Vidas com HIV: Acesso à prevenção e ao tratamento mudam a história
Juiz de Fora registra queda do número de casos de HIV e Aids, mas prevenção ainda é desafio, sobretudo, para os mais jovens
Nos últimos cinco anos, Juiz de Fora registrou 781 notificações de HIV (Vírus da Imunodeficiência Humana) e 517 de Aids (Síndrome da Imunodeficiência Adquirida), segundo dados da Secretaria de Estado de Saúde (SES-MG). No município, o maior número de infecções foi registrado entre 2021 e 2024. Após este período, houve uma queda, explicada pelas 68 notificações do vírus e 73 da síndrome neste ano, número similar ao de 2020.
Conforme dados enviados pela Prefeitura de Juiz de Fora (PJF), de janeiro a setembro deste ano, o Departamento de Doenças Sexualmente Transmissíveis, Aids e Hepatites Virais (DDST), da Secretaria de Saúde (SS), realizou 7.205 testes de HIV. Quanto às Infecções Sexualmente Transmissíveis (ISTs), foram realizados 5.779 testes rápidos de sífilis; 7.117 testes de Hepatite B; e 6.200 testes de Hepatite C.
Com o propósito de conscientizar a população brasileira, o Ministério da Saúde criou o Dia Mundial de Luta contra o Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV), estabelecido no 1º de dezembro, e o Dezembro Vermelho, mês dedicado à prevenção e ao tratamento contra as infecções e o vírus, como também da luta para eliminar a síndrome no país.
“O Brasil tem muito a celebrar hoje com a redução da mortalidade, com a eliminação da transmissão vertical, como problema de saúde pública. Graças ao SUS, graças ao nosso Programa Nacional de Combate à Aids. Tem muita coisa para alertar ainda, muito para melhorar, para cuidar das pessoas, no acesso à saúde, no combate ao estigma, na prevenção”, publicou o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, em sua rede social.
De acordo com a enfermeira e subsecretária de Vigilância em Saúde, Louise Cândido, a queda no número de notificações de HIV e Aids em Juiz de Fora está relacionada às estratégias de prevenção, como a distribuição de camisinhas, a PrEP (Profilaxia Pré-Exposição) e a PEP (Profilaxia Pós-Exposição), que permitem a profilaxia, para qualquer pessoa que tenha relações sexuais desprotegidas a partir dos 16 anos e que se sintam em risco.
Ela também destaca o acesso ao diagnóstico precoce com ampla testagem e à terapia antirretroviral. “Todas as pessoas que vivem com HIV ou Aids têm todo o tratamento garantido de forma gratuita no Sistema Único de Saúde (SUS). Todas são acompanhados no departamento, onde não há somente a oferta do medicamento e de acompanhamento médico, mas de toda uma equipe multiprofissional.”
Vivendo com HIV, artista conta uma nova história

Com os avanços no tratamento de HIV, hoje pessoas das mais diversas realidades vivem vidas saudáveis, seguindo com suas histórias, diferentemente do que marcou o passado. Singular, como também coletiva, a história do artista Drew Persí, 39 anos, é atravessada pelo movimento e pelos reflexos de seu corpo diante do que a vida lhe apresenta: do desejo de viver no mundo do teatro ao de compartilhar uma experiência íntima com seu público.
“Quando gravava vídeos, falava sobre diversos assuntos, mas sentia que não estava sendo completamente ‘eu’, faltava dizer uma outra parte de mim. Foi uma necessidade, algo muito físico”, conta Drew sobre a decisão de falar de sua vivência com HIV.
Ele conta que também se incomodava em ouvir conversas carregadas de desinformação e preconceitos sobre a infecção. Desde aquele primeiro vídeo sobre o tema, publicado no dia de seu aniversário, sua história atravessou o país e abriu caminho para outras.
A produção de conteúdo para o Youtube é somente um de seus tantos trabalhos. Como conta, aos 15 anos foi “encontrado” pelo teatro depois de assistir uma peça autoral na cidade em que nasceu, Santa Rita do Sapucaí, no Sul de Minas. “Consigo sentir a sensação do que causou em mim até hoje. Decidi ali que queria fazer aquilo”.
Com 25 anos de carreira artística, Drew atua no palco e no cinema, recentemente integrando o elenco do filme “Depois do ponto final” do diretor Rafael Aguiar, também dirige peças de teatro, comanda a Entreato Produções Artísticas e publicou o livro “VIDAS: Sobre todas as vezes que morri, para que pudesse nascer outra vez”.
“Temos como referência aqueles artistas que partiram, como Cazuza, Renato Russo e Fred Mercury. Precisamos falar de artistas que estão vivos, que seguem produzindo e fazendo coisas, mesmo vivendo com HIV há tantos anos. Isso é importante para encorajar as pessoas a seguirem em frente”, reflete.
Dentre aquilo que ficou guardado na memória sobre a infecção, ele cita uma capa de revista, publicada em 1989, que trazia o cantor e compositor Cazuza com aparência debilitada e a manchete “Uma vítima da Aids agoniza em praça pública” — uma das muitas narrativas de terror traçadas entre os anos 1980 e 1990. Na busca por romper essa linha, a produção artística de Drew constrói novas imagens, discursos e referências sobre a vida de pessoas que vivem com o vírus.
O artista foi diagnosticado em agosto de 2013, quando, segundo ele, estava vivendo um momento importante de sua carreira artística. Após mais de uma década, mesmo sentindo-se bem resolvido e tendo transformado sua experiência, a recordação daqueles primeiros instantes ainda o traz uma mistura de sentimentos. “Foi muito impactante abrir aquele envelope e entender que, a partir dali, seria uma nova condição, mas também entendi como algo que pode acontecer com qualquer pessoa. Depois comecei o acompanhamento e o tratamento, logo senti que estava com saúde. Hoje vivo uma vida completamente normal, com a mesma expectativa de vida que qualquer outra pessoa, sou indetectável e intransmissível. Vivemos em outros tempos.”
‘Pandemia controlada’
O médico infectologista Marcos Moura afirma que “o Brasil tem uma pandemia controlada de HIV”, com alguns grupos vulneráveis concentrando mais casos, como pessoas que têm menos acesso à saúde, baixa educação ou que vivem em regiões periféricas, onde há escassez de informações, métodos de prevenção e consultas. Como explica, em relação às ISTs, o aumento de casos é uma tendência no mundo todo, devido ao baixo uso de preservativo, principalmente pelos jovens.
Segundo o infectologista, muito antes da PrEP, as pessoas já usavam pouco o preservativo, muitas vezes, somente como método contraceptivo. O uso do preservativo e da profilaxia são essenciais e devem ser paralelos, não complementares ou substituíveis. “É fato que os discursos que estigmatizam, vulnerabilizam ou rotulam a sexualidade, os hábitos ou mesmo a orientação sexual são muito preconceituosos e vão contra as medidas de prevenção no Brasil e no mundo, são um desserviço. Qualquer pessoa que pratica sexo deve fazer testagem e está vulnerável às infecções e ao vírus.”
Moura esclarece que hoje as pessoas que vivem com HIV têm vidas completamente saudáveis e normais, como aquelas não infectadas. “Elas precisam ter todos os cuidados de saúde orientados para qualquer outra pessoa: atividades físicas, alimentação saudável, saúde mental, redução de consumo de álcool, não fumar ou usar drogas. “Basta tomar o seu medicamento diariamente e se manter com a imunidade boa, consequentemente, ela fica clinicamente curada, pois não fica mais doente, não vai evoluir para Aids e não vai transmitir a doença.”
Acesso à testagem gratuita em Juiz de Fora
A subsecretária de Vigilância em Saúde ressalta que todas as pessoas que queiram podem procurar o serviço de aconselhamento e de testagem de HIV e ISTs no Centro de Vigilância e Saúde, localizado na Rua Antônio José Martins, número 92, no Bairro Morro da Glória, na região Central do município.
No caso de situações de urgência e emergência, em que existem riscos biológicos, como incidentes ocupacionais, exposição sexual e violência sexual, deve-se procurar o atendimento do Hospital de Pronto Socorro (HPS), que conta com o serviço Protocolo de Atendimento ao Risco Biológico, Ocupacional e Sexual (PARBOS). No local, a pessoa passa por avaliação clínica, testagem, medidas profiláticas e encaminhamento para acompanhamento.









