Pessoal fala muito por aí, não sem razão, que nossa percepção do mundo é fabricada pelo cinema de Hollywood. E pela novela das oito. E pelo Jornal Nacional. É sedutor. A janela dos olhos é estreita; a da tela, larga: dá vista pra longe, aonde os pés da gente não chegam nem nunca chegarão. Mostra coisas que até Deus duvida.
Nesse último ano, ficamos ainda mais dependentes das telas. Falar com a mãe, tem que ser pela tela. Bater papo com os amigos, pela tela. Estudar, pela tela. Dar aulas, pela tela. Reunião de trabalho, tela. Assistir a um show, tela. Ver teatro, tela. Sexo, tela.
Tudo virou cinema de Hollywood. Tudo virou novela das oito e Jornal Nacional. Tudo amassado, pasteurizado, comprimido e empacotado para caber nos limites da tela do computador. Ou, preferencialmente, do protético celular.
Telas que, se antes nos ofereciam a visão ilusória dos confins do mundo, hoje nos oprimem com a angustiante sensação de confinamento entre anúncios e pop ups e banners de vendas de jaquetas e cremes hidratantes e máquinas de fazer pão.
O mundo da experiência tátil foi reduzido às telas sensíveis ao toque.
A conectividade é um claustro. A publicidade, carcereira.
A liberdade correu pro mato. Escondeu-se sob o véu de cachoeiras, à sombra de coqueiros, num buraco de tatu ao pé da serra, quaisquer lugares em que possamos estar desconectados. Refugiou-se nas páginas amareladas de um livro de Calvino, único lugar a salvo da universal propaganda.
Telas