O canto da sereia

Por Fábio Lessa

A era das redes sociais trouxe consigo uma nova forma de publicidade: a dos digitais influencers. Essas pessoas, que possuem muitos seguidores nas redes sociais, são frequentemente contratadas para promover produtos e serviços de empresas e marcas. Uma das áreas em que os “influenciadores” têm sido cada vez mais solicitados é a da gastronomia. No entanto, nem todos os digitais influencers que se propõem a dar dicas de restaurantes possuem o conhecimento necessário para fazê-lo de forma confiável e embasada. Muitas vezes, essas pessoas são escolhidas apenas pela popularidade nas redes sociais e nicho de público, sem que sejam levados em conta seus conhecimentos ou experiências no campo da gastronomia. O resultado disso pode ser desastroso tanto para os seguidores quanto para os próprios estabelecimentos que são recomendados. Afinal, se o influenciador não entende nada de comida, como pode avaliar a qualidade dos pratos e a experiência gastronômica que o restaurante oferece?

Dias atrás me deparei com um desses influencers errando a mão ao enaltecer um estabelecimento, comparando e colocando-o no mesmo nível dos melhores de Paris. “Ah Fábio, mas você está falando isso porque não falaram do seu restaurante!”. Até do meu restaurante eu iria sentir vergonha alheia se alguém falasse isso, até porque sei que ele está longe dos melhores de Paris, sentiria vergonha se falasse isso de qualquer restaurante do Brasil. Colocar qualquer restaurante brasileiro no mesmo patamar que um Au Plaza Athénnée, um Epicure, ou um Le Meurice’s Pastry Boutique, mostra nada mais nada menos que uma falta de bom senso e de conhecimento gastronômico. É só analisar quais restaurantes do Brasil possuem 3 estrelas Michelin, nenhum. Na verdade, qualquer restaurante francês com 1 estrela, seria facilmente 3 estrelas aqui no Brasil. A questão aqui não é se o restaurante é bom ou ruim. A questão é o tipo de comparação infundada, feita por alguém que sequer folheou o “Cozinha Confidencial” de Antoin Bordain, muito menos sabe quem foi ele, ou abriu em uma página aleatória e leu um texto no “Chef Profissional” do Instituto Culinário da América.

Não posso, não quero, nem estou aqui para julgar a qualidade do restaurante, estou aqui para mostrar o perigo que uma analogia inadequada deste tipo pode causar para o estabelecimento em si, e foi isso que me levou a escrever. Um grau elevado de expectativa foi gerado nos seguidores, e a partir disso, qualquer deslize da casa pode custar caro, isso sem mencionar as pessoas que realmente conhecem os melhores de Paris. Se o objetivo seria levar clientes ao restaurante, ele foi alcançado, mas quantos desses clientes voltariam? Quantos desses saíram de lá decepcionados por não se sentirem em um 3 estrelas Michelin? Te respondo, vários; pois em paralelo à postagem enaltecendo a casa e colocando-a junto aos melhores do mundo, vieram outras de clientes comuns como eu, e você que está lendo, narrando tamanha decepção. Esperaram uma Ferrari e receberam um Civic, ambos são excelentes carros, mas uma Ferrari ainda é uma Ferrari.

Uma outra situação que ocorreu com um desses “influenciadores gastronômicos”, se é que posso chamá-lo assim, foi quando ele respondeu a uma caixa de perguntas no Instagram e afirmou que não consome doces. Ele explicou que quando tem que promover alguma sobremesa, ele simplesmente a usa para fazer publicidade, dizendo o que seus contratantes querem, mas que ele próprio não come nem mesmo uma única mordida do doce. No final das contas, quem se beneficia com as guloseimas são seus amigos, enquanto ele apenas utiliza a situação para fins comerciais. Isso me fez lembrar da Xuxa fazendo propaganda de um creme hidratante, e todo mundo se questionava se ela realmente o usava.

É importante lembrar que a gastronomia é uma arte e uma ciência, que envolve uma série de aspectos que vão além do simples sabor do prato. A qualidade dos ingredientes, a técnica culinária, a apresentação dos pratos, o serviço e a atmosfera do local são apenas alguns exemplos dos aspectos que devem ser considerados ao avaliar um restaurante. Por isso, é fundamental que os digitais influencers que se propõem a dar dicas de restaurantes tenham um conhecimento sólido sobre gastronomia. Isso significa entender os diferentes tipos de culinária, conhecer a origem e a qualidade dos ingredientes utilizados em cada prato, saber sobre técnicas de preparo, sobre as melhores combinações de sabores e aromas, harmonização e técnicas de serviço à mesa. Além disso, os influenciadores precisam ter uma visão crítica e imparcial, avaliando os restaurantes de forma justa e objetiva. Isso implica em experimentar diferentes pratos, avaliar a qualidade dos ingredientes utilizados e a habilidade do chef na elaboração dos pratos.

No entanto, muitos influenciadores não têm o conhecimento necessário para avaliar os restaurantes de forma adequada. Em alguns casos, eles podem ser contratados apenas para promover um estabelecimento específico, sem sequer terem visitado o local ou provado os pratos, como relatei anteriormente. Em outros casos, eles podem ter uma opinião enviesada em função de fatores como a remuneração recebida ou a amizade com os proprietários do restaurante. O resultado disso é que muitas pessoas acabam sendo influenciadas por recomendações de quem não entende nada de comida. Ao seguir essas recomendações, elas podem acabar tendo uma experiência gastronômica ruim e, pior ainda, propagando avaliações negativas sobre os restaurantes que foram recomendados, como o que aconteceu.Por outro lado, existem também muitos influenciadores que têm um

conhecimento sólido sobre gastronomia e que se preocupam em avaliar os restaurantes de forma criteriosa e objetiva. Esses influenciadores podem ser uma ótima fonte de informação para aqueles que estão em busca de bons restaurantes para visitar. No entanto, cabe aos seguidores avaliar com cuidado as recomendações dos influenciadores, levando em conta não apenas a popularidade dessas pessoas nas redes sociais, mas também a sua reputação e credibilidade no campo da gastronomia. Além disso, é importante lembrar que a experiência gastronômica é altamente subjetiva e pode variar de pessoa para pessoa. O que pode ser considerado um bom restaurante por um influenciador pode não ser necessariamente a opinião de outra pessoa. Por isso, é importante também buscar opiniões de outras fontes, como sites especializados em gastronomia, avaliações de clientes e até mesmo amigos e familiares que tenham frequentado o estabelecimento. Lembrando que sites como o TripAdvisor possuem controvérsias quanto à credibilidade e não deve ser parâmetro único para pesquisa de estabelecimentos.

Em resumo, é preciso ter cuidado ao seguir as recomendações de digital influencers que não entendem nada de comida e que dão dicas de restaurantes sem conhecimento ou experiência adequados. Da mesma maneira que eu não posso abrir a boca para falar de moda, o contrário também não deve acontecer. A avaliação criteriosa e objetiva de um restaurante envolve uma série de aspectos que vão além do simples sabor dos pratos, e só pode ser feita por pessoas que possuem o conhecimento e a experiência necessários para isso. Por isso, ao buscar dicas de restaurantes nas redes sociais, é fundamental levar em conta não apenas a popularidade do influenciador, mas também a sua reputação e credibilidade no campo da gastronomia. Buscar opiniões de outras fontes e ter uma visão crítica e imparcial também são importantes para garantir uma experiência gastronômica positiva e satisfatória.

Fábio Lessa

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