Giselle Muniz: 23 anos dedicados à natação de Juiz de Fora
Professora tem papel fundamental no projeto do paradesporto da SEL e é arbitra do Comitê Paralímpico Brasileiro
A natação sempre esteve presente na vida de Gisele Muniz Leucardi, de 45 anos, moradora do Bairro Aeroporto, na Cidade Alta. Formada em Educação Física pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), ela é uma das principais referências do esporte adaptado no município e coordena, há 13 anos, o projeto de natação da Secretaria de Esporte e Lazer (SEL) da Prefeitura de Juiz de Fora (PJF), voltado para pessoas com deficiência.
Por isso, Giselle é a terceira personagem do quadro “Fala, Mestre”. Nele, a reportagem conta histórias de professores dos mais diversos esportes na cidade. A intenção é valorizar a trajetória, relembrar personalidades marcantes e reforçar o poder da atividade física na transformação social, no lazer e na saúde. A primeira matéria foi com Gerson Willian, treinador Sport Club, e a segunda, com Altina Carla, professora de muay-thai.

“Posso dizer que a natação sempre esteve na minha vida”, inicia Gisele. Desde a infância, o esporte fez parte de sua rotina. Nascida em Brasília (DF), ela viveu parte da adolescência em Guarapari (ES), onde conciliava os estudos pela manhã e atividades esportivas à tarde. “Era surf, vôlei de praia, queimada, ciclismo”, relembra.
Na época do vestibular, a escolha pela Educação Física foi natural. Com familiares em Juiz de Fora, Gisele prestou o exame, foi aprovada na UFJF e acabou fixando raízes na cidade. Ainda durante a graduação, iniciou os estágios e passou a atuar diretamente com esportes aquáticos. “Desde a faculdade eu já estava ligada à hidroginástica e à natação. Sempre foi o meu caminho”, conta.
Após se formar, trabalhou em academias e, anos depois, foi aprovada em concurso público da Prefeitura de Juiz de Fora. Convidada a integrar a Secretaria de Esporte e Lazer, passou a atuar em políticas públicas voltadas ao esporte, saúde e qualidade de vida. “Tenho uma paixão muito grande por esse trabalho. Ao todo, já são 23 anos de atuação”, diz, com um sorriso no rosto.
Projeto gratuito e acessível
O projeto de natação para pessoas com deficiência, que ao longo do tempo já teve nomes como JF Paralímpico e Superação Aquática, funciona atualmente na UFJF. O atendimento é gratuito e por livre demanda. “A pessoa interessada nos procura, a gente faz uma avaliação e encaminha para a turma mais adequada”, explica Gisele.
Hoje, o projeto atende 26 alunos, distribuídos em três turmas: iniciação, intermediário e aperfeiçoamento. “Tem aluno que quer competir e tem aquele que busca só saúde e qualidade de vida. A gente atende todos”. Para Gisele, trabalhar com pessoas com deficiência exige preparo constante. “Cada aluno tem uma deficiência diferente. Não é qualquer profissional que pode atuar. É preciso estudar, entender as individualidades e respeitar cada história”, ressalta.

Inovação com pilates e reconhecimento nacional
Ao assumir a coordenação do projeto, Gisele conseguiu unir duas paixões: a natação e o pilates. A prática passou a ser incorporada antes da parte aquática, como forma de fortalecimento e preparação funcional. “A ideia era pensar nas atividades da vida diária e também no desenvolvimento dentro da água”.
O trabalho foi tão bem-sucedido que resultou na apresentação de um estudo em um congresso internacional do desporto, em Belo Horizonte. “Na época, quase não se falava em pilates para pessoas com deficiência. Poder apresentar esse trabalho foi uma grande alegria”, vibra.
Competição, alto rendimento e formação técnica
Com a evolução dos alunos, o grupo passou a participar da Copa Juiz de Fora de Natação e, nos últimos três anos, também do Meeting do Comitê Paralímpico Brasileiro, considerado porta de entrada para o alto rendimento.
Além do trabalho como técnica, Gisele também atua como árbitra em competições de alto nível. “Atuo no Comitê Paralímpico Brasileiro, e esse trabalho acontece de forma concomitante com o meu trabalho como técnica de natação”, explica. Segundo ela, as convocações são frequentes e proporcionam contato direto com o alto rendimento do paradesporto nacional.
“Tenho sido convocada para várias competições importantes no país. É muito legal estar ali junto do alto rendimento, vendo os nossos atletas que foram para Paris e que vão para outras competições internacionais”.
Assim, Gisele já esteve presente em eventos de grande porte do calendário esportivo. “Tive o privilégio de participar de competições como o Open Internacional, Campeonato Brasileiro, Jogos Universitários, Jogos Escolares e os meetings que acontecem em todo o território brasileiro”, enumera.

Referência
A presença de atletas de referência, como Gabriel Araújo, o Gabrielzinho, multicampeão paralímpico e radicado de Juiz de Fora, é um fator motivacional importante. “Ele é um exemplo claro de que a pessoa com deficiência pode chegar ao mais alto nível”, afirma Gisele.
Segundo ela, os impactos vão muito além das medalhas. “Quando eles começam a competir e ganhar medalha, passam a ser os heróis dentro da própria família. Isso fortalece a autoestima e a reinserção social”, destaca.
Para Gisele, os resultados mais importantes aparecem no cotidiano. “Tenho uma aluna com paralisia cerebral que passou a pentear o cabelo sozinha, tirar o tênis sozinha, virar na cama sem ajuda. Pode parecer simples, mas é uma vitória enorme”, relata. Ela também vê a importância de olhar para as famílias. “Muitas vezes o responsável abdica de muita coisa por amor. O esporte ajuda não só o aluno, mas toda essa rede”, completa.
Missão cumprida
Ao final de mais de duas décadas dedicadas ao serviço público e ao esporte, Gisele define o sentimento como dever cumprido. “Cumprir meu papel como professora e como cidadã, reinserindo essas pessoas na sociedade, fazendo o bem e vendo resultados”, resume.
Mais do que pódios, ela destaca o impacto humano do projeto. “O maior resultado é a transformação, a autonomia e esse sentimento de segunda família que se cria aqui. É uma verdadeira corrente do bem”, finaliza.









