Ao anunciar o fim da atuação de braço da principal facção criminosa paulista em Juiz de Fora, na última sexta-feira (8), o comandante da 4ª Região da Polícia Militar, coronel Marco Aurélio Zancanela, destacou que as ações repressivas resultaram em uma freada dos homicídios, que haviam disparado em decorrência dos constantes confrontos com o grupo rival, ligado a facção do Rio de Janeiro. Apesar da redução no segundo semestre, foram contabilizados pela PM 66 assassinatos em 2023 (até dia 8 de dezembro), um a mais do que os 65 registrados no mesmo período do ano passado. Em 2021, quando ainda havia a influência da pandemia nas estatísticas, houve 43 crimes fatais contra a vida.
“Pelo cenário que havia em Juiz de Fora, quando começou essa ‘guerra’, em agosto de 2022, a tendência era extrapolar, e muito, (o número de mortes violentas em 2023). Conseguimos sair de um primeiro semestre com média de 7,8 homicídios por mês, para 4,3 por mês no segundo semestre. E grande parte desses crimes mudou, não foi mais associado ao tráfico de drogas, mas a outros fatores, como brigas de vizinhos e motivos passionais, mais difíceis de controlar. Então verificamos que as estratégias adotadas deram muito certo. Devemos fechar o ano com redução”, avalia o comandante.
Ele pondera que os conflitos a tiros entre traficantes não lesam apenas criminosos, pois colocam todos os moradores em risco. “Houve encomendas de homicídios em que erraram o alvo, pegaram inocentes. E teve fatos como aquele no Bela Aurora, onde houve um confronto, e uma bala perdida acabou atingindo uma criança. Isso expõe toda a população. Fora que, mesmo que não tenha atingido alguém, só de ter visto um tiroteio, imagina a sensação de insegurança e o medo de essa pessoa sair. Então essa situação de confronto era o nosso alvo principal. E vamos continuar combatendo o tráfico de drogas, porque sabemos os danos e prejuízos que causam também para famílias.”
O comandante critica a falta de vagas no sistema prisional, exemplificando que a PM realizou 7.193 prisões este ano, enquanto a capacidade da cidade é de cerca de 1.500 vagas. “Muitas das vezes é por isso que a atividade criminosa continua, mas vamos mitigar os impactos, independente de justiça criminal.” O número de detenções foi 37% maior do que as 5.241 realizadas em 2022. Só aquelas relacionadas ao tráfico somam 962, bem acima das 608 do ano anterior (58%). A captura de foragidos da Justiça também saltou de 496 para 720 (45% a mais), enquanto a apreensão de armas de fogo subiu de 254 para 276 (8%), entre o ano passado e este.
Reforço de viaturas
O coronel Zancanela informa que estão sendo enviadas à cidade mais viaturas para o reforço do combate ao crime organizado, fortalecendo as ocupações, que devem continuar nos bairros Santo Antônio e Vila Ideal, na Zona Sudeste; Bela Aurora e Sagrado Coração de Jesus, na região Sul; Jóquei Clube, Vilas Esperança I e II na Zona Norte; e Santa Rita, na Zona Leste.
“É uma estratégia que se mostrou muito efetiva, e estamos estudando outros bairros para ampliar essas ocupações “, comenta, acrescentando que na principal avenida da Vila Ideal, na rota de uma das saídas da cidade, existiam dois pontos de tráfico que foram extintos mediante a ação policial. “Vamos continuar as ocupações. Nosso foco é o combate às organizações criminosas, independente de qual.”
Fim de braço de facção paulista em JF
A informação sobre o fim do braço da facção paulista em Juiz de Fora foi divulgada quase um ano e meio depois de integrantes do grupo terem chegado à cidade e desencadeado uma série de homicídios ligados à disputa pelo tráfico de drogas com a facção do Rio de Janeiro, já presente no município. Mortes suspeitas ocorridas nesse período no sistema prisional também chegaram a ser ventiladas como resultado desse embate. De acordo com o coronel Zancanela, o combate intenso ao crime organizado, realizado em conjunto com as demais forças de segurança, Ministério Público e Poder Judiciário, também levaram a um enfraquecimento local de pessoas ligadas à quadrilha fluminense, com a prisão de supostos líderes e o óbito de suspeitos que enfrentaram a polícia em ações repressivas. “No dia 25 de novembro, a facção (de SP) efetivamente saiu da cidade. Não divulgamos à época porque queríamos ter certeza. Vamos continuar investindo em inteligência e em tecnologia e em ocupação dos bairros de Juiz de Fora para combater as organizações criminosas que, porventura, queiram voltar e também aquelas que aqui continuam vendendo drogas.”
Conforme o comandante da 4ª Região da PM, a facção paulista teve prejuízo diante das ações repressivas e teria deixado de mandar armamentos e drogas para os comparsas locais. “Não se combate o crime organizado sem um serviço de informação forte e sem uso de tecnologia. Nesse monitoramento, percebemos a saída deles, com vários indícios.” Sobre o enfraquecimento da facção do Rio na cidade, ele citou a prisão de suposto matador do grupo na cidade no dia 18 de novembro. “Ele reagiu e foi morto em confronto com a Polícia Militar“, destaca. “No dia seguinte, integrantes da facção, com veículo clonado, foram fazer uma execução no Linhares. Acabaram cercados pela polícia, abandonaram o veículo. Um entrou em confronto, foi a óbito, e três foram legalmente presos.” Por fim, o coronel enfatiza a captura de suposto líder da facção do Rio na cidade, no último dia 5, em operação de órgãos de segurança em Matias Barbosa. Ele também seria chefe do grupo em Minas Gerais, após a prisão do líder anterior.
Ainda segundo o comandante, desde 2020 a facção paulista começou a enviar integrantes para Juiz de Fora para tentar ocupar locais de tráfico. “Em 2022 eclodiu o primeiro confronto, onde saíram do Bairro Santo Antônio e foram para a Vila Ideal, tentando contra a vida de três adolescentes que estavam vendendo drogas. Dois foram a óbito”, recorda ele, sobre a investida criminosa, ocorrida em 31 de agosto do ano passado, que tirou as vidas de dois adolescentes, de 14 e 16 anos. Eles sofreram, pelo menos, 17 e nove perfurações à bala, respectivamente. Outro alvo, 17, fugiu por um escadão com um tiro na região do abdômen e três na perna, mas sobreviveu. A partir daquele dia, conforme o oficial, teve início o enfrentamento constante entre traficantes já atuantes na cidade – os quais compravam entorpecentes da facção do Rio, “até pela proximidade geográfica” – e os rivais recém-chegados.
“Quando assumimos (o comando da 4ª Região da PM), em março, fizemos um bom diagnóstico e traçamos estratégias. Dentro delas estava reforçar a inteligência, estreitar laços de integração com os demais órgãos do sistema de defesa social e também fazer a ocupação dos bairros onde estavam havendo esses conflitos para que o usuário não comprasse. Ou seja, para diminuir o poder do dinheiro que eles tinham e, ao mesmo tempo, evitar o confronto.”