JF tem quase um acidente por dia com ciclistas em 2023
Associação reclama de ausência de ciclovias e de sinalização deficiente; promessa de pista às margens do Paraibuna vem de décadas, e PJF diz buscar recursos
Juiz de Fora tem quase um acidente envolvendo ciclistas a cada dia, segundo revela levantamento do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) Cisdeste. Os dados levam em conta o período entre janeiro e 15 de setembro deste ano, quando, neste intervalo de tempo, 234 pessoas se feriram nas ruas da cidade andando de bicicleta. Isso equivale a um registro a cada 26 horas. De acordo com a presidente da Associação Juiz-forana de Ciclismo (AJFciclismo), Giovanna Rezende, a falta de sinalização é a maior causadora de sinistros com adeptos do modal.
Com uma trajetória no ciclismo que remonta a três décadas, Giovanna conta que, ao longo desse tempo, testemunhou poucas mudanças no que concerne à segurança do ciclista na cidade. Hoje, aos 50 anos, considera que, mesmo com leis específicas regulamentando as sinalizações, a falta de implementação e manutenção faz com que não sejam efetivas. “Há uma ditadura dos veículos motorizados em detrimento dos não motorizados. Há o medo por parte dos gestores municipais em se implantar os planos cicloviários (em Juiz de Fora, a Lei que institui o Plano Diretor Cicloviário é de 2012), alegando que o fazem pensando na segurança dos ciclistas, quando, na verdade, a não implantação e não obediência a tais leis colocam ciclistas em perigo, pois os mesmos não deixam de trafegar com suas bicicletas”, alega Giovanna.
Em 2023, foram registradas 86 casos de acidentes envolvendo bicicletas com outros veículos, como carros e motocicletas, de acordo com levantamento do Samu. As taxas deste ano não fogem ao padrão que vem sendo apresentado na cidade, mas apresentam crescimento. Em 2022, no mesmo período, foram registrados 67 acidentes.
Ciclorrotas estão deterioradas
A ausência de ciclovias, pistas destinadas ao trânsito exclusivo de bicicletas, faz com que as pistas existentes e que privilegiam os ciclistas, como as ciclorrotas da Avenida Rio Branco, fiquem em voga. “As ciclorrotas implantadas em 2016 hoje se encontram praticamente apagadas. E há um movimento espontâneo de ciclistas em geral (muitos deles entregadores) que utilizam as faixas exclusivas dos ônibus e a contramão, na ilusão de estarem seguros. E é uma ilusão! Estão muito suscetíveis a sinistros de trânsito”, adverte Giovanna Rezende sobre infrações cometidas constantemente por ciclistas que, segundo ela, sentem-se ameaçados dividindo a pista de rolamento com carros e motocicletas.
A reportagem verificou a situação das ciclorrotas em dois pontos distintos da Avenida Barão do Rio Branco, uma das principais vias de Juiz de Fora. A primeira foi próximo ao supermercado Bahamas São Vicente, no Alto dos Passos. No local, a sinalização no chão aparece apagada, sendo irreconhecível o símbolo que anuncia a rota para os ciclistas. A placa indicando “prioridade ciclista”, afixada no poste, também apresenta sinais de deterioração. O segundo está localizado em frente ao Ritz Plaza Hotel, na região central. De modo semelhante ao citado acima, a sinalização na pista encontra-se irreconhecível. As marcas do tempo e o tráfego intenso de veículos ao longo da via tornaram ilegível o sinal, que carece de manutenção.
Namoro antigo com ciclistas
Os ciclistas trafegam em meio aos carros em Juiz de Fora. A cidade nunca possuiu uma ciclovia, embora a construção de uma seja promessa antiga. Há mais de 20 anos, a proposta de construção de uma ciclovia corre entre as administrações municipais. O primeiro esboço foi desenvolvido durante o mandato do então prefeito Tarcísio Delgado. O projeto planejava a construção às margens do Rio Paraibuna. Porém, sua implementação nunca foi levada a cabo. Posteriormente, em 2012, foi instituído o Plano Diretor Cicloviário Integrado. A lei se apoiava em criar uma infraestrutura de rede cicloviária em Juiz de Fora, mas, desde sua instituição, ainda durante o governo de Custódio Mattos, nunca foi colocada em prática.
Após dez anos, em 2022, o regramento voltou a ser discutido pela Comissão de Urbanismo, Transporte, Trânsito, Meio Ambiente e Acessibilidade da Câmara Municipal. Representantes das Secretarias de Mobilidade Urbana e Esporte e Lazer da Prefeitura de Juiz de Fora (PJF); do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transporte (DNIT); da Companhia de Concessão Rodoviária Juiz de Fora – Rio de Janeiro (Concer) e de associações de ciclismo do município também estiveram presentes. Dentre as pautas relacionadas à segurança do ciclista na cidade, também foi elencada a necessidade da aplicação imediata do Plano Diretor Cicloviário Integrado.
Segundo Giovanna Rezende, a falta das devidas regulamentações fizeram com que a medida não fosse implantada. A Tribuna perguntou à PJF a que se deve a inatividade da lei, que ainda não foi regulamentada, mas não obteve resposta até o fechamento dessa publicação.
Captação de recursos
Outra iniciativa que ficou acertada pela Comissão foi a solicitação de informações ao Poder Executivo e à MRS Logística S/A quanto à construção de ciclovias às margens do Rio Paraibuna. Em uma reportagem da Tribuna realizada um ano atrás, a PJF acenou em direção à construção da ciclovia ao longo do curso d’água. Havia projeção de que a obra, que seria a primeira na cidade, fosse entregue no mesmo ano. Em nota, a PJF reiterou que permanece nessa empreitada. Segundo a Administração municipal, no momento está sendo trabalhada a captação de recursos para a ciclovia, e o projeto para tal está em fase de finalização.
Lei estipula que estabelecimentos tenham bicicletário
Em abril deste ano foi publicado nos Atos do Governo a sanção do “Programa Vai de Bike”, de autoria do vereador Maurício Delgado. A nova lei propõe ações voltadas para a melhoria do sistema de mobilidade cicloviária. Para isso, fica estabelecida “a criação de estacionamentos para bicicletas em locais de grande afluxo de público, que tenham mais de 200 m² de estacionamento (em órgãos públicos e privados)”.
A príncipio, a ideia é que estabelecimentos antigos tenham um tempo hábil para se adaptarem à nova norma, enquanto novas instalações já sejam orientadas a inserir o bicicletário no projeto. Em reunião entre o autor da lei e a secretaria da Secretaria Municipal de Sustentabilidade em Meio Ambiente e Atividades Urbanas (Sesmaur), realizada no ínicio deste mês, ficou estabelecido que para todos os estabelecimentos com possíveis aprovação de material construtivo em Juiz de Fora a lei já está em vigor.
“Entretanto, os imóveis já construídos terão um tempo de adequação, a partir homologação do decreto, que tem previsão para os próximos dias”, explica o vereador Maurício Delgado. Todavia, o representante da Casa legislativa observa que muito ainda precisa ser feito nesse sentido. “Se queremos um meio de transporte alternativo, temos que fazer muito ainda”, observa.