Plano Municipal de Segurança foca em ações de combate à violência contra minorias
Quase metade das 32 metas elencadas em projeto de lei encaminhado pela PJF à Câmara trata de ações voltadas a grupos mais vulneráveis
A cidade de Juiz de Fora está muito próxima de ganhar seu primeiro Plano Municipal de Segurança e Cidadania. Na última quinta-feira (15), a Prefeitura (PJF) encaminhou à Câmara Municipal um projeto de lei que trata do tema. Basicamente, o texto define um horizonte de ações a serem desenvolvidas e colocadas em prática no hiato de dez anos. Ao todo, a proposição apresenta 32 metas, divididas em cinco temas específicos. O que recebeu atenção especial diz respeito a ações de transversalidade e intersetorialidade das políticas públicas de prevenção às violências, principalmente àquelas que têm as minorias como vítimas.
Os objetivos transversais e intersetoriais de combate à violência contra grupos minoritários respondem por quase metade dos intentos colocados no plano, com a indicação de 14 metas. “As ações aqui propostas, certamente, irão contribuir positivamente para a reversão do quadro crítico de violência que atinge a nossa sociedade, em especial à parcela mais vulnerável da população, com destaque para jovens, negros, mulheres e comunidade LGBTQI”, diz o projeto de lei.
Neste sentido, destacam-se, por exemplo, objetivos como o fortalecimento de ações voltadas para o enfrentamento e a prevenção de todas as formas de violência contra as mulheres. Para isto, o plano visa ao reconhecimento da Casa da Mulher como política de Estado, tornando, assim, a iniciativa permanente. Também é colocada como meta a criação de projeto intitulados “Casa Abrigo” e “Centros Especializados em Atendimento à Mulher em situação de violência”. Segundo o projeto, a retirada de tais intuitos do papel já está “em andamento”.
Da mesma forma, o Plano Municipal também coloca como objetivo a proposição de programas de educação, cultura, esporte e lazer para jovens em áreas de maior vulnerabilidade social em relação ao envolvimento com drogas ilícitas, de forma a minimizar os efeitos nocivos da oferta e do consumo de crack, álcool e outras drogas.
Ainda são colocados como objetivos a implementação de projetos intersetoriais e de programas municipais com vistas à prevenção de homicídios da população jovem, fomentando a cultura da paz nos territórios; e de prevenção à violência e à criminalidade, com destaque para aqueles destinados para as populações que se encontrem em situação de maior vulnerabilidade social.
Implementação de Apac
Outra questão apontada como meta é a implementação na cidade de uma unidade da Associação de Proteção e Assistência ao Condenado (Apac), voltada à recuperação e à reintegração social dos condenados a penas privativas de liberdade, com propósito de evitar a reincidência no crime e oferecer alternativas para o condenado se recuperar.
Criação de Observatório Municipal e realização de conferências públicas a cada três anos
Outras 16 metas tratam de quatro temas específicos. No quesito “Pesquisa e Produção de Inteligência”, destacam-se as propostas de criação de um Observatório Municipal de Violência e Criminalidade para a produção de conhecimento, diagnósticos e diretrizes da política de segurança pública. Da mesma forma, o plano indica a instalação de uma Unidade Integrada de Inteligência em Juiz de Fora, para a dinamização do processamento e compartilhamento de informações sobre a dinâmica da violência e criminalidade na cidade.
Também foram definidas metas específicas voltadas ao tema “Diálogo e Participação Popular”. Entre eles, a criação de um Fórum de Conselhos de Direitos; o fortalecimento do Conselho Municipal de Segurança Urbana e Cidadania; e a criação dos conselhos regionais de Segurança Cidadã (CRESC). Ainda ficará definido que, a cada três anos, deverá ser realizada uma Conferência Municipal de Segurança Urbana e Cidadania.
Expansão de política públicas de videomonitoramento é colocada como meta
Outro tópico abrangido no Plano é a “Integração entre o Município e as Forças de Segurança Pública e Fortalecimento da Guarda Municipal”. Para isto, o projeto de lei indica a instalação do Gabinete de Gestão Integrada Municipal (GGIM), para a criação de uma cultura de integração sistêmica, com vistas à promoção do bem comum e da efetiva implantação das diretrizes do Sistema Único de Segurança Pública (SUSP).
Neste quesito, há ainda metas para a expansão de políticas públicas de videomonitoramento, como o “Olho Vivo”, e objetivos de fortalecimento da Guarda Municipal. Também deverá ser colocada em prática a execução do Plano de Ação da Guarda Municipal, sob a perspectiva da racionalização e otimização dos recursos humanos, financeiros, operacionais, administrativos e dos objetivos da corporação. Segundo o projeto de lei, tal ação já está em andamento.
Capacitação permanente
Um último tópico colocado entre as metas foi o de “Capacitação Permanente”, que indica objetivos como a capacitação de profissionais que lidam com a segurança pública do município, com foco em temas como intervenção comunitária, direitos humanos e mobilização social; e também a qualificação de lideranças comunitárias, ONGs, entidades paraestatais e instituições similares, “a fim de lidar com a problemática da segurança pública a partir de uma abordagem sociológica e não violenta”.
Lei é necessária para que Município busque recursos federais
Segundo a Prefeitura, o projeto de lei que trata do Plano Municipal de Segurança é fruto de discussões amplas e de uma construção coletiva. “Grande parte de suas propostas tiveram origem na 1ª Conferência Municipal de Segurança Urbana e Cidadania”, diz o Município, em alusão a debates feitos em 2019.
A instituição de um plano municipal de segurança pública é imposta pela Lei Federal nº 13.675, de 11 de junho de 2018, que cria a Política Nacional de Segurança Pública e Defesa Social (PNSPDS) e institui o Sistema Único de Segurança Pública (Susp). Sua aprovação é necessária para que o Município possa se habilitar à captação de recursos da Federação.
“Não se trata apenas de um dever constitucional: as políticas públicas municipais de segurança pública cumprem um dever democrático, republicano. Ainda estamos longe de bem conjugar o sentido máximo de segurança pública, o de promover em nossa sociedade uma cultura de paz, que faça de nossas cidades, estados, de nosso país, ambiente próprio para que as pessoas possam viver na plenitude de suas características, individuais e coletivas”, afirma a prefeita Margarida Salomão, no projeto que trata do plano.
Após aprovação, conjunto de diretrizes terá vigência e será desenvolvido pelo período de dez anos
Segundo o texto, o Plano Municipal de Segurança Urbana e Cidadania vigorará pelo prazo de dez anos, contados a partir da legislação a ser debatida na Câmara. De acordo com a proposição, para efeito do cumprimento do Plano Municipal, “serão utilizados os recursos orçamentários próprios da Secretaria Municipal de Segurança Urbana e Cidadania (Sesuc), verbas aprovadas no orçamento participativo, além de fontes alternativas de custeio que não onerem o tesouro municipal”.
Presidente da Câmara, o vereador Juraci Scheffer (PT) afirmou que a mensagem do Executivo que cria o plano precisa ser analisada nas comissões pertinentes da Casa antes de ser debatida pelos vereadores em plenário. “Devemos apreciá-la e liberá-la no próximo período”, avaliou, prevendo as discussões para maio. Juraci considerou ainda que os parlamentares poderão contribuir para o aprimoramento da matéria.
“É uma lei necessária para completar um ciclo na Prefeitura para que ela possa viabilizar recursos do Fundo Nacional de Segurança Pública. O plano demonstra a qualificação em que a cidade está no que diz respeito à força de segurança integrada. Fico feliz de ver o reconhecimento desta gestão a tudo que foi feito anteriormente. Vamos colocar a pauta em apreciações. Eu acho que é um grande ganho para a cidade”, avaliou o presidente da Câmara.
Liderança do Governo
Líder do Governo na Câmara, o vereador Marlon Siqueira (PP) também considerou que o texto pode ser aprimorado em sua tramitação pelo Legislativo e destacou a construção coletiva iniciada ainda em 2019 e que resultou na formatação final do texto.
“Acredito que as virtudes evidenciadas no plano, como a ideia da integração das forças de segurança e do combate preventivo à violência sob o viés comunitário, vão ao encontro do pensamento dos vereadores. É um consenso que precisamos ir por esse caminho. De qualquer forma, no trâmite natural da Câmara, ao passar pelas comissões e votações em plenário, acredito que teremos mais uma oportunidade de debater sobre um tema tão importante para a sociedade”, pontuou o líder do Governo.
Violência na cidade tem perfil epidêmico nos últimos anos; mil vidas perdidas em uma década
O projeto de lei que trata do plano Municipal de Segurança e Cidadania, traz ainda um diagnóstico dos indicadores de violência urbana em Juiz de Fora nos últimos 20 anos. “Quando observados os indicadores de mortes violentas na cidade, percebe-se que a série histórica evidencia uma constância das taxas em patamares superiores a dez homicídios por 100.000 habitantes, a qual é considerada epidêmica pela Organização Mundial de Saúde (OMS)”, diz a matéria.
Usando como referência informações do Núcleo de Estudos de Violência e Direitos Humanos da UFJF (Nevidh-UFJF), tendo como base os dados coletados no Sistema DataSus, do Ministério da Saúde, o projeto de lei ressalta que “as taxas de mortes violentas na cidade de Juiz de Fora já alcançaram um patamar superior àquelas percebidas no estado de Minas Gerais, aproximando a cidade mineira das taxas nacionais”.
De acordo com os dados trabalhados, por exemplo, os indicadores de mortes violentas em Juiz de Fora superaram as taxas estaduais entre 2013 e 2017. Para efeitos de levantamento, os números de morte por agressão incluíram categorias jurídicas como homicídio doloso, latrocínio e lesão corporal seguida de morte.
“Em números absolutos, tendo como fonte também o Sistema DataSus, em um período de dez anos, entre 2010 e 2019, mais de mil vidas foram perdidas para os crimes violentos, sendo que em sua maioria eram vidas jovens, negras e de moradores das regiões periféricas da cidade”, afirma o diagnóstico apontando no Plano Municipal de Segurança.
O texto diz ainda que, segundo dados da Polícia Civil, foram 60 homicídios no ano de 2020. “Apesar da diminuição das taxas, é possível notar o caráter seletivo dessas mortes, que atingem principalmente a população jovem, negra e periférica. Quando analisados, por exemplo, os dados referentes ao ano de 2020, 43% dos mortos são jovens de até 25 anos.”
A conclusão é de que tais dados refletem o “lado perverso do fenômeno da mortalidade no país” e a seletividade das políticas de segurança pública, “que se mostram inócuas para, ao menos, minimizarem o fato de que a maioria das vítimas de homicídio no Brasil, e também em Juiz de Fora, são jovens do sexo masculino, pretos ou pardos, com plena capacidade produtiva, na perspectiva de ingressar no mercado de trabalho e construir uma rede familiar própria”.
Inspirações
O projeto de lei diz ainda que o plano juiz-forano é inspirado em experiências exitosas. Dentre essas experiências são citadas as de Bogotá na Colômbia e do município de Pelotas, no Rio Grande do Sul. “Ao investirem em práticas de segurança cidadã, (estes municípios) conseguiram redução substancial das taxas de violência”, considera o dispositivo. “O Plano Municipal de Segurança Urbana e Cidadania foi formulado tendo como referencial teórico os conceitos de segurança cidadã e de cultura de paz, os quais foram os pilares para a construção de todos os eixos estratégicos”, pontua o Município.
Confira
Destaques das metas
Pesquisa e Produção de Inteligência – três metas
• Criar o Observatório Municipal de Violência e Criminalidade
• Articular com as demais instituições e órgãos competentes a instalação de Unidade Integrada de Inteligência em Juiz de Fora (UII/JF)
• Fomentar, junto às instituições de ensino superior, a produção de pesquisas voltadas para a questão da segurança pública e cidadania, com retorno de seus resultados para a população pesquisada
Diálogo e Participação Popular – seis metas
• Articular a Secretaria Especial de Direitos Humanos na criação de um Fórum de Conselhos de Direitos, com vistas ao fortalecimento da intersetorialidade no campo das políticas públicas e integração às políticas sociais
• Consolidar e fortalecer o Conselho Municipal de Segurança Urbana e Cidadania
• Realizar, no mínimo, uma Conferência Municipal de Segurança Urbana e Cidadania a cada três anos
• Criar os Conselhos Regionais de Segurança Cidadã (CRESCs)
• Incentivar o fortalecimento do papel dos CRAS E CREAS como agentes de promoção da articulação das políticas públicas nos territórios
Integração entre o Município e as Forças de Segurança Pública e Fortalecimento da Guarda Municipal – cinco metas
• Garantir a instalação do Gabinete de Gestão Integrada Municipal (GGIM)
• Incentivar e cooperar para a melhoria, aprimoramento e expansão de políticas públicas de videomonitoramento, a exemplo do Programa “Olho Vivo”
• Executar o Plano de Ação da Guarda Municipal
• Fortalecer a Guarda Municipal e os agentes de transporte e trânsito a partir do cumprimento integral das normativas federais e municipais que regem estas corporações
• Promover discussão com especialistas em audiência pública e/ou demais espaços de discussão, com vistas ao aperfeiçoamento da legislação municipal
Capacitação Permanente – quatro metas
• Capacitar os profissionais que lidam com a segurança pública do município em cursos nos eixos temáticos de intervenção comunitária, direitos humanos e mobilização social
• Qualificar lideranças comunitárias, ONGs, entidades paraestatais e instituições similares, a fim de lidar com a problemática da segurança pública a partir de uma abordagem sociológica e não violenta
Transversalidade e Intersetorialidade das políticas públicas de prevenção às violências – 14 metas
• Implementar projetos intersetoriais com vistas à prevenção de homicídios da população jovem, fomentando a cultura da paz nos territórios
• Implementar programas municipais de prevenção à violência e à criminalidade, com destaque para aqueles destinados para as populações que se encontrem em situação de maior vulnerabilidade social
• Dialogar e articular junto às instituições competentes e à sociedade civil, com vistas à implantação de uma unidade da APAC na cidade de Juiz de Fora
• Implementar e contribuir com os projetos de reinserção social para egressos do sistema prisional
• Fortalecer parcerias a fim de que a Guarda Municipal, exclusivamente através de suas profissionais do sexo feminino, possa realizar o atendimento, apoio e acolhimento das mulheres vítimas de violência doméstica e familiar
• Fortalecer ações destinadas ao enfrentamento e prevenção de todas as formas de violência contra as mulheres, com vistas, inclusive, ao reconhecimento da Casa da Mulher como política de Estado
• Criar e prover a manutenção da Casa Abrigo e de Centros Especializados em Atendimento à Mulher em situação de violência
• Propor conjuntamente com as secretarias competentes programas de educação, cultura, esporte e lazer para jovens em áreas de maior vulnerabilidade social em relação ao envolvimento com drogas ilícitas
Fonte: Anexo do projeto de lei encaminhado à Câmara Municipal