O direito à moradia, consagrado no artigo 6° da Constituição Federal, permanece um desafio estrutural no Brasil, especialmente diante do expressivo percentual histórico de famílias em regime de aluguel — 15,1% segundo a PNAD Contínua (4T23) —, em sua maioria pertencentes às camadas de baixa e média-baixa renda. O acesso pleno a essa garantia exige mecanismos de crédito imobiliário acessíveis, sustentáveis e eficazes, nos termos do artigo 23, inciso IX, da Constituição.
Levantamentos do QuintoAndar e do Cedeplar/UFMG indicam que, em média, 25,8% da renda familiar é comprometida com moradia. Nesse contexto, o Conselho Monetário Nacional (CMN) e o Banco Central do Brasil (BACEN) promoveram uma reformulação estratégica do Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE), com o objetivo de alocar recursos de forma mais eficiente, expandir o crédito habitacional e dinamizar o setor da construção civil.
Entre as mudanças, destaca-se a elevação gradual da aplicação obrigatória dos depósitos de poupança de 65% para 100%, com custo efetivo máximo de 12% ao ano, além da ampliação do teto do Sistema Financeiro de Habitação (SFH) de R$ 1,5 milhão para R$ 2,25 milhões, contemplando até 80% do valor do imóvel. O FGTS poderá ser utilizado para amortização, liquidação de parcelas ou redução do valor financiado. Estima-se que o novo modelo disponibilize R$ 111 bilhões já no primeiro ano, sendo R$ 36,9 bilhões imediatamente direcionados a financiamentos habitacionais, além de fomentar linhas de crédito entre R$ 5 mil e R$ 30 mil para reformas de residências de baixa renda.
Apesar de seu potencial transformador, o conjunto de medidas exige análise crítica. O aumento do valor médio das parcelas e do prazo de quitação pode elevar o risco de endividamento. Ademais, persistem diferenças estruturais entre SBPE e Minha Casa Minha Vida (MCMV), colocando em debate a real capacidade da política em reduzir o hiato entre oferta e demanda.
A efetividade do crédito imobiliário depende de fatores estruturais, como: (i) estabilidade da renda, (ii) segurança no mercado de trabalho e (iii) coordenação de políticas públicas voltadas à habitação social. A elevada rotatividade laboral e a precariedade de renda entre trabalhadores de baixa renda dificultam o acesso à casa própria e aumentam o risco de inadimplência, configurando um dos maiores desafios à concretização do direito à moradia.
Observa-se, por fim, que o enfoque das novas diretrizes recai de forma mais direta sobre famílias de renda média, que, embora em melhor situação relativa, continuam enfrentando barreiras para acessar financiamento habitacional verdadeiramente acessível. As novas regras estão em fase de implementação e avaliação, permitindo ajustes futuros para ampliar seu alcance e efetividade social.

