Decreto que proĆbe guloseimas em porta de escola entra em vigor
LegislaĆ§Ć£o passa a valer em todo o estado, PJF nĆ£o prevĆŖ aƧƵes especĆficas em cumprimento Ć s novas regras
Entrou em vigor, a partir desta segunda-feira (24), um decreto que proĆbe a comercializaĆ§Ć£o de guloseimas dentro e no entorno das escolas pĆŗblicas e privadas em Minas Gerais, alĆ©m de impedir a publicidade destes itens. Conforme o Decreto 47.557, sancionado pelo entĆ£o governador Fernando Pimentel (PT), em dezembro do ano passado, o objetivo da medida Ć© regulamentar uma lei de 2004, que prevĆŖ a promoĆ§Ć£o da educaĆ§Ć£o alimentar no ambiente escolar e criar aƧƵes em busca de melhor qualidade de vida.
Entretanto, em Juiz de Fora, os Ć³rgĆ£os fiscalizadores ouvidos pela reportagem afirmaram que nĆ£o irĆ£o adotar aƧƵes especĆficas para impedir o comĆ©rcio, que prevĆŖ a proibiĆ§Ć£o de produtos diversos, como aqueles com alto teor calĆ³rico, gordura saturada, gordura trans, aƧĆŗcar livre e sal ou com poucos nutrientes (ver quadro). Em busca de discutir o decreto, a Tribuna ouviu, nas Ćŗltimas semanas, representantes da comunidade escolar e do municĆpio para entender como a questĆ£o tem funcionado na cidade.
Em relaĆ§Ć£o Ć promoĆ§Ć£o da alimentaĆ§Ć£o saudĆ”vel, de acordo com a Secretaria de EducaĆ§Ć£o da Prefeitura, o decreto nĆ£o mudarĆ” as aƧƵes em andamento porque Juiz de Fora segue diretrizes da lei municipal 12.121/2010, que jĆ” impede a venda de produtos calĆ³ricos e gordurosos dentro das escolas da cidade, mas nĆ£o do lado de fora. TambĆ©m citou que atende ao que Ć© estabelecido pelo Programa Nacional de AlimentaĆ§Ć£o Escolar (PNAE) do Fundo Nacional de Desenvolvimento da EducaĆ§Ć£o (FNDE), que fornece alimentaĆ§Ć£o escolar e aƧƵes de educaĆ§Ć£o alimentar e nutricional a estudantes. A Tribuna questionou quais sĆ£o os pontos especĆficos do programa nacional jĆ” adotados pela Prefeitura, mas nĆ£o obteve retorno sobre a questĆ£o.
Falhas na educaĆ§Ć£o alimentar
Sobre a atuaĆ§Ć£o do MunicĆpio, gestores locais apontam falhas em relaĆ§Ć£o Ć educaĆ§Ć£o alimentar dentro das unidades de ensino. Na Escola Municipal Cosette de Alencar, na regiĆ£o central de Juiz de Fora, a vice-diretora Juliana de Oliveira GuimarĆ£es afirma que a intervenĆ§Ć£o da Prefeitura Ć© em relaĆ§Ć£o ao controle dos alimentos utilizados na preparaĆ§Ć£o das merendas dos estudantes. Segundo ela, contudo, a fiscalizaĆ§Ć£o e a orientaĆ§Ć£o por parte da AdministraĆ§Ć£o sĆ£o feitas de maneira esporĆ”dica. “A Prefeitura nos envia um cardĆ”pio elaborado por nutricionistas, com refeiƧƵes balanceadas, alĆ©m de orientaƧƵes e dicas sobre como montar uma refeiĆ§Ć£o, manipular e conservar os alimentos. Mas polĆticas de promoĆ§Ć£o Ć alimentaĆ§Ć£o saudĆ”vel para estimular os alunos nĆ£o existem”, disse Juliana. A vice-diretora ainda critica a qualidade dos alimentos disponibilizados. “A qualidade nĆ£o Ć© boa. Somente neste ano pedimos para que recolhessem, por duas vezes, os feijƵes que vieram carunchados”.
Sobre os alimentos industrializados e guloseimas, Juliana afirmou que eles geralmente vĆŖm de casa ou sĆ£o comprados na rua, pelos estudantes, antes de entrarem na escola, atravĆ©s do comĆ©rcio ambulante. Ela conta que a escola tenta educar os alunos com informaƧƵes sobre a importĆ¢ncia da alimentaĆ§Ć£o saudĆ”vel, mas falta, tambĆ©m, conscientizaĆ§Ć£o das famĆlias. “Nas reuniƵes de pais, nĆ³s abordamos o tema, mas isso exige tempo dos responsĆ”veis para se dedicarem ao preparo de lanches e alimentos saudĆ”veis”, opinou.
Outras instituiƧƵes procuradas pela reportagem tambĆ©m afirmaram que a atuaĆ§Ć£o do Poder PĆŗblico, neste tema, ainda Ć© superficial em relaĆ§Ć£o ao que estĆ” previsto no decreto que passarĆ” a entrar em vigor. AlĆ©m da escola Cosette de Alencar, a Tribuna conversou com a direĆ§Ć£o das escolas municipais AntĆ“nio Faustino, no Bairro TrĆŖs Moinhos, regiĆ£o Leste; e Murilo Mendes, no Bairro GrajaĆŗ, Zona Sudeste. Representantes de ambas afirmaram que nĆ£o hĆ” fiscalizaĆ§Ć£o eficaz por parte da gestĆ£o municipal e que as visitas da VigilĆ¢ncia SanitĆ”ria sĆ£o esporĆ”dicas. Disseram, ainda, que embora a merenda escolar seja gratuitamente disponibilizada, muitos estudantes levam de casa o prĆ³prio lanche, que nem sempre Ć© saudĆ”vel.
Sobre estes pontos, por meio de nota, a Secretaria de EducaĆ§Ć£o informou que “todos os procedimentos referentes ao planejamento e abastecimento da alimentaĆ§Ć£o escolar sĆ£o acompanhados pela SupervisĆ£o de NutriĆ§Ć£o e AlimentaĆ§Ć£o Escolar (SNAE)”. De acordo com a pasta, anualmente, a equipe de supervisĆ£o realiza capacitaĆ§Ć£o dos profissionais que atuam nas cozinhas das escolas e creches do municĆpio. Informou ainda que, no segundo semestre deste ano, a PJF encaminharĆ” a cada unidade escolar municipal uma cĆ³pia do “Guia alimentar para a populaĆ§Ć£o brasileira”, do MinistĆ©rio da SaĆŗde, que, conforme a pasta, Ć© uma das iniciativas relacionadas ao PNAE para a melhoria da educaĆ§Ć£o alimentar e nutricional. AlĆ©m disso, a rede municipal participa do Programa SaĆŗde na Escola do Governo Federal que realiza aƧƵes de educaĆ§Ć£o alimentar e nutricional.
MudanƧa de hƔbito
A diretora da Escola Murilo Mendes, Adriana Perini Carvalho, observou conduta diferente no ambiente escolar. De acordo com ela, desde a metade do ano passado, os alunos tĆŖm diminuĆdo a frequĆŖncia e a quantidade de guloseimas que levam para a hora da merenda. “Como Ć© proibido esta venda dentro da escola, muitos alunos trazem de casa ou compram no entorno. Mas isso tem mudado, e Ć© por conta da reduĆ§Ć£o do poder aquisitivo das famĆlias.”
Em relaĆ§Ć£o ao trabalho que Ć© desenvolvido dentro da escola para a conscientizaĆ§Ć£o dos alunos, Adriana disse que esta Ć© uma tarefa que fica a cargo dos professores e de incentivos da prĆ³pria escola. Segundo ela, os alimentos utilizados na merenda e a maneira de montar e preparar o cardĆ”pio sĆ£o orientados pela Prefeitura que, no entanto, nĆ£o desenvolve outros projetos de educaĆ§Ć£o alimentar para os estudantes. A diretora tambĆ©m critica a qualidade, a quantidade e a diversidade dos alimentos. Na opiniĆ£o dela, estes sĆ£o quesitos que deveriam ser melhorados.
FiscalizaĆ§Ć£o das novas regras estĆ” indefinida
Nas escolas estaduais, a Secretaria de Estado de EducaĆ§Ć£o de Minas Gerais (SEE) informou que o decreto comeƧa a valer dentro do prazo estipulado, mas ressaltou que a fiscalizaĆ§Ć£o deverĆ” ser feita pela vigilĆ¢ncia sanitĆ”ria de cada municĆpio. Sobre as polĆticas de saĆŗde e alimentaĆ§Ć£o escolar, o supervisor administrativo do Departamento de VigilĆ¢ncia SanitĆ”ria da Secretaria de SaĆŗde, Ivander Mattos, garantiu que o setor atua na fiscalizaĆ§Ć£o da comida disponibilizada aos estudantes na merenda e nas cantinas. Contudo, o supervisor admite que a legislaĆ§Ć£o ainda nĆ£o estĆ” plenamente implementada.
“Todo estabelecimento de ensino precisa estar regularmente licenciado pela VigilĆ¢ncia. Mas no histĆ³rico de Juiz de Fora nĆ£o havia o licenciamento destes estabelecimentos. EntĆ£o, no decorrer dos Ćŗltimos anos, isso vem sendo feito gradativamente, em conjunto com a Secretaria de EducaĆ§Ć£o e com o Conselho de EducaĆ§Ć£o. NĆ£o posso afirmar que todos estĆ£o licenciados, mas gradativamente isso vem acontecendo para haver acompanhamento das instituiƧƵes”, relatou.
O Programa Estadual de ProteĆ§Ć£o e Defesa do Consumidor (Procon-MG), a SEE e o Sindicato das Escolas Particulares de Minas Gerais (Sinep-MG) enviaram um comunicado Ć s escolas privadas para informar que alguns alimentos nĆ£o poderĆ£o mais ser comercializados no ambiente escolar. A Tribuna procurou o sindicato na tarde desta segunda-feira (24), mas nĆ£o conseguiu contato.
ComĆ©rcio ambulante nĆ£o deverĆ” ser afetado
Outro veto do novo decreto estadual Ć© a comercializaĆ§Ć£o, por parte de ambulantes na porta das escolas, dos alimentos considerados proibidos. Outro ponto que, aparentemente, nĆ£o vai sofrer alteraĆ§Ć£o oficial no municĆpio. Conforme Ivander, a vigilĆ¢ncia desta categoria parte da fiscalizaĆ§Ć£o de postura em relaĆ§Ć£o ao uso do espaƧo pĆŗblico. Ele explica que, quando se vai licenciar um estabelecimento, antes de regularizar o alvarĆ” sanitĆ”rio, Ć© preciso o licenciamento do espaƧo pĆŗblico de acordo com as normas e a postura pĆŗblica.
“No caso da fiscalizaĆ§Ć£o dos ambulantes, o que acontece Ć© uma conjunĆ§Ć£o da fiscalizaĆ§Ć£o da postura e da vigilĆ¢ncia sanitĆ”ria. Mas Ć© lĆ³gico que o comĆ©rcio na porta das escolas vai ser olhado. Tem a aĆ§Ć£o de fiscalizaĆ§Ć£o, propriamente dita, que Ć© uma polĆtica de saĆŗde alimentar e faz parte da rotina da vigilĆ¢ncia nas escolas”, disse. Contudo, a verificaĆ§Ć£o do estabelecimento por parte da VigilĆ¢ncia SanitĆ”ria atualmente acontece apenas no perĆodo da renovaĆ§Ć£o do alvarĆ” sanitĆ”rio, feita anualmente.
De acordo com o decreto, quem desrespeitar a lei poderĆ” ser punido. No entanto, a gestĆ£o municipal nĆ£o sinaliza medidas neste sentido. Questionada, a Secretaria de Meio Ambiente e Ordenamento Urbano (Semaur) informou que “nĆ£o houve alteraĆ§Ć£o com relaĆ§Ć£o Ć responsabilidade da Semaur nesta situaĆ§Ć£o. Nossa aĆ§Ć£o serĆ” com relaĆ§Ć£o ao uso do espaƧo pĆŗblico, caso haja alguma irregularidade em relaĆ§Ć£o Ć ocupaĆ§Ć£o do espaƧo pĆŗblico para atividade comercial.”