Campanha de Popularização Teatro & Dança começa nesta sexta
Fim de semana também tem cenas curtas, oficinas e brechó
No primeiro fim de semana da edição em que a Campanha de Popularização Teatro & Dança atinge sua maioridade, os projetos em cartaz parecem ter foco na maior potência das artes em geral: provocar, questionar, debater, enfim, abordar emoções. No espetáculo de abertura apresentado no Teatro Paschoal Carlos Magno, “Urbana”, um solo de Glaucy Fragoso, que também assume a direção e o texto, este processo se dá por meio de uma dramaturgia baseada em fatos reais e com intensa fisicalização, narrando encontros com pessoas marginalizadas da sociedade, como transeuntes, loucos e outros personagens do cotidiano de qualquer cidade. “É uma fisicalidade pensada totalmente em favor da narração da dramaturgia, numa linguagem integrada entre o teatro, o circo e a dança contemporânea. A ideia era criar um corpo que representasse essas histórias de maneira abstrata, não mimética, mas ainda assim conectado com a realidade porque foi inspirado em corpos reais”, explica Glaucy.
Segundo a artista, pela intensidade em cena, o espetáculo é um desafio que transcende as exigências do corpo físico. “É bem intenso para o corpo, tem uma dinâmica física contínua, quase não fico parada. Então exige uma disposição corporal muito grande, mas como falo de pessoas marginalizadas, tem emoções muito intensas: solidão, revolta, raiva, tristeza… Perpassar estes sentimentos muito profundos exigem também muito do corpo, porque é ilusão pensar que um ator reproduz uma emoção sem sentir nada, a gente está presente no processo de produzir essa expressão. Por isso, também preciso ter uma disponibilidade emocional de me afetar para afetar a pessoa, e esse é o lugar onde fico mais exausta”, pondera a atriz.
Glaucy conta que “Urbana” surgiu de uma necessidade de usar a arte para debater temas relegados ao ostracismo, e começou a ser construído em 2016. “Veio da busca de um propósito social e um engajamento político no meu trabalho, uma necessidade artística de provocar uma reflexão sobre a sociedade contemporânea, de coisas que precisavam ser debatidas e expostas. Na época, nem imaginava que viveríamos essa rápida escalada do fascismo, que a meu ver começou no Rio, com as milícias. Eu falo muito disso no espetáculo, de poderes paralelos, essa ideia de que cada um manda em um lugar, basta ter poder. Bélico, financeiro ou o que for”, destaca.
A artista já apresentou a montagem especificamente para o público que é retratado nela, experiência que relata ter sido extremamente potente. “Já fiz em várias unidades de atendimento psicossocial, institutos de saúde mental e para pessoas que são vítimas do estado: que perderam parentes na guerra contra as drogas, vivem em favelas, convivem diariamente com bala perdida, tiroteio. Teve uma apresentação que foi muito especial, em que a mãe do Marcos Vinícius, um menino de 10 anos morto por uma bala dita perdida, estava presente. Eu uso uma frase dele no espetáculo, que ele disse antes de fazer a passagem: ‘mas eles não viram que eu estava com a camisa da escola?’ É muito intenso apresentar pra essas pessoas porque as histórias reais são tão reais que as minhas acabam ficando pequenas, a gente vê que a coisa só vai aumentando”.
‘O palhaço se deixa afetar para afetar o outro’
Além de fazer o espetáculo de abertura, Glaucy também ministrará, nos dias 10 e 11, o Laboratório de Palhaços e Palhaças, voltado para pesquisa e treinamento do ofício do palhaço, destinado a iniciantes ou não. “Para mim, um bom palhaço precisa ter a disponibilidade de rir de si mesmo e, assim, permitir que os outros possam rir também. Também é preciso ter um olhar atento para poder receber o que vem do outro, um olhar, um gesto, uma fala e jogar com aquilo. Por fim, é preciso ter técnica. A palhaçaria é uma arte milenar, que para ser aprendida e executada com precisão necessita destes pontos que eu citei”, diz ela. “O que será trabalhado na oficina é esse estado de presença e o corpo expressivo, por meio de exercícios técnicos que o capacitem a expressar o que pensa e sente”, completa a artista.
‘Diversidade de linguagens e interação de produtores locais’
Também no palco do Paschoal, o espetáculo “Frau Amalia”, dirigido por Pádua Teixeira com texto de Ísis Brandão e produção de Beth Grandi, é uma ficção baseada em fatos reais sobre a vida de Amalia Freud, mãe de ninguém menos que um dos pais da psicanálise, Sigmund Freud. “O desejo de fazer esta peça veio da Beth, que tem um filho psicólogo e chamou atenção para o fato de que todo mundo conhece o Freud, mas pouco se sabe sobre a mãe dele, que tem uma história muito interessante”, conta Pádua sobre o espetáculo que recebeu sete prêmios em uma mostra de teatro em Teresina (PI), onde mora a autora do texto. “A gente trabalhou por oito meses com leitura dramática, ensaio e sempre em contato com a Ísis, que vive em Teresina. Depois até apresentamos a peça lá. Neste tempo de construção, fomos moldando a personalidade da Amalia, uma mulher determinada, autoritária, mandona e muito inteligente. O trabalho se tornou uma história emocionante e divertida, que se passa entre seus 25 anos e sua morte, aos 95”, completa o diretor.
O fim de semana terá, ainda, a abertura do brechó Opa!lhaços, que funcionará no CCBM até o dia 2 de fevereiro, e a Mostra de Cenas Curtas, realizada no domingo (12), também no CCBM. Segundo Adryana Ryal, produtora do evento, um dos objetivos principais é promover a interação entre produtores locais. “É o grande momento em que quem produz pode apresentar seu trabalho, colocá-lo em acesso para todos os públicos e tem a oportunidade de conhecer o trabalho dos outros produtores. Muitos espetáculos surgem de cenas curtas apresentadas na campanha, porque também é um espaço de troca. A gente propõe rodas de bate-papo para isso, o que fomenta a participação dos produtores culturais na cena local”. Para ela, um dos grandes destaques da mostra para o público é a diversidade de linguagens e gêneros. “No tempo de um espetáculo, o público vai ver 11 cenas curtas entre comédias, dramas, contos, teatro experimental, narrativo, documental… de diversos produtores, de diversas linguagens. Você encontra a variedade da campanha inteira em um dia de mostra”, pondera ela. “E quem não está habituado ao teatro costuma gostar da dinâmica e se interessar por mais espetáculos.” A programação completa da campanha, que vai até 2 de fevereiro, pode ser conferida em sua página do Facebook.
“Urbana”
Dia 10 de janeiro, às 19h, no Teatro Paschoal Carlos Magno (Rua Gilberto de Alencar 1, Centro)
Classificação: 16 anos
“Frau Amalia”
Dia 11 de janeiro, às 20h no Teatro Paschoal Carlos Magno
Classificação: 12 anos
Laboratório de Palhaços e Palhaças
Dias 10 e 11 de janeiro, das 10h às 14h, no CCBM (Avenida Getúlio Vargas 200, Centro)
Classificação: 16 anos
Mostra de Cenas Curtas
Dia 12 de janeiro, às 18h, no CCBM
Classificação: 14 anos