Comércio sente impacto da crise


Por GRACIELLE NOCELLI

19/09/2015 às 07h00

Há quase dez anos na cidade, Habib's da esquina com a Rua Romualdo e a Avenida Rio Branco encerrou as atividades (Marcelo Ribeiro/18-09-15)

Há quase dez anos na cidade, Habib’s da esquina com a Rua Romualdo e a Avenida Rio Branco encerrou as atividades (Marcelo Ribeiro/18-09-15)

Reflexo da crise que assola o país, Juiz de Fora perdeu 607 empresas entre janeiro e agosto. Do total de negócios que fecharam as portas nos primeiros oito meses do ano, 283 pertenciam ao comércio. A perda de estabelecimentos comerciais é 16% maior do que a verificada no mesmo intervalo do ano passado, quando foram registrados 243 fechamentos pela Junta Comercial do Estado de Minas Gerais (Jucemg). Mas a tendência é que os números não parem por aí. As dificuldades abrangem empresas de diferentes portes, ramos de atividade, tempo de mercado e localização. Esta semana foi confirmado o encerramento das atividades das duas lojas do Habib’s, localizadas no Centro e no Independência Shopping.

A dificuldade é fruto do contexto econômico nacional em que a elevação das taxas de juros para pessoa física e o aumento do desemprego reduziram o poder de compra do consumidor e, consequentemente, acarretaram queda nas vendas. Em contrapartida, os custos fixos encareceram com o aumento da tarifa de energia elétrica, do aluguel, dos impostos e dos juros cobrados pelas linhas de crédito. “Existe uma crise efetiva, que faz com que os negócios atuem na margem de equilíbrio, e uma crise construída, que inibe o consumo. Se você está na margem e o movimento cai, há prejuízo. Alguns locais acabam fechando”, explica o diretor executivo da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel) da Zona da Mata, Marcos Henrique Miranda.

De acordo com o superintendente regional de Fazenda, Marcos Abib, a economia juiz-forana sofre os impactos da recessão. “O comércio é um dos setores afetados. Tivemos queda na arrecadação do ICMS em toda a cadeia produtiva.” Dados da Receita Estadual mostram que, entre janeiro e agosto, a cidade recolheu R$ 336,5 milhões com o imposto, o que corresponde a redução de 10,56% em comparação com igual período do ano passado., quando foram recolhidos R$ 376,2 milhões. O comércio teve diminuição de 5,93% neste intervalo.

A Tribuna percorreu as ruas do Centro, onde a realidade é notória diante das lojas com portas fechadas estampando anúncio de “aluga-se”. Só na Galeria Pio X, são oito estabelecimentos vazios. No Calçadão da Rua Halfeld, um imóvel disponível para locação há um ano e dois meses segue aberto durante o dia com a presença de um profissional para apresentá-lo aos possíveis interessados. No mesmo local, já próximo à Rua Batista de Oliveira, outro ponto segue livre para locação desde janeiro do ano passado.

“Estamos sendo bombardeados com decisões políticas e econômicas que tornam ainda maior o desafio de sobrevivência dos negócios”, explica o presidente do Sindicato do Comércio (Sindicomércio-JF), Emerson Beloti. “O empresário está buscando alternativas. Alguns reduziram o número de lojas, outros mudaram de endereço na tentativa de diminuir os custos fixos, e há, ainda, aqueles que modificaram a natureza do negócio e tornaram-se franquias. É uma tentativa de sobreviver a este período.”

Além do reflexo do cenário econômico nacional, Abrasel e Sindicomércio destacam aspectos locais que contribuem para o enfraquecimento do comércio. “A greve da UFJF tirou muitos estudantes de circulação e alterou a rotina de professores e trabalhadores. O segmento de alimentação fora do lar está sentindo essa perda”, pontua Miranda. “Temos poucas indústrias, e o ideal é que se tenha o equilíbrio entre os setores. Quando a economia é pautada no comércio e nos serviços, a cidade se torna um local de passagem. A indústria paga melhor, porque exige maior qualificação do empregado, e contribui para o consumo, trazendo uma renda per capita mais elevada”, avalia Beloti.

Habib’s

A assessoria do Habib’s confirmou o fechamento das duas lojas da rede na cidade. Em nota, declarou que “por questões contratuais, interrompemos as operações dessas unidades. Reconhecendo a receptividade, a grandeza e o potencial do mercado onde estavam implantadas essas operações, a Rede já estuda, em breve, retomar suas atividades na região.” A Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel) da Zona da Mata também confirmou a informação, mas não soube dar detalhes. “É verdade que estamos enfrentando um momento muito difícil”, lamentou Miranda. A Tribuna tentou contato com o empresário responsável pelas franquias, mas não teve resposta.

Após migração de lojas, Benfica tem perdas

As dificuldades enfrentadas pelo comércio juiz-forano não se restringem às ruas do Centro. Segundo informações da Associação Comercial e Empresarial (ACE) de Benfica, os lojistas da região também têm sofrido perdas. “Nos últimos dois anos, acompanhamos um movimento de migração das lojas do Centro para cá. Muitos empresários eram atraídos pelo valor mais barato dos aluguéis. Hoje, boa parte destas lojas fechou, e o comércio tradicional do bairro luta contra a crise que estamos vivendo”, relata o presidente Euzébio Martins.

A região de Benfica possui 200 estabelecimentos comerciais que atendem cerca de 27 mil habitantes e consumidores de cidades vizinhas. “A situação vivida pelo comércio dos bairros é a mesma, pois a conjuntura econômica é desfavorável para todos. Se o consumidor não compra, as lojas não vendem, e muitos negócios fecham.” Segundo ele, as empresas que encerraram as atividades este ano eram de portes e ramos variados. “Perdemos loja que era recente no bairro, mas bastante tradicional na cidade.”

Shoppings

No Shopping Alameda, duas lojas foram desocupadas este ano. “A pequena redução reflete na momento atual do varejo no Brasil”, analisa o gerente comercial Leandro Resende. Para ele, 2015 está mais difícil do que os anos anteriores. Segundo dados da Associação Brasileira de Shoppings Centers (Abrasce), até junho, as vendas no setor em todo o país apresentaram retração de 0,8%. “Trabalhamos muito afinados com os lojistas e percebemos uma preocupação muito grande com a queda das vendas, principalmente nas datas comemorativas.” Apesar disso, ele garante que mantém o otimismo para 2016. “As expectativas são sempre muito boas, mas não podemos fugir a atual realidade, estamos trabalhando duro para manter os clientes.”

De acordo com a auxiliar de marketing do Mister Shopping, Ana Caroline Freitas, o índice de ocupação do empreendimento tem se mantido estável nos últimos anos. Atualmente, três lojas estão desocupadas. “Nessa época de retração econômica, a saída é sempre investir em parcerias e na qualidade do atendimento”, pontua. A assessoria do Independência Shopping não informou a taxa de ocupação do estabelecimento, mas garantiu a manutenção do projeto de expansão mesmo com a crise.

Planejamento é estratégia de sobrevivência

Para sobreviver à crise, não há receita exata, mas o planejamento é primordial para qualquer empresa, conforme explica o analista técnico do Sebrae, Gustavo Magalhães. “O mercado é dinâmico, e o que funciona hoje pode não dar muito certo daqui um tempo. É fundamental conhecer o próprio negócio, o mercado em que se está inserido e saber ler e interpretar indicadores para conseguir fazer uma boa gestão.”

Ele garante que a empresa quando está bem estruturada consegue sobreviver à crise. “Será um momento em que ela irá crescer menos ou talvez até enxugar custos, mas vai conseguir enfrentá-lo.” E para uma boa estruturação, a palavra de ordem é planejamento. “É o período que deixa mais evidente que o empreendedor precisa se preparar, antecipar às possíveis dificuldades. Também é necessária maior atenção ao fluxo de caixa, pois os imprevistos podem demandar custos .”

O presidente da ACE de Benfica, Euzébio Martins, também dá dicas. “O ideal é trabalhar com um capital de giro e um capital estratégico. O primeiro movimenta a empresa, e o segundo é utilizado para as adversidades que possam surgir.” Ele destaca, ainda, a importância de manter uma boa relação com o cliente. “É preciso buscar novas estratégias para atrair o consumidor, mas principalmente, estabelecer uma comunicação eficiente e um bom atendimento.”

Para o presidente do Sindicomércio-JF, Emerson Beloti, é importante que o empresário não perca a confiança. “É preciso ser otimista, para não se abater diante da crise, e realista, para tomar as decisões com o pé no chão.”

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