JĂșlio Zanini conta tudo
Houve uma Ă©poca em que, de cada dez mulheres da alta-roda juiz-forana, pelo menos nove sonhavam em matricular o filho ou filha no curso “NoçÔes de passarela”, que comemora 35 anos em janeiro, sob o comando de JĂșlio Zanini. Todas queriam ver seus pupilos fazendo sucesso no mundo da moda. Isso ainda acontece hoje, JĂșlio?. “Acontece, mas nĂŁo iludo ninguĂ©m. Se quiser ser modelo e manequim tem que ir para o Rio”, avisa ele, espalhando sobre a mesa os vĂĄrios ĂĄlbuns de fotografia que guarda. Nas pĂĄginas, entre os anĂŽnimos, figuram rostos conhecidos, como os dos atores NĂvea Stelmann e Carlos Machado. “Pelas minhas mĂŁos jĂĄ passaram cinco mil moças, cinco mil crianças e milhares de rapazes”, contabiliza JĂșlio, obrigado a mudar o rumo de seu negĂłcio devido Ă s imposiçÔes dos novos tempos.
“O glamour acabou, virou comĂ©rcio. O pessoal nĂŁo quer investir mais em comercial de televisĂŁo e desfile, porque ficou tudo muito caro. Fazem uma vitrine muito bonita para vender roupa e pronto. Com isso, mudei todo meu esquema. Tenho uma equipe com dez professores para dar orientaçÔes de etiqueta e boas maneiras, corrigir postura, despertar vaidade e trabalhar a descontração. Aceito pessoas de 5 a 70 anos. As mĂŁes me procuram porque sabem que faço um trabalho sĂ©rio.”
Tradicionalmente, a maratona de aula, realizada no prĂ©dio Escola de Dança Misailidis, Ă© concluĂda com um desfile de encerramento. E faria algo diferente para evitar a difĂcil mudança pela qual passou? “Deveria ter aproveitado mais, pois tinha a faca e o queijo nas mĂŁos. Era sĂł eu em Juiz de Fora, sĂł depois apareceu o Senac. Muitas meninas que hoje tĂȘm cursos por aqui sĂŁo crias minhas.”
“Durmo no formol”
“Um amigo meu do Rio adaptava as fantasias do Rio ao enredo de Juiz de Fora. Trazia duas ou trĂȘs por vez. Era uma estrutura enorme, eu alugava van, contratava ajudantes e ia direto para a passarela. Ganhei muito dinheiro com o carnaval. Fazia promoção, cobrava cachĂȘ. Toda a sociedade me esperava na avenida”, afirma o foliĂŁo, que jĂĄ saiu em quase todas as agremiaçÔes de Juiz de Fora.
Para quem um dia teve uma juventude tĂŁo badalada, a calmaria de agora surpreende. Na residĂȘncia da Rua Santa Rita, onde tambĂ©m Ă© o escritĂłrio em que atende os clientes com hora marcada, vive JĂșlio e Deus, conforme ele mesmo conta. Os pais jĂĄ sĂŁo falecidos, e as irmĂŁs, casadas, moram fora de Juiz de Fora. “Faço de tudo para nĂŁo sair, nĂŁo aceito convites. Passo e-mail, mando presentes e flores”, diz, abusando da franqueza. “Cansei dessas coisas. O pessoal estĂĄ enjoado de ver a cara da gente, e eu enjoei de ver a cara de todo mundo. As pessoas sĂŁo as mesmas. Quando vou Ă s festas, sinto falta daquelas senhoras alinhadas que nĂŁo existem mais. Umas jĂĄ faleceram, outras nĂŁo saem mais de casa. NĂŁo existe mais gente elegante e bonita.”
Enquanto curte a aposentadoria fazendo o que gosta, JĂșlio faz piada com a possibilidade de contar em livro sua trajetĂłria iniciada, sem planejamento, quando tinha 18 anos, e as curiosidades da sociedade de Juiz de Fora. A publicação jĂĄ tem atĂ© tĂtulo: “JĂșlio Zanini conta tudo”. “Acho que nĂŁo daria muito certo. Tem muito babado. Vou ser preso igual ao TĂ©o (Paulo Betti), da novela ‘ImpĂ©rio”, brinca.