Empresário é condenado a mais de 34 anos de prisão por feminicídio da psicóloga Marina Gonçalves Cunha

Julgamento, que começou na terça, foi finalizado nesta quarta, com condenação do então marido da vítima


Por Bernardo Marchiori e Sandra Zanella

25/06/2025 às 15h02- Atualizada 25/06/2025 às 17h30

Empresário é condenado a mais de 34 anos de prisão por feminicídio da psicóloga Marina Gonçalves Cunha
Foto: Leonardo Costa

O empresário Pedro Araujo Cunha Parreiras, acusado de assassinar a então companheira, a psicóloga Marina Gonçalves Cunha, de 35 anos, foi condenado a 34 anos e 7 meses na forma da pronúncia: homicídio qualificado por motivo fútil, meio cruel, feminicídio e recurso que dificultou a defesa da vítima, além da ocultação do cadáver. A decisão foi proferida pela juíza que presidiu a sessão de julgamento na tarde desta quarta-feira (25). Além da reclusão, Pedro também foi condenado à pena de seis meses de detenção e 35 dias-multa, no valor unitário de 1/30 do salário mínimo vigente na época dos fatos. O crime foi cometido em maio de 2018.

Pedro foi condenado por feminicídio ainda com.base na Lei 13.104, de 2015, já que o crime foi praticado em 2018. Caso ele fosse julgado de acordo com a nova norma (Lei 14.994, de 2024), a pena aplicada poderia ser ainda maior, já que a mesma tornou o feminicídio um crime autônomo – e não mais um qualificador de homicídio – passando a pena mínima de 12 para 20 anos de reclusão, e a máxima de 30 para 40 anos. A nova lei do “Pacote Antifeminicídio” estabeleceu ainda outras medidas para prevenir e coibir a violência contra a mulher.

Matéria publicada pela Tribuna no início deste mês mostrou que os processos de feminicídio aguardam, em média, 300 dias até o primeiro julgamento em Minas Gerais, de acordo com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ). No caso de Marina, a família esperou mais de sete anos.

“Lavei minha alma”

Presente na sessão, Marlene, mãe de Marina, não escondeu a emoção e o alívio com a decisão do julgamento. “Hoje eu mensurei a gravidade desse crime. Foi muito impactante. Nesse momento, estou vendo minha filha com aquele sorriso. Lavei minha alma no sentido de ter honrado ela. Ela era uma pessoa amada por todos.”

Após o resultado do julgamento, a mãe de Marina também falou sobre os netos, filhos da vítima com Pedro. “Sinto um alívio, principalmente pelos meus netos. Pelo que o mais velho me diz”, o que presenciou o crime, “parecia acreditar que a mãe teria levado o pai ao extremo para fazer o que fez. Quero tirar isso da cabeça dele. Se Pedro foi condenado da forma como foi, é porque cometeu o crime de forma covarde. Estou muito emocionada com a conclusão.”

 

Posicionamento das partes

Após a conclusão do julgamento, iniciado na última terça-feira, o promotor Vinicius Chaves destacou, em entrevista à imprensa, que a acusação estava ciente da gravidade do caso. “A honra da Marina precisava ser lavada. Precisávamos resgatar a Marina enquanto mulher, mãe e pessoa trabalhadora, assim como a autoestima da família. E o principal: não deixar que ela fosse diminuída. A justiça foi feita, com uma sentença bem calibrada para fazer valer o efeito de prevenção geral e especial da pena. Sensação de dever cumprido”, ressalta.

Por meio de nota, o advogado da acusação, Pablo Gomes, destacou que a família de Marina “agradece ao Tribunal do Júri da Comarca de Juiz de Fora pelo compromisso com a verdade e com a justiça. Após sete anos de espera, a tese da acusação prevaleceu de forma plena”.

“O réu Pedro Araujo Cunha Parreiras foi condenado à pena de 34 anos e 7 meses de reclusão pelos crimes praticados contra Marina. Foram reconhecidas todas as qualificadoras sustentadas pela acusação: motivo fútil, meio cruel, feminicídio e recurso que dificultou a defesa da vítima, além da causa de aumento de pena por ter cometido o crime na presença do filho mais velho do casal. Também foi condenado pelos crimes de ocultação de cadáver e fraude processual, com agravante pela tentativa de apagar vestígios e manipular a cena do crime”, continua.

Também foi destacado que não foi acolhida qualquer tese da defesa. “O Tribunal do Júri rejeitou a alegação de legítima defesa, bem como as tentativas de caracterizar o crime como homicídio privilegiado ou culposo. Ficou comprovado que Marina foi morta com brutalidade, por asfixia, em um ato de controle, frieza e desumanidade.”

Finalizando a nota, a acusação enfatiza que “a família acredita que, com esta condenação, Marina finalmente pode descansar em paz”. “E que seus três filhos, hoje sob os cuidados dos avós maternos, possam crescer com a certeza de que a justiça existe – mesmo que tardiamente”, conclui.

Já o advogado de defesa de Pedro, José Arthur Kalil, afirma que discorda do resultado do julgamento e que irá apresentar recurso. “Devemos respeitar a decisão do conselho de sentença, mas não concordamos com ela. Precisamos analisar a sentença para avaliar a linha de argumentação do recurso.”

Condenado utilizou argumentação de legítima defesa

Em seu interrogatório, Pedro iniciou suas falas confessando o assassinato. Entretanto, afirmou, perante ao júri popular, que “considera um acidente”. “Nunca quis tirar a vida da Marina”, disse. Na versão do acusado, a vítima teria questionado uma suposta traição por parte dele que, segundo Pedro, era falsa. A juíza também citou questões financeiras, relatadas por algumas das testemunhas, mas o réu não deu mais detalhes.

Ainda na defesa do acusado, na ocasião do ocorrido a esposa teria se dirigido a ele com uma faca na mão para atacá-lo. Para se defender, Pedro afirma ter tentado tirar o objeto da mão dela e imobilizá-la, com a mão na região abaixo do pescoço. Eles, segundo o acusado, saíram da cama, bateram na quina da parede e caíram. Ao acender a luz, o réu teria notado que a esposa já estava sem vida no chão.

A partir desse momento, Pedro conta que decidiu retirar o corpo. Ele confirmou a história de que o colocou, enrolado em um edredom, em um carrinho de supermercado para levar até o carro. O acusado conta que pensou em sair da cidade, mas “pensou nos filhos” e deixou o corpo em Juiz de Fora.

Ainda no seu interrogatório, o empresário apontou supostas contradições em relação a informações constatadas no processo. Dentre elas, cita que os filhos não presenciaram o fato, apesar de o laudo constatar o contrário em relação ao mais velho, de 6 anos na época. Além disso, ele alegou não ter utilizado produto para desfigurar o rosto de Marina.

Seguindo na dinâmica do fato, ele afirma que não desferiu socos no rosto da vítima, mas que ela teve um corte com sangramento. Também questionou o laudo de asfixia. A todos que perguntaram sobre o paradeiro dela enquanto estava desaparecida, ele confirmou que mentia que a esposa tinha viajado para realizar um curso.

Acusado colocou corpo de Marina em carrinho de compras

A denúncia do Ministério Público indica que, em 21 de maio de 2018, por volta das 20h, Pedro teria asfixiado Marina no apartamento do casal, na Rua Monsenhor Pedro Arbex, causando sua morte. Em seguida, alterou as condições do local do crime, limpando o quarto e lavando as roupas utilizadas pela vítima. Laudos periciais com base no uso de luminol constaram vestígios de sangue no piso, entre a cama do casal e o armário, na parede lateral esquerda, próximo à entrada do quarto, na parede próxima ao banheiro, sobre o colchão e na calça jeans clara pertencente à vítima.

“E ainda, no dia 22/05/18, por volta das 00h42min, escondeu o corpo da vítima em um carrinho de compras para tirá-lo do local, deslocou-se até a Rua Eugênio do Nascimento, próximo ao n° 2.560, Bairro Aeroporto, e, com a intenção de ocultar o cadáver, adentrou em uma mata fechada, e o abandonou”, destaca o MP sobre a ação na garagem do prédio flagrada pelas câmeras, quando o corpo foi retirado do carrinho e colocado no porta-malas de um carro, antes de ser desovado na mata do Parque da Lajinha.

Também foi constatado que o acusado e a vítima discutiram sobre problemas financeiros e sobre o relacionamento do casal, “ocasião em que Pedro a imobilizou, a agrediu com diversos socos no rosto e a asfixiou, levando-a a óbito.” Posteriormente, de acordo com o MP, ele alterou o local do crime, retirando a aliança, os brincos e as roupas da vítima. Em seguida, Pedro foi até um supermercado 24 horas para fazer compras. Ao retornar, pouco depois da meia-noite, usou um carrinho do condomínio para subir com as mercadorias.

Depois de seguir até a Cidade Alta, o acusado teria arrastado o corpo mata adentro por cerca de 11 metros e, para evitar que o corpo fosse reconhecido, jogou um produto na região da cabeça da vítima, que estava nua e teve o rosto desfigurado. Segundo o MP, o crime foi praticado contra mulher por razões da condição de sexo feminino, no âmbito da violência doméstica e familiar.

“O denunciado matou sua esposa e mãe de seus três filhos por motivo fútil, derivado de discussão anterior, e com emprego de asfixia, em razão da vítima ter sido esganada até a morte, tendo sua defesa dificultada, ao ser surpreendida com tamanha brutalidade dentro de seu próprio lar, por aquele com quem mantinha relação conjugal e, assim, supostamente deveria confiar, e na presença do filho mais velho do casal, que se encontrava acordado.”

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