Trabalhadores paralisam ônibus urbanos no Centro de Juiz de Fora
Categoria cobra acerto de adiantamento salarial e falta de EPIs contra coronavírus; PJF diz que movimento é ilegal
Trabalhadores em transporte rodoviário de Juiz de Fora estão com as atividades paralisadas, nesta sexta-feira (20), desde às 13h30, para reivindicar o pagamento integral do adiantamento salarial, correspondente a 40% dos vencimentos da categoria. Conforme acordo coletivo de trabalho, os rodoviários devem receber, mensalmente, no dia 20, o adiantamento de 40%, e, no quinto dia útil, o restante dos salários. Entretanto, nesta sexta, apenas 20% foi quitado pelas empresas concessionárias do transporte coletivo urbano. Desde quarta, quaisquer manifestações estão proibidas no município, conforme o Decreto 13.894/2020, editado pelo prefeito Antônio Almas (PSDB), para evitar a disseminação do coronavírus (Covid-19). Apesar de Almas ter repudiado a manifestação dos rodoviários em comunicado no início da noite, os rodoviários manterão o movimento até que o adiantamento seja integralmente quitado pelas empresas.
Como forma de protesto, a categoria paralisou os coletivos nas duas pistas da Avenida Getúlio Vargas – exclusivas ao tráfego dos ônibus -, desde a Avenida Barão do Rio Branco até à Rua São João, e no corredor central da própria Rio Branco, desde a Avenida Presidente Itamar Franco até a altura da Superintendência Regional de Saúde. Já insatisfeita com a ausência de fornecimento de equipamentos de proteção individual (EPIs) contra a Covid-19, como máscaras, luvas e álcool em gel, o descumprimento quanto ao adiantamento salarial foi a gota d’água para a classe paralisar as atividades. Em meio ao estado de emergência de saúde público do Município, o Executivo considera o ato ilegal, já que vai de encontro à recomendação de evitar aglomerações. Conforme a Prefeitura, todas as sanções cabíveis ao Sindicato dos Trabalhadores em Transporte Rodoviário de Juiz de Fora (Sinttro) serão aplicadas. Uma reunião entre o presidente do Sinttro, Vagner Evangelista, o secretário de Transporte e Trânsito, Eduardo Facio, e os empresários terminou sem acordo na tarde desta sexta.
Desde quinta (19), os ônibus do transporte coletivo urbano estão circulando sob redução de 20% de frota e horários, depois de determinação da Secretaria de Transporte e Trânsito (Settra) após queda da demanda de usuários. Em nota à Tribuna, a Astransp, responsável pelas empresas do Consórcio Manchester – Tusmil e GIL – e pela Viação São Francisco Ltda., justificou o pagamento de apenas 20% do adiantamento à redução da receita em decorrência da queda na procura pelo transporte público. “Por isto, as empregadoras não tiveram outra solução senão pagar o adiantamento em um percentual menor do que o habitual. (…) No caso das empregadoras, houve queda na demanda de 50%, e a operação só foi reduzida em 20%. Todos devem dar sua conta de sacrifício. A pandemia representa situação excepcional e motivo de força maior, interferindo, inclusive, na relação de trabalho.” Em relação aos EPIs, a Astransp afirma que vem “se empenhando para adquirir os insumos, mas o mercado não tem disponível, quando se encontra em quantidade insuficiente. (…) O material em estoque, pela rotina característica desta mão de obra, tem sido priorizado para as equipes de higienização”.
A Tribuna ainda aguarda retorno da Ansal.
Almas repudia paralisação
Depois de a Prefeitura considerar ilegal a paralisação dos rodoviários, o prefeito Antônio Almas (PSDB) publicou, em suas redes sociais, no início da noite desta sexta, vídeo repudiando o movimento da categoria. De acordo com Almas, em meio à pandemia do Covid-19 e do aumento de casos confirmados e suspeitos em Juiz de Fora, não é momento para manifestações. “Não é momento para que haja paralisação do serviço público, negando às pessoas o direito de ir e vir. É importante que vocês trabalhadores do transporte público coletivo de Juiz de Fora assumam o seu papel de solidariedade e retornem ao trabalho. Estaremos prontos para resolver todos e quaisquer problemas, mas não nesta relação que impõe à sociedade mais sacrifícios do que ela está tendo”, manifestou-se.
‘A gente não tem nada a ver com isso’
O rodoviário Élton Flávio Marques questiona o desconto percentual, uma vez que os trabalhadores cumpriram normalmente a jornada de trabalho integral nos últimos 30 dias – entre sete horas e 20 minutos e oito horas. “A nossa reivindicação é o reembolso da metade que nos tiraram. Nós trabalhamos. Ninguém aqui faltou. Todos trabalharam os 30 dias. Se eles não resolverem isso ainda hoje (sexta), está fora de cogitação voltarmos a circular. A aglomeração é a única forma que nós temos de chamar a atenção, de nos expressar. As empresas não soltaram nenhuma nota para a categoria, nenhum aviso. Não fomos comunicados. Simplesmente descontaram do nosso salário. Trabalhamos dignamente. Muitos de nós levantam pela madrugada. Muitos têm hora para sair de casa e nem sempre para chegar, e os empresários dos consórcios ainda fazem essa maldade com a categoria.”
Mauro Melo de Souza também contesta a ausência de justificativa das empresas aos trabalhadores. “O correto é depositar o vale (adiantamento) todo. Sem dar satisfação alguma, depositaram só 20% do pagamento. O vale é 40% do pagamento. Apenas jogaram 20% na nossa conta. A gente tem contas para pagar. O valor das contas não abaixa. Como que vamos pagar as contas com apenas 20%? Não tem como. Quando as empresas depositarem o restante, voltamos a trabalhar.” De acordo com Mauro, motoristas recebem, normalmente, R$ 800, e, trocadores, R$ 400. A respeito dos EPIs, o rodoviário reitera que a empresa não os disponibiliza aos funcionários. “Não tem nada. Nada. Se a gente quiser, tem que comprar e trazer, porque eles não dão nada não.”
William Praxedes Luiz, por sua vez, diz que recebeu apenas R$ 200 referente à sua função como trocador. “A principal reivindicação é o pagamento, mas também (estamos paralisando) devido à carga horária. (…) A nossa carga horária não diminuiu, os ônibus estão andando superlotados, estamos correndo riscos e as coisas só estão piorando. Resolvemos parar mais por conta do salário. Eu recebi R$ 200 somente. Tenho contas para pagar, não justifica. Deveria ter recebido o dobro disso.” Eliseu de Souza Carraci não aceita os argumentos de redução da demanda de usuários pelo transporte público. “Só que a gente não tem nada a ver com isso. Trabalhamos o mês todo completo. (…) A maioria tem aluguel e outras contas para pagar e esse valor que eles depositaram não está nas contas dos companheiros.”
Cláusula antiga
Conforme o vice-presidente do Sinpro, Claudinei Janeiro da Silva, os sindicalistas foram surpreendidos na manhã desta sexta com o aviso de adiantamento de apenas 20% dos vencimentos dos rodoviários. O pagamento caiu na conta dos trabalhadores por volta de meio-dia. De acordo com Claudinei, a cláusula do acordo coletivo de trabalho que garante o adiantamento de 40% dos salários nos dias 20 de cada mês já é antiga. “A cláusula vem há bastante tempo. Posso te falar que pode ser mais do que 18 anos, porque é o tempo que estou no transporte. Sempre existiu. Então, sempre contamos com esse dinheiro no dia 20. Então os trabalhadores têm que fazer pagamentos, como aluguel, pensão etc., mas, chega no dia 20, contando com a quantia para o seu próprio sustento, o dinheiro não cai. O trabalhador está muito decepcionado e, com isso, resolveu tomar a atitude para sensibilizar os patrões e mostrar que dependemos do trabalho para o nosso sustento. Não estamos trabalhando por esporte.”