meia-noite. “Pode ser que não dê hoje. Estamos tentando o melhor. Do jeito que estava quando cheguei, ninguém poderia ser atendido. Agora, estão sendo atendidos. Não interrompemos o atendimento, mas não chamamos mais pessoas porque estava tumultuado. E brasileiro gosta de tumulto, gosta de deixar para o último dia. Não tenho culpa de nada que aconteceu.
Fila dando volta no quarteirão
Acreditando ser o último dia para regularizar a situação eleitoral antes das eleições de outubro e temerosos, sobretudo, pelo cancelamento do CPF, homens e mulheres se amotinaram nos pontos de recadastramento biométrico desde a manhã. Na Central de Atendimento ao Eleitor, a fila chegou a dar volta no quarteirão, passando pelas ruas Santo Antônio e Rei Alberto, antes de dar a volta na Avenida Rio Branco e retornar à Avenida Itamar Franco. Os atendimentos também foram feitos no Shopping Jardim Norte.
Entre as pessoas da fila, havia relatos de quem passou toda a madrugada no local para ser um dos primeiros atendidos logo no início do funcionamento do posto, às 8h. A dona de casa Débora Martins de Almeida chegou por volta das 5h e ainda tinha alguns metros por percorrer até conseguir adentrar à Central de Atendimento, por volta das 10h, e ser atendida em um dos guichês. “Eu fui enrolando (para fazer o cadastramento) por conta do trabalho, não tinha ninguém para deixar meu filho pequeno, e acabou ficando para a última hora”, admite Débora. “Eles praticamente estão obrigando a gente a vir”, afirma a eleitora.
Ao longo da fila, havia pessoas que se prepararam de maneira diferente: levaram pequenas cadeiras para não ter que ficar em pé durante todo tempo. Alguns ainda alternavam momentos em pé e sentado, trocando o lugar na cadeira com outras pessoas. É o caso do estudante Ruanito Marques. “Eu trouxe a cadeira por ter pensado na hora. Mas esqueci de trazer água”, lamenta ele, que também fez diversos adiamentos nos planos até culminar na obrigatoriedade de fazer o procedimento no último dia do prazo insistentemente divulgado pelo TRE.
Gestante entra em trabalho de parto
Uma mulher de 40 anos entrou em trabalho de parto enquanto aguardava para ser atendida na Câmara. Conforme relatos de presentes, durante atendimento prioritário, ela teria começado a ter contrações, dilatações e a chorar. Os primeiros socorros foram feitos ainda dentro do Palácio Barbosa Lima, por populares e funcionários do Tribunal Regional Eleitoral. Ela foi encaminhada ao Hospital São Vicente de Paulo, antigo HTO, antes que ganhasse bebê e está sob cuidados médicos.