Serviço obrigatório de wi-fi falha em ônibus e provoca multas para empresas
A internet é para todos. Pelo menos é esta a bandeira levantada por quem defende a democratização da grande rede, constituída por políticas públicas com intuito de garantir o acesso a todas as camadas da sociedade. Em Juiz de Fora, dois serviços gratuitos cumprem este papel, embora os resultados alcançados sejam distintos. No mais recente, a licitação do transporte coletivo urbano, concluído ano passado, exigia-se que todos os veículos da cidade tivessem a internet wi-fi disponível para os passageiros. Esta regra é cumprida, mas isso não é garantia de bom serviço. Prova disso é que a Settra já identificou e autuou as empresas de transporte porque 126 veículos apresentaram falhas na conexão, totalizando multa de R$ 20.142,36. Outra forma de uso está em 11 espaços públicos, constituídos por praças, parques e calçadões. Não há problemas de sinal nos pontos testados, mas a baixa adesão dos usuários é realidade. Mesmo assim, desde que foi implantada, em 2015, mais de dois milhões de conexões foram feitas por 109 mil usuários. Vinte e sete por cento dos acessos partiram do Parque Halfeld.
Durante dois dias de março, a Tribuna testou o serviço de internet wi-fi em seis coletivos do município. As linhas foram escolhidas de forma aleatória, tendo como base dois critérios: o repórter estaria em um ônibus que atende cada região da cidade e este veículo deveria estar relativamente vazio. Isso porque, conforme o contrato de prestação do transporte público, os consórcios são obrigados a fornecer 20 conexões simultâneas, e não mais do que isso. O resultado encontrado reflete na realidade já conhecida da Settra, pois somente dois dos seis veículos apresentaram conexão estável e sem problemas de autenticação. Em outras duas, o acesso ficou instável e, em mais duas, não foi possível se conectar à rede do ônibus.
“Nem tento mais. Prefiro usar a minha internet, a do ônibus quase nunca funciona”, disse a balconista Helena Fonseca, 27 anos, moradora do Bandeirantes. “Algumas vezes tento a conexão por tanto tempo que, quando percebo, já é hora de descer”, lamentou o padeiro José Amarildo Sousa, 31, do Alto Santo Antônio.
Falhas pontuais no acesso por meio dos veículos são toleradas pela Settra, dada a instabilidade técnica da tecnologia. Para a conexão dos passageiros, é utilizada a rede 4G de uma operadora de telefonia celular que, por questões diversas, pode apresentar pontos considerados de sombra, onde o sinal não chega. As multas aplicadas, a partir de janeiro, são por falhas mais graves, como, por exemplo, a não identificação do modem e do roteador no veículo.
Recursos
Segundo o supervisor do Departamento de Fiscalização de Transporte e Trânsito, Eduardo Colleta, os consórcios apresentaram recursos referentes aos autos de infração, mas até o momento nenhum deles foi acatado. “Temos uma plataforma em que verificamos se o referido ônibus está ou não disponibilizando acesso à internet. Quando não está, enviamos a fiscalização in loco para constatar a falha. Outro modo de identificar problemas é por meio da fiscalização de rotina, feita aleatoriamente”, disse.
Conforme o supervisor, quando o auto de infração é feito, a empresa recebe prazo de cinco a dez dias para se manifestar e corrigir a falha. Caso contrário, nova multa pode ser aplicada. “Multar não é nosso objetivo, e sim garantir a disponibilidade. Por isso, antes de chegar a este recurso, tentamos outros, como contatar as empresas, ir até as garagens e verificar os ônibus.” Ainda segundo ele, é impossível fiscalizar diariamente 630 carros da frota, por isso a Settra conta com o apoio dos usuários, que podem registrar reclamações e denunciar falhas por meio do telefone 3690-8218.
Problemas técnicos
De acordo com os Consórcios Integrados do Transporte Público (Cinturb), muitos dos problemas identificados são de origem técnica e “todas as multas que chegaram até a assessoria jurídica foram devidamente respondidas. Sendo, principalmente, devido ao período que antecedeu a fase de implantação do sistema”. No entanto, a Settra desmente este fato, dizendo que todas as 126 autuações foram registradas a partir de janeiro, quando a internet já devia estar disponível em toda a frota.
Para garantir o fornecimento de internet aos passageiros, as empresas usam a plataforma intitulada Sem Senha. O CEO da empresa, Alexander Leal, disse que monitora os mais de 600 equipamentos instalados durante 24 horas e duas das principais razões para falhas pontuais no acesso são a indisponibilidade da rede 4G ou algum problema dos dispositivos. “O gerenciamento das empresas e da própria Settra é feito em uma plataforma fornecida por nós. A dificuldade hoje é passar para a secretaria a real situação do momento. Por exemplo, identificamos uma falha no equipamento e fazemos a substituição, mas o antigo ainda aparece como inativo.”
Usuário
Outra situação observada pelo CEO é que, em muitos casos, os passageiros estão se conectando à rede errada. Ou seja, utiliza o wi-fi de um ônibus que está próximo no momento em que a conexão é feita. “No Centro, por exemplo, onde há vários veículos próximos, isso pode acontecer. Então o usuário deve ficar atento ao número do veículo que é o mesmo da rede sem fio.”
Contrato de internet nas praças é renovado
Além dos ônibus, 11 espaços públicos da cidade têm internet sem fio gratuita disponíveis. O contrato entre a Prefeitura e a empresa responsável por oferecer o serviço, a Virtual Telecom, venceria no último sábado, mas foi renovado por mais dois anos, de acordo com a Secretaria de Planejamento e Gestão (Seplag). A Tribuna foi a todos os pontos com internet e encontrou boa conexão em todas elas. No entanto, identificou baixa adesão por parte dos usuários, principalmente na periferia. Mesmo assim, dados atualizados da empresa que fornece o sinal de internet mostram que, desde 1º de julho de 2015, quando o serviço teve início, 2.052.896 conexões foram feitas, por meio do cadastro de 109.377 usuários ativos.
O ponto mais utilizado é o do Parque Halfeld, responsável por 556 mil conexões. No local, o fluxo de pessoas, com smartphones nas mãos, acessando a rede pública é visto a todo o momento. Um dos usuários assíduos é o vendedor Rafael Vidal, 26 anos, que trabalha em uma loja próxima ao parque. “Venho usar a internet durante minha hora de folga. Funciona muito bem, nunca tive problemas. Neste momento estava, inclusive, assistindo a um vídeo”, disse.
Na periferia, porém, a realidade é outra. Na Praça Coronel Jeremias Garcia, em Benfica, por exemplo, sete pessoas usavam internet no celular no momento em que a reportagem esteve no local, uma quarta-feira, no período da tarde. Porém, nenhuma delas optava pelo wi-fi gratuito. No Centro de Artes e Esportes Unificados, conhecido como Praça CEU, na Zona Norte, também não havia usuários.
A falta de informação sobre como usar a rede é um problema que precisa ser resolvido, conforme o titular da Seplag, Argemiro Tavares. “No início, teve uma explosão de utilização, e isso foi diminuindo. Por isso é preciso fazer um trabalho para dar publicidade ao serviço. Quando disponibilizados a internet nos calçadões, por exemplo, não tivemos a possibilidade de divulgar por causa do período eleitoral. Já estamos preparando este reforço com a Secretaria de Comunicação”, informou.
Expansão
Também está nos planos da Prefeitura expandir o sinal wi-fi para outras áreas públicas da cidade. Mas para isso, o modelo atualmente adotado deverá ser revisto. Conforme o contrato em vigor, a Prefeitura fez um chamamento público para que qualquer empresa de internet apresentasse a intenção de oferecer o serviço, sem qualquer ônus ao município. Na época, duas foram as interessadas, mas somente uma foi credenciada, por ter apresentado o documento em tempo hábil.
“Para expandir, a questão do cadastro precisa ser revista. Hoje ela é feita pelo provedor credenciado. Se for mais de uma empresa, tecnicamente, deveriam ter dois cadastros, o que não é interessante para o usuário. Tudo isso está sendo analisado, pois não podemos gerar ônus aos cofres públicos e nem para as empresas”, explicou, acrescentando que o cadastro é necessário por questões jurídicas. “Em caso de alguma irregularidade, a Justiça pode determinar que o provedor identifique quem fez determinado acesso.”
A previsão do secretário é que um novo chamamento público ocorra ainda neste semestre.