Dólar já é comercializado a R$ 5 em Juiz de Fora
Alta na moeda impacta turismo, além de produtos consumidos por brasileiros, como combustível e derivados do trigo
Em meio a disputa pelo mercado do petróleo e à epidemia do coronavírus, o valor do dólar disparou, atingindo seu maior patamar nominal (sem considerar a inflação) da história, e já está impactando o bolso do juiz-forano. Levantamento realizado pela Tribuna na manhã desta terça-feira (10) aponta que a moeda está sendo comercializada na cidade por até R$ 5 nas casas de câmbio. Enquanto a reportagem realizava a pesquisa, o dólar estava cotado a R$ 4,67, mas no fechamento do mercado, nesta terça, a moeda ficou cotada em R$ 4,6472. Além de afetar o turismo, a alta do dólar influencia toda uma cadeia de produção, impactando produtos diretos ao consumidor, como combustíveis e derivados do trigo.
A sondagem feita pela Tribuna considerou os valores do dólar comercializado em quatro casas de câmbio do município, acrescido do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). Nos locais pesquisados, a moeda variava entre R$ 4,77 a R$ 5, custando em média R$ 4,87. A oscilação do dólar impacta direta e imediatamente o setor do turismo, inclusive, no valor de outras moedas estrangeiras. Para quem já planejou uma viagem para o exterior, a orientação é pesquisar as melhores taxas de mercado, de acordo com o agente de turismo Jorge Carneiro. “A pessoa que já está com a viagem marcada, não vai deixar de viajar por causa da moeda. Ela vai ver uma maneira de economizar na viagem. Mas com relação à aquisição (do dólar), é preciso procurar fornecedores e casas de câmbio seguras, para não ter problemas com notas falsas e buscar as melhores taxas, porque aumenta de maneira geral, não tem muito o que ser feito.”
Os valores de pacotes de viagens sofrem alterações imediatas, considerando que são calculados de acordo com o câmbio do dia. Em Juiz de Fora, a procura por viagens internacionais vem sofrendo queda devido à escalada do dólar e também, recentemente, pelo avanço do coronavírus, o que, por outro lado, leva a uma demanda para destinos nacionais. “Há uma preocupação geral com relação a isso”, diz o agente de turismo. “As pessoas acabam vendo alguma opção de pacote nacional para não deixar de viajar.”
Disputa pelo petróleo e coronavírus
A escalada do dólar acontece em um cenário em que há uma disputa pelo controle do mercado do petróleo e pela epidemia do coronavírus. No caso do petróleo, a concorrência ocorre entre Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep), onde a Arábia Saudita é o maior produtor, e a Rússia, segundo o cientista político Paulo Roberto Figueira Leal, em entrevista para a rádio CBN. “A Arábia Saudita queria convencer a Rússia a também adotar uma política de preços similar àquela que a Opep está adotando, de controle da produção com vista a manter os preços mais ou menos estáveis.
A Rússia parece que está atuando à revelia de qualquer possibilidade de acordo”, explica. Em retaliação à resistência da Rússia, a Arábia Saudita reduziu o valor do barril de petróleo. “Há aí uma disputa geopolítica entre grandes produtores de petróleo que acabou gerando um efeito cascata bastante significativo nos mercados internacionais.”
Conforme Leal, o petróleo é um produto que impacta diversas outras cadeias de produção, sendo que várias crises mundiais passadas vieram em função do commodity. “Junta isso com a crise do coronavírus, temos aí uma tempestade bastante significativa para ajudar a entender porque as bolsas caíram.” No caso da bolsa brasileira, destaca Leal, ainda tem uma terceira variável, que é a instabilidade política interna.
Combustível e energia elétrica
Entre os produtos afetados pela alta do dólar estão os combustíveis. Isto porque, mesmo com a queda de preço do petróleo ocasionada pela disputa entre a Arábia Saudita e a Rússia, a cotação do produto é em dólar, como explica a professora da Faculdade de Economia da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Fernanda Finotti.
“O valor em dólar está alto, mas o valor da mercadoria está baixo: 20 dólares o barril (de petróleo), sendo que já esteve em 100 dólares. Infelizmente, quando cai, nós não vemos na bomba tão rápido quanto quando aumenta. Existe uma especulação, um conluio dos distribuidores nesse sentido, mas o dólar impacta o combustível e impacta todos os bens que têm os preços cotados internacionalmente”, aponta. “É como uma gangorra: o preço da mercadoria está baixo, mas a cotação dela está alta, porque apesar de sermos produtores, o preço que a Petrobras pratica é internacional.”
Com o impacto nos preços dos combustíveis, a própria energia elétrica deve ser afetada. “Nós tínhamos uma matriz energética toda baseada em água. A partir de 2000, com aquela seca que gerou o racionamento, houve um investimento nas termelétricas, movidas por combustível. Então, quando o petróleo sobe, ele afeta tudo, inclusive a energia”, explica a especialista.
Impacto na padaria
Produtos importados ou produzidos a partir de insumos importados também sofrem alterações com a alta do dólar, como o pão, que é feito a partir do trigo, e tem cotação realizada no mercado internacional. “Não é um produto importado, é feito na padaria do bairro, mas o insumo é cotado em dólar”, diz Fernanda.
De acordo com o presidente do Sindicato e Associação Mineira da Indústria de Panificação de Minas Gerais, Vinícius Dantas, em entrevista à rádio CBN, o cenário preocupa o segmento, considerando que há questões que já vem sendo trabalhadas a um tempo, como a taxação sobre o trigo feita pela Argentina, responsável pela exportação de 60% do produto panificável para o Brasil.
“Tivemos um problema muito sério climático no Sul do país, onde tivemos uma baixa produção. Com a abertura da venda de trigo da Argentina e com essa taxação para o mundo todo, nós perdemos o nosso principal fornecedor”, aponta. “Estamos muito preocupados com o que vamos fazer para que a sociedade não pague por esse momento. A partir do momento que não for sustentável, infelizmente, as padarias terão que fazer o seu reajuste.”
Câmbio tem dia de ajustes e recua
O mercado de câmbio teve um dia de ajustes e realização de ganhos após a disparada do dólar, que subiu em 13 das últimas 15 sessões. A moeda norte-americana fechou em queda de 1,63%, aos R$ 4,6472. O real acompanhou o comportamento de outras moedas de emergentes, que ganharam valor perante a divisa dos Estados Unidos. No exterior, os investidores se animaram com a perspectiva de adoção de estímulos fiscais pela Casa Branca em conjunto com o Congresso, além da sinalização de Pequim de que o pior do surto de coronavírus no país já passou.
O novo leilão de US$ 2 bilhões de dólares no mercado à vista pelo Banco Central também contribuiu para a queda do dólar. Somente na segunda e nesta terça, o BC colocou US$ 5,5 bilhões em dinheiro novo no mercado de câmbio. Mas a visão é que a calmaria desta terça-feira não deve perdurar, na medida em que persistem as incertezas sobre os efeitos do coronavírus e da guerra nos preços do petróleo. O Bank of America Merrill Lynch cortou novamente a previsão de crescimento da economia mundial este ano, para 2,2%, e alertou nesta terça que os riscos continuam sendo de piora.
O fator essencial para esse movimento continuar vai depender das respostas dos governos, especialmente de Trump e do que decidir o Banco Central Europeu (BCE) esta semana em sua reunião de política monetária. Nesta terça, o dólar subiu forte ante divisas fortes, mas caiu perante emergentes, um indício de que investidores estão buscando ativos de maior risco.
Aqui, o Ibovespa subiu 7,1%, na maior alta em mais de uma década. No ano, o Ibovespa cede 20,26%, no mês, 11,48%, e na semana, 5,90%. Aos 92.214,47 pontos no fechamento desta terça, o Ibovespa retomou nível observado em maio do ano passado – em 20 de maio de 2019, o índice fechou aos 91.946,19 e, no dia seguinte, aos 94.484,63 pontos.