Gigi andava cansada de ralar. Trabalhar, trabalhar, trabalhar pra chegar ao fim do mês e as contas não fecharem.
– Qualquer sacolinha no Bahamas é 200 reais, tá doido!
Mas em tempos de plataformização do trabalho, Gigi deu um jeito de fazer uma renda extra. Como é dotada de muito boa saúde, decidiu criar perfil em um serviço de assinatura de conteúdo adulto. E tem sido um sucesso.
– Home office é tudo, né, bem?
Gigi faz performances exclusivíssimas e muito elogiadas por quem paga para vê-la. Dança, faz evoluções sensuais, revoluções hormonais, provocações várias. Às vezes mostra só uma parte do corpo. Às vezes mostra tudo, a depender do cachê. Fala coisas que deixariam Dercy Gonçalves, que Deus a tenha, ruborizada. E vai faturando seu troquinho na honestidade.
Tudo muito seguro, à distância, ninguém sabe sequer em que país Gigi mora (é no São Mateus).
Às vezes acontecem umas esquisitices, homem que pede pra ela só mostrar o pé, outro que paga o dobro se ela imitar a voz do Pato Donald, casais que solicitam apenas que Gigi os observe em conjunção carnal, donas de casa que querem ver Gigi de avental limpando vidraça… tem de tudo. Até gente que só quer ser escutada.
– Pode ir tirando esse robe e botando uma roupa decente, minha filha. Só quero conversar.
Gigi então veste um moletom e fica ali na beirada da cama, preparada para ouvir. Tem que estar pronta para tudo, porque os relatos são variados. Gente em crise existencial. Em crise religiosa. De identidade. No trabalho. Gente que se sente muito sozinha. Gente que nem é sozinha, mas não tem com quem conversar sobre determinado assunto.
Gigi já pensou até em cursar psicologia e lançar um perfil novo: a Psicóloga Pelada. Por enquanto vai levando, porque dá um bom dinheiro mesmo sem curso superior. Mas nem sempre a vida de Gigi é fácil, porque a uberização tem seu ônus. Como hoje de manhã, quando um cidadão que só quer conversar abriu assim o colóquio:
– E aí: votou no Bolsonaro ou no outro lá?
Conversando com Gigi
