Sopa dos Pobres reforça compromisso social com a população
Além das refeições diárias, frequentadores têm a oportunidade de participar de rodas de conversa e de cursos profissionalizantes
“São mais de 30 anos vindo aqui”, comenta Paulo, 78 anos, sobre sua presença na Sociedade Beneficente Sopa dos Pobres. Religiosamente, de segunda a sexta-feira, o idoso vai à instituição para almoçar. Durante tanto tempo, acompanhou a mudança dos rostos – tanto de funcionários quanto daqueles que também fazem uma das principais refeições do dia no local. “Mudou muito, mas também tem gente que vem há muito tempo”, diz.
A Sopa dos Pobres, como é popularmente conhecida, funciona no mesmo prédio, que fica na Rua Santo Antônio, no Centro de Juiz de Fora, há 86 anos. No total, são 92 anos que a Sopa cumpre o seu objetivo diário: “oferecer refeições a qualquer pessoa que apareça por aqui entre 11h e meio-dia”, conta Daniel Salomão, atual tesoureiro da instituição. Ele faz questão de ressaltar, ainda, que a sobrevivência da instituição só é possível graças às doações que recebe.
De acordo com Daniel, são servidas entre 200 a 300 refeições diárias, considerando que as pessoas que almoçam podem repetir livremente. Ele aponta ainda que tem observado nos últimos meses um aumento no pico de pessoas que passam pela Sopa, “semelhantes às demandas do primeiro ano da pandemia”, relata. Se houve períodos em que a média era de 150 pessoas, atualmente a média é de cerca de 220.
Insegurança alimentar
O Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia de Covid-19 no Brasil apontou que, entre 2021 e 2022, em Minas Gerais, menos da metade das famílias possuíam segurança alimentar. Foi também durante a pandemia que o Brasil voltou ao Mapa da Fome da Organização das Nações Unidas (ONU). Também entre 2021 e 2022, o Inquérito classificou que mais de 1.756.000 estavam em situação de insegurança alimentar grave, ou seja, sentiam fome.
Apesar das nuances, que aumentam as médias, Daniel comenta que, pelo menos nos últimos 20 anos, o perfil que frequenta a instituição não muda tanto: “a maioria, pelo menos metade, são pessoas em situação de rua, mas também vêm pessoas sozinhas, idosos, famílias, mas sempre alguém que se encontra em vulnerabilidade social”.
‘Eles atendem com o maior carinho’
José Amilton, 68, mora sozinho em um bairro da Zona Norte de Juiz de Fora. Assim como Paulo, ele diz que não perde um dia de sopa, aonde vai há pelo menos cinco anos. E sempre chega cedo. “Só tenho que elogiar e agradecer a Deus por ter eles aqui para atender a gente”, diz, ressaltando a forma respeitosa como é tratado dentro da instituição. “Eles atendem com o maior carinho, o maior respeito, e para mim, ultimamente, o que faz mais diferença na vida da gente é o respeito. Não é porque você tem uma situação meio carente e tudo que te atendem de qualquer jeito”, relata.
Religioso, ele carrega um crucifixo no peito e tenta aplicar nos lugares por onde passa aquilo que aprende na religiosidade, seja na Igreja Católica ou nas reuniões espíritas kardecistas das quais participa. Para José Amilton, o que vale mesmo é ajudar o próximo. “Se alguém não tem onde tomar banho, deixo tomar na minha casa; aos domingos pego legumes na feira para distribuir para as pessoas do bairro; dou conselhos ao pessoal para tratar bem as pessoas aqui na Sopa. Me perguntam o que eu ganho com isso, mas dinheiro não é tudo. Ajuda muito, mas você tirar uma pessoa do abismo, para mim, já é muita coisa.”
Ouvinte assíduo e bom de papo, ele frequenta também a Reunião dos Idosos, que acontece às quintas-feiras na Sopa dos Pobres. A roda de conversa recebe convidados que guiam os assuntos com as demais pessoas idosas que participam, falando de questões afetivas, oferecendo apoio emocional aos participantes. Para o futuro, José Amilton fala que não espera a vida eterna, mas que pede a Deus para ficar um pouquinho mais, “para levar mais alguém para frente”.
Alimentos para a alma
A oferta de refeições diárias é a motivação pela qual a Sopa dos Pobres existe há quase um século. Porém, a instituição vem se destacando por permitir que seus frequentadores tenham diferentes oportunidades de aprendizado. Além da roda de conversa com os idosos, Daniel conta que, com o auxílio de parcerias, a Sopa oferece cursos profissionalizantes, como confecção de bijuterias, artesanato, cursos da área de beleza, entre outros. “Tem também o projeto Renascer, que instrui os idosos com questões de leis, saúde, também questões lúdicas, direitos”, completa.
Patrícia, com curso de formação em magistério, está afastada das salas de aula desde a pandemia e diz que já fez vários cursos e busca recolocação no mercado a partir deles. “Já fiz o de artesanato, o de flores, onde aprendemos a ornamentar vasos e fazer buquês de noivas, agora estou no de bijouterias.”
Proporcionar uma segunda chance não se reduz a uma nova entrada no mercado de trabalho. Para Andreia, frequentar o ambiente e conhecer as atividades foi uma nova chance de viver. “Eu tive depressão e comecei os cursos para ocupar a cabeça. Foi ótimo! Me trouxe tantos resultados positivos, me trouxe uma nova vida.” Ela relata que chegou à instituição após sair do emprego de mais de duas décadas por conta de uma cardiopatia. “Eu já tinha emagrecido mais de 20 quilos. Cheguei aqui e falei que não tinha nada para comer. A assistente social me atendeu, me deu uma cesta básica e me orientou sobre os cursos.” Há dois anos frequentando as atividades, ela diz que hoje é só agradecimentos. “Eu cheguei no zero. Mesmo!”